26 julho 2014

Desvidas


Há muito que F. não trabalha, desde que no seu corpo começaram a crescer “coisas más”; assim lhe chamam as pessoas, com medo de pronunciar o vocábulo maldito. Cancro. Não um, mas dois.

F., inicial do seu nome, de franzina, que consigo rimava, mas também de força, aquela com que deu luta à doença durante os últimos anos. Não somos propriamente amigas, mas liga-nos uma vida de trabalho e de algumas conversas simpáticas que tivemos, sobre filhos, sobre a vida, sobre a necessidade de largar vícios e até sobre a doença que a minava aos poucos. E impossível não sentir carinho por ela. Doce, frágil, de sorriso tímido e maroto e corpo saltitante.

Hoje ganhei coragem, a que me tem faltado e que encontra sempre muitos argumentos, e fui vê-la. Que estava bonita e lhe ficava bem a maquilhagem, assegurei. Falámos uma vez mais dos filhos, dos dela, dos meus, dos dos outros. Do trabalho, da vida e da solidão com que ela se tem desenhado. E lá estava o seu sorriso. Tímido e maroto. O corpo já não saltitante, mas desse, nem uma palavra, nem do que continha lá dentro. Bebemos chá e fez-me prometer que agora sim, iria largar o vício do tabaco, tantas vezes tema das nossas conversas. Despedimo-nos com um abraço longo.

Assim quero eu escrever a história.

25 julho 2014

E Gaza aqui tão perto


A questão nem sequer é exactamente Gaza. Porque podia não ser Gaza e ser outro local remoto do planeta, ou até mesmo aqui ao lado. E também não é a justiça ou injustiça do que lá se passa. Porque nenhuma guerra é justa. A questão é a imagem no espelho que esta guerra fratricida nos devolve.

Enquanto centenas, muitas centenas, são dizimadas e espoliadas do pouquíssimo que já era o seu mundo, uma imensa maioria continua no seu mundo ridiculamente comezinho - afinal, Gaza ali tão longe. Continuamos alegremente a “postar” postas de pescada nas páginas das redes sociais, fotografias de um pretenso ameno verão, queixando-nos, é certo, do tempo que vai incerto, comentários acerca do concurso de domingo que nos traiu, imagens das jarrinhas de flores que enfeitam a casa, do creme para a cara infalível no combate às rugas, selfies, festivais sazonais, e mais uma selfie sem percebermos que nos traímos a nós próprios, porque a humanidade é traiçoeira e entrou em colapso. E porque a vida continua, é certo, e é também justo o júbilo por momentos felizes, partilhado com amigos e com a família. Mas a dimensão da indiferença tem-me feito pensar muito. Por vivermos de tal forma autocentrados e por ela ser o reflexo do medo; o medo de nos manifestarmos, o de tomarmos partido por uns ou por outros com toda a exposição perante o olhar crítico dos 666 amigos que temos na rede e que podem, afinal, guardar de “mim” uma imagem de amigo dos árabes, que são aqueles que quiseram as crenças sociais transformar em preguiçosos, bombistas, violadores dos direitos das mulheres e umas tantas coisas mais. E caímos em desgraça porque ficamos mal na selfie!

Quando eu era gaiata e que a televisão tinha, como dizia o meu pai, 1º e 2º esgoto, o momento das notícias era quase solene em casa. Os adultos viam notícias em silêncio e as crianças retiravam-se para os quartos, porque a elas era permitido o alheamento. Hoje já ninguém vê notícias. Porque centenas de canais, há sempre um que nos permite, enquanto o mundo é desfiado, assistir a um qualquer estupidificante concurso de master qualquer coisa, chefe, gordo, inteligente, mas sempre master. Porque queremos assistir ao engrandecimento de uma criatura que não conhecemos de lado nenhum, mas também à humilhação dos que vão sendo eliminados. E mesmo que vejamos notícias, podemos sempre confundir os tiros do Mundo com aqueles que ainda há pouco, mesmo antes de zappar, o Johnn Wayne desferiu no índio malfeitor. Negamos a actualidade do Mundo, para negarmos a nossa própria actualidade.

Vivemos tempos que nos reduzem a nada e pensamos sermos muito. O sistema financeiro ocidental faliu, e questiono-me se essa falência será causa ou consequência da falência de valores, ou se apenas de mãos dadas. O nosso mundo pequenino, aquele em que cada um de nós gravita, longe, longíssimo de Gaza, está cheio de pequenas guerras, marcado por intolerância, palavras amargas, provas de individualismo e de indiferença para com o outro que, também ele, mora ali longe ou que até talvez partilhe a mesma cama, mas a ele as suas dores, que eu também tenho as minhas. E queremos fingir que tudo vai bem, porque enquanto o pau vai e vem, folgam as costas. Também aqui não sei qual a ordem a atribuir; se reproduzimos à escala micro o que vai mal na macro, ou se o macrocosmos reflecte a instabilidade dos muitos microuniversos tumultuosos que temos criado.

Não sou indiferente, há muito, ao que se passa em Gaza. Como não sou com os milhões de deslocados e de refugiados que temos por este mundo fora, vítimas de guerra, de pobreza, de tiranias de senhores do mundo que os querem esfomeados porque de barriga vazia não se pensa e é-se submisso. Mas sou ainda menos indiferente a esta escravidão velada, silenciosa, que faz de nós seres passivos perante uma humanidade em implosão. E não pense ninguém que a carapuça não me entra. A verdade é que agora mesmo parto para o meu duche, visto-me e vou seguir a minha vida. E talvez apenas porque o tempo não está de feição, lá pouparei o Mundo de saber em que praia eu estou, coisa que lhe interessava de sobremaneira. Temos pena.  

24 julho 2014

O mundo precisa

De justiça, de bom senso, de seriedade, de sobreidade, de alegria, de força, de rectidão.  Precisa que se acabem as meias tintas, os relativismos e as normalizações. O Mundo precisa do Bem e do Mal.

23 julho 2014

Em repeat

Tinha saudades de uma música cantada, com uma história, como esta:



E parte de uma história maior e alucinada aqui.

Da cegueira


Oh, por favor, está calado! Não vês que bombas explodem nos meus olhos? E corpos preenchem o chão, a maioria crianças, mulheres choram as dores que não contêm o corpo, porque esse já não chega para conter nada, homens vagueiam na solidão do desespero, procurando sinais do que era uma casa e do que era família. E tu, as tuas dores, os teus ouvidos, o teu joelho, e agora mais o coração que isto e as costas que aquilo. Bombas explodem nos meus olhos! Nos teus não?

17 julho 2014

Verde Limão

No outro dia ultrapassei uma lambreta, verde limão, com um casalinho pipoca dependurado lá em cima.
Tive saudades de ter 20 anos, um amor de verão e três meses de férias.

Bipolaridade

Ainda que não seja a esquizofrenia, a bipolaridade já é muito bom!!

boa!!

Consegui! De volta ao antigo formato!

10 julho 2014

Amanhos

Do uso e do tempo, estás um um bocadinho estragado. Estás lento, confuso, baralhado. Vamos arranjar-te e ficas como novo. E vamos poder brincar como dantes!

08 julho 2014

espelho meu

Espelho meu: devia ser escritora, se fosse um animal era um cisne, sou o ObiWan, o meu evil twin (é mesmo) o Darth Vader, se fosse uma flor era uma rosa, devia viver em Londres e tenho um IQ de génio. Quem sou eu?

03 julho 2014

Saudades

Tantas! Quantas!!
Do teu recolhimento, do teu anonimato, do teu silêncio!
Preciso de ti. Já não te quero matar, afinal.
Vais ser meu. Só meu. Elas vão brincar lá fora. Onde está sol, onde há barulho, confusão, gente, tanta gente, tanto barulho, Deus meu. Vou ficar aqui um bocadinho. Só nós. Como dantes. Pode ser?