30 abril 2009

Telescópio

Eliodoro tinha um telescópio, um amigo gringo lho tinha deixado por uns largos meses. Camuflado pela noite, desde a varanda da sua casa, naquele outono constante de Bogotá, com o seu barrete e seu casaco de lã de alpaca, Eliodoro visitava sem ser convidado as vidas das pessoas na mira do telescópio. Observava festas, discussões, pessoas a descarregar as compras, a jantar, a dançar, a ver televisão, a namorar. Nestas alturas, às vezes chamava Ilisandra para que também visse, mas esta ficava sempre na dúvida se estaria a ver bem, ver pois além de surda, também não via muito bem e os seus olhos mentais não focavam da mesma maneira o telescópio. Ainda assim, naqueles pedaços de tempo que ali passaram, divertiam-se a imaginar o que aquelas pessoas completamente desconhecidas e com actos quotidianos tão iguais, podiam estar ou não a fazer. Às vezes juntavam-se outros amigos, apertavam-se 5 ou 6 pessoas num estreito balcão para poderem olhar a lua e as estrelas pelos olhos mágicos que desfazem as distâncias, com o telescópio viam-se as crateras do solo branco da lua, quase que dava para sentir como seria caminhar aí. Foram bonitas essas noites de telescópio na cidade ao lado da montanha.

Estou sem palavras

Ainda estou a juntar as peças que se soltaram com o que li. O mundo perfeito acabou.

Mayday


Lisboa: 12h no Largo de Camões
Porto: 12h na Praça dos Poveiro

29 abril 2009

a outra face da lua

O que se sabe e o que se sente.

28 abril 2009

27 abril 2009

Todos os meses

A tristeza à flor da pele durante dias. O peito que dói. A chuva que irrita até à medula. A susan boyle que me põe a chorar. Os suspiros trinta e duas vezes por dia. O saldo do banco que rasgo em bocados. Os pássaros lá fora que não se calam raios partam tanta alegria. A certeza de que nada faz sentido. A dor de cabeça aguda que fura os olhos e para a qual não há aspirina.
Até que, por fim, chega a libertação. As garras que rasgam por dentro, o corpo que se esvai com o sangue que sai de mim.
Gostava de ver um homem a passar por isto.

KO em 2 rounds

No carro, com uma fotografia minha que a professora tinha pedido para o trabalho do dia da mãe:
- “aqui a mãe era moderna”
- “era moderna?!”
- “sim.”
- “ e porque é que dizes isso?”
- “porque não tinhas esses cabelos brancos!”

Ainda no carro, sobre o saldo da minha conta não permitir algumas coisas:
- “mas podes ir ao banco e comprar mais dinheiro!”
- “não, o banco só me dá o dinheiro que recebo do meu trabalho e esse é para comprar comida e pagar as contas e…”
- “não é não, podes comprar mais!!”
- “e porque é que achas que sabes mais do meu dinheiro do que eu?”
- “porque eu sou sábia!!”

Mandada ao tapete, penso "e com três letrinhas apenas se escreve a palavra mãe"...

25 abril 2009

Hoje, do céu, cairam cravos

Com fúria e raiva

Com fúria e raiva acuso o demagogo
E o seu capitalismo das palavras

Pois é preciso saber que a palavra é sagrada
Que de longe muito longe um povo a trouxe
E nela pôs a sua alma confiada

De longe muito longe desde o início
O homem soube de si pela palavra
E nomeou a pedra a flor a água
E tudo emergiu porque ele disse

Com fúria e raiva acuso o demagogo
Que se promove à sombra da palavra
E da palavra faz poder e jogo
E transforma as palavras em moeda
Como se fez com o trigo e com a terra.

Sophia de Mello Breyner (junho de 1974)

Turismo. As queixas mais ridículas.

A Associação Britânica de Agentes de Viagem, recebeu só em 2008, 22 mil reclamações. O ranking de queixas mais absurdas feitas pelos turistas britânicos, foi publicado recentemente pelo jornal Daily Telegraph. Aqui ficam algumas delas.

- Homem, de férias em Africa que acusa elefante de lhe ter arruinado a lua de mel. " Os 35 centímetros de diâmetro e quase metro e meio de comprimento do pénis do animal, fizeram sentir-me inadquado.".

- Um jovem casal. "o meu noivo e eu reservámos um quarto com duas camas separadas, mas fomos colocados num quarto com uma cama de casal. Agora estou grávida e considero-vos responsáveis. isto não teria acontecido se nos tivessem dado o quarto que reservámos.".

- "A praia tinha demasiada areia.".

- " A areia não era igual à que via na brochura. A vossa areia era amarela, a verdadeira era branca.".

- Casal com filhos, surpreendido pela existência de vida marinha. "Ninguém nos disse que havia peixes no mar. As crianças ficaram assustadas.".

- Turista de férias em Espanha. "Havia demasiados espanhóis no local. A recepcionaista do hótel fala espanhol e a comida servida é espanhola.".

- Turista de férias na Índia. "Nas minhas férias em Goa, fiquei enojado porque todos os restaurantes serviam caril. Detesto comida apimentada.".

24 abril 2009

sem titulo

Estão as duas a brincar e começam a discutir por causa de uma tiara que fará delas umas verdadeiras princesas.

- É minha.

- Não, é minha.

- Não, é minha e vou ficar com ela para sempre.

- Para sempre não podes, porque depois quando quando fores velhinha vais morrer.

- Eu não vou ser velhinha, eu nunca vou morrer, vou viver para sempre.

- Não, não vais, toda a gente cresce e depois somos adultos e depois somos velhinhos e depois morremos

Silêncio.

- Schniff, schniff...BUÀÀÀÀÀ, eu não quero morreeeerrrrrrr, eu não quero ser velhinha. BUÀÀÀA

- Mas é assim, a minha mãe disse que era assim, mas ainda falta muito muito tempo.

- E tu também vais morrer?

- Vou, eu também vou ser velhinha e vou morrer.

- BUUUUÀÀÀÀÁ

Prontos, estou fodida, pensei eu e lá fui abraçá-la, dar-lhe beijinhos e dizer que não se preocupe que a vida é mesmo assim e que a gente vive muitos muitos dias e que só morre num e que ainda falta muito muito tempo e que os velhinhos depois até tem vontade de ir descansar, como a vizinha arlete que há 10 anos que repete isso todos os dias e ainda cá anda, e que a vida é para ser vivida um dia de cada vez e que tem altos e baixos mas é muito boa e que é bom ser feliz e fazer os outros felizes, e a pensar com os meus botões na ironia da vida, ela que descobre aos 4 anos que um dia vai morrer, a minha mãe a sentir a vida a escassear e eu que tantas vezes não sei a quantas ando na vida a consolá-las às duas.

Filmes

Com o pretexto de que íamos ao cinema, a minha vizinha de baixo hoje ficou-me com a miúda umas horas, que foram muito bem aproveitadas por mim e pelo meu excelso esposo. Quando fui buscá-la, diz-me ela:

- Então, aproveitaram bem o cinema? Vens com boa cara!

- Muito bem, Paquita, nem sabes quanto. Mas não fomos ao cinema, estivemos a fazer o nosso filme.- digo-lhe eu com ar malicioso, e responde-me ela com um ar descontraidissimo.

- Ah, mas quê, estiveram a ver filmes pornográficos?

- (Glupp) nãoo, estivemos nós "a fazer o filme", a aproveitar que não estava a filha e que podíamos estar à vontade

-  Ahhh. Eu digo isso porque o meu genro, que é como se fosse meu filho, conheço-o desde que ele tinha 19 anos, está casado há 20 anos com a minha filha, vem para cá vê-los comigo. E aprende-se muito, uma série de posições que eu nem sabia, eu com o meu marido, deus o tenha, a gente dormia em camas separadas. Pois é, de vez em quando vejo esses filmes com o meu genro, a minha filha é que não gosta nada, zanga-se connosco, lá estão vocês, ainda hei-de deitar essas cassetes todas para o lixo. A minha mãe, que descanse em paz, também não gostava,  mas eu e ele entretemo-nos, é bom para passar o tempo. Mas olha, fazem vocês muito bem em aproveitar o tempo sem a filha, quando queiras ir ao cinema é só dizer e vens cá deixá-la.


Roxroy


Revista Eu sei tudo, 1938.

Arnápio


23 abril 2009

Nuances de estilo


Do alto dos seus 4 anitos e com a sua pronuncia característica dizia-me:

- Toma. Es para ti.

- Muito bonito, o teu desenho. E o que é?

- Es uma noiva.

- Uma noiva? E o que tem em cima da cabeça?

- São os olhos.

- Claro. E quem está ao lado dela?

- É o príncípe (este bem acentuado à moda castelhana)

Olhei bem. Não é ilusão; noiva e príncípe têm olhos em sítios bem distintos. Um nas córneas, outra no alto da cabeça.

Foi por essas e por outras que noiva... nunca!

Um dia como hoje, not.

Acabo de ler o post mais abaixo, Um dia como hoje, e por contágio, sinto-me também a ficar leve leve. Mando a mão para o lado para dar um golo no meu compal de pêra, fresquinho a combinar com a leveza, e entorno o copo cheio de sumo, todo no chão, em cima da mesa, em cima de cabos, a escorrer pelas gavetas do móvel. Passo os próximos 10 minutos a tentar lavar o pegajoso do sumo o melhor possível. É assim que se acabam com as manias.

Sem palavras

Já todos twittaram, comentaram, blogaram sobre o assunto. Eu, que sou sempre a última a saber de tudo, só hoje descobri Susan Boyle.
Ainda estou arrepiada. Como não consigo pôr aqui o video, espreitem aqui.

IndieLisboa'09!


Lisboa é a capital do cinema independente de 23 de Abril a 3 de Maio!

O IndieLisboa'09 chega à capital a 23 de Abril, com mais de 200 filmes e 230 sessões exibidas ao longo de 11 dias. O público vai poder assistir ao melhor cinema português e internacional produzido no último ano e participar nas mais variadas actividades que o IndieLisboa organiza, entre festas, concertos, debates e muito mais.

Este ano, para além da presença habitual no Fórum Lisboa, no Cinema Londres e no Cinema São Jorge, o IndieLisboa ocupa o Auditório do Museu do Oriente e o Cinema City Classic Alvalade, dois pontos que estendem a dinâmica urbana do festival a sul e a norte da cidade. Ao todo são 5 os espaços e 8 as salas de cinema que o IndieLisboa vai ocupar.

Werner Herzog e Jacques Nolot são os heróis independentes do IndieLisboa 2009, uma homenagem que contará com a presença dos dois cineastas e com a exibição de 36 curtas e longas metragens que atravessam os géneros da ficção e do documentário.

Entre os mais de 600 convidados que o IndieLisboa recebe, todos os anos, de dentro e fora de Portugal, o festival vai contar com a presença de Marco Müller, Director do Festival de Cinema de Veneza, Christoph Terhechte, Director do Fórum da Berlinale e finalmente Peter Taylor, programador de curtas metragens do Festival Internacional de Cinema de Roterdão.

Mais informações aqui!

22 abril 2009

é por estas

e por outras que eu gosto dele. Está a instalar a nova versão do skype e diz-lhe a voz, depois do sinal grave uma mensagem de até 10 segundos. Ouve-se o piii e começa ele:

tinuninuni noninuninuninuni batmaannn, batmannn. tununinuni nuninuni batmannn

Foi a 22 de Abril

Senhor,
posto que o Capitão-mor desta Vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a notícia do achamento desta Vossa terra nova, que se agora nesta navegação achou, não deixarei de também dar disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que -- para o bem contar e falar -- o saiba pior que todos fazer!
(...)
Pero Vaz de Caminha

21 abril 2009

Aquariofilia

Desço as escadas cinzentas, pego no cartão verde e passo-o na máquina. Olho para o cartaz da parede e descubro que devo ir para a esquerda. Escadas e pessoas que sobem. Uma mãe com a filha pela mão, um adolescente de calças caídas, uma rapariga com fios brancos que lhe sobem da mala até às orelhas, duas amigas sorridentes. Chega o comboio. Espero que as pessoas saiam (oito pessoas) e entro na carruagem. Sento-me sozinha em frente a uma mulher que lê paulo coelho. Conto as estações, uma duas três quatro, e saio ao lado de um homem barrigudo e muito sério. Duas mulheres falam uma língua incompreensível enquanto caminham à minha frente, uma tem o cabelo ruivo e está vestida de cor de laranja, da outra mal me lembro. Uma rapariga muito loira olha para mim, tem um olho de cada cor e tem uma camisola justa que deixa ver o redondo da cintura, dos ombros aos pés vestida de cor de rosa. Percebo depois que está com as outras mulheres, talvez sejam búlgaras ou ucranianas. Dois rapazes falam de râguebi e riem alto, um homem engravatado debita números para quem o ouve do outro lado do telefone, um pai muito alto sobe as escadas com um filho pequeno. Passo o meu cartão na máquina atrás da rapariga do olhar fulminante.
Às vezes viajar de metro é como estar a olhar para um aquário.

Ah, democracia do caraças!



Não vou comentar o ar sarcástico do nosso PM que, desta vez, e porque a manif era muda, lá teve de evitar o habitual discurso dos comunistas organizadores de ajuntamentos insultuosos à sua pessoa. Mas por acaso, aproveito para dizer que, embora não o fosse comentar, o acho bastante irritante.
O que me deixou pasma (e já pouca coisa me vai deixando nesse estado) foi o discurso que se seguiu e que não consigo recuperar em vídeo. Com tanta felicidade estampada no olhar por inaugurar esta obra, Sócrates referiu-se a ela como "uma das mais importantes vitórias da democracia pós-25 de abril; a da engenharia do homem sobre as águas do Mondego". Bem me parecia que esta era uma das mais importantes! Nem me consigo lembrar de nenhuma outra vitória da democracia que lhe chegue aos pés. Nã!...

20 abril 2009

Na minha casa vêem-se vultos ao longe



Há dois dias, ao olhar retratos de família antigos, reparei na estranha frase com que a minha mãe classificou uma das fotografias e que dá o título a este post.

Ora, tendo eu vivido 29 anos da minha vida na casa do retrato, nunca lhe suspeitei esta vocação. E claro que me lembrei imediatamente do filme The Others.

Um dia como hoje

Hoje sinto-me estranhamente leve.
Poderia até arriscar dizer que a vida corre-me bem.
Tenho um trabalho e ganho pouquíssimo, mas isso não é de todo um problema.
Estudo coisas que gosto e me preenchem.
Tenho poucos mas valiosos amigos.
Bastantes conhecidos, alguns simpáticos outros nem por isso, mas estes também nos preenchem a vida certo?
A minha família está mais ou menos bem, mas na família nunca nada está sempre bem.
Oiço boa música e fumo um dos meus cigarro preferidos.
Tenho um amor não correspondido, e outros que sou eu que não correspondo.
Adoro a casa onde vivo.
Hoje está sol.

E começo por dizer que estou estranhamente leve.
Pergunto-me se não nos habituamos a viver demasiado as sensações negativas.
Se não nos habituamos demasiado a valorizar o que não está bem.
Todos nós buscamos a felicidade, faz parte da condição humana querer estar bem.
Então questiono-me porque é que não nos sentimos bem a maior parte das vezes.
Hoje sinto-me bem, nem feliz nem triste, sinto-me bem e sinto-me viva, não bastará isto?
Um dia disseram-me que se não criarmos ilusões com certeza não nos podemos desiludir.
Gostava de viver assim mais vezes. Sem que o que poderia ser mau me afecte e o que está bem me
preencha e me faça sentir como estou. Leve.

Não deixa de ser um pouco estranho, mas é sem dúvida muito bom.

Num dia como este

chego aqui e decido vou escrever. Não faço a menor ideia o que irá sair, não prometo mais do que palavras alinhadas umas atrás das outras. Talvez me lembre das moedas que tirava à minha mãe para comprar cigarros às escondidas, na certeza de que isso faria de mim uma pessoa crescida. Hoje arrependo-me da estupidez que me fez querer ser grande. Ou talvez me lembre do dia em que o conheci, cinquenta centímetros de gente saído de dentro de mim, tão branco quanto é agora, cheio de dentes definitivos e opiniões temporárias. Tudo isto faz um sentido qualquer, ter-me tornado uma pessoa crescida que pode fumar, pagar contas, pensar na vida enquanto ela escorre nos minutos cheios de nada. Olho para as minhas mãos, estas que tocam no piano inventado do meu teclado, e vejo que o círculo se vai fechando. Já não preciso de me esconder para fumar, não preciso das taças de vidro por baixo da camisola para fingir que sou uma mulher, larguei as chávenas em que bebíamos cocacola disfarçada de café, já posso guiar um carro, viver sozinha, entrar em casa às horas que me dá na gana, decidir o que como ao jantar. E às vezes dou por mim a ter saudades dos tempos em que ser grande era uma certeza distante que nunca mais chegava.

16 abril 2009

Comecei por explicar que o "certificado de conclusão" da minha licenciatura havia ficado pendente da liquidação de uma suposta dívida, entretanto efectuada. Situei no tempo, assegurando que esse pagamento fora feito algures por dezembro e que um fax com o comprovativo havia sido enviado. Após um "terrim-tim-tim-ó-elvas-ó-elvas-badajoz-à-vista" que temos sempre de gramar quando ligamos para onde quer que seja, a funcionária da universidade estatal lá me explicava, solícita:
- Pois... enviou o fax em janeiro. Ele chegou mas o núcleo x que o recepcionou não passou a informação ao núcleo y que tem de emitir o seu certificado.
E eu:
- E em que parte é que eu falhei?
E ela:
- Em nenhuma.
E eu:
- E se eu não tivesse ligado? Porque não é suposto ligar...
E ela:
- Se não tivesse ligado, olhe, ía continuar à espera.
E eu mais não disse. Continuo a espantar-me e a entristecer-me com estes exemplos de inoperância que nos são enfiados pelos olhos dentro todos os dias. Mais do que a inoperância, é a falta de compromisso que faz com que aquela criatura nem por segundos pense em dizer-me que, em nome da digníssima instituição, lhe resta pedir-me desculpas.
Não me parece que as boas ideias de simplexes e outras maravilhas que tirem da cartola venham resolver aquele que é um grande problema civilizacional e cultural: nunca ninguém está comprometido com a organização para a qual trabalha, sobretudo se ela for Estado. E esquecem-se que o Estado é pago até por quem o representa.

Não tarda nada

e temos aqui um despedimento colectivo. Somos mais que os dedos de duas mãos e ninguém pega neste estendal preto? Devem andar a estourar os salários milionários que ganham no oito e coisa.
Ainda faltam quatro meses para Agosto. Está bonito, está.

15 abril 2009

speakers corner na minha caixa de mail

"Solução para a crise económica e social em portugal, ler por favor" no assunto. Remetente: joão correia.
O joão correia garante que o dia 23 de abril será o melhor das nossas vidas. Basta aparecer na avenida da liberdade às 19h30 e descobriremos como: "acabar com o desemprego", "resolver o problema de desigualdade e injustiça social", "resolver os problemas do sistema nacional de saúde", "resolver os problemas do sistema de educação".
Uma promessa final: "Tudo isto e muito mais para sempre".
Lá estarei.

Xutos



A letra e a música não são das melhores, mas confesso que lhes acho graça. É que também eu espero....

13 abril 2009

Fuuuuu

Hoje tudo é pequeno. A minha cadeira é pequena, o meu espaço, pequeno, a minha vontade pequena, o meu coração - já nem sei dele - pequeno, o meu estado de vigília, pequeno, o meu sentido de pertença, pequeno. A noite passou-se curta, os teus abraços nem os senti - não existiram, eu é que finjo que sim para ver se me engano - o teu corpo nem o cheirei - estavas lá?- a tua voz nem a ouvi - não me lembro a que soa.

Da minha janela vejo eucaliptos que dançam ao vento, sobre uma nesga de céu cinzento e triste. Como eu. So que não tenho eucaliptos e para dançar já não tenho força.

Vêm-me à memória palavras que me sussurraram, outros, algures. Tento imaginar como seria bom que tivesses sido tu a faze-lo, mas já não me recordo como. Há muito tempo que deixamos de existir enquanto Um, para passarmos a dois, preto e branco, doce e amargo, óleo e água, ácido e base, tão diferentes e distantes.

E os eucaliptos não páram de dançar.

Continuo contigo? Que mais tens para mim, a não ser uma cohabitação estéril de desejo e vontade, convenientemente mascarada de 'liberdade', que tu tanto dizes aprecias? Que mais queres levar de mim, tu que já levaste tudo que tinha e não tinha?

E o vento não cessa de soprar.

10 abril 2009

Classificados


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08 abril 2009

o mais difícil de todos os vícios

É rockeiro de profissão, desde muito cedo que ganha a vida criando, tocando e cantando músicas que exaltam multidões. Durante muitos anos viveu uma vida de vícios, muitos vícios, heroina, ganzas, álcool, tabaco, café, boa comida e bolinhos todos os dias. Passados os quarenta, o corpo deu sinal de si e esteve muito tempo internado no hospital. Pelo amor que tem à vida, aos filhos e à música, resolveu mudar radicalmente a sua forma de vida e deixou todos os seus vícios. Deixou todas as drogas, deixou o tabaco, o álcool, o café, passou a comer de forma equilibrada, anda sempre com a garrafa de água atrás, sente-se tranquilo e sem ressacas, mas o pastel de natal, o duchess e a sobremesa da casa, esses....

05 abril 2009

Gran Torino



Mais que um filme, uma paixão.
Aqui o site oficial do filme.
Imperdível.

03 abril 2009

Vidas

Há pouco tempo estive durante um mês a apoiar um grupo de mulheres trabalhadoras sexuais num processo de inserção laboral para mudarem de trabalho. Uma delas, Luisa, uma romena que vive aqui há alguns anos, nasceu exactamente no mesmo dia, no mesmo mês e no mesmo ano que eu.

Introduzi o meu nome no gugal, para ver como aparece a minha anónima pessoa por esse mundo tão virtual e tão real. Encontrei-me com a morte, com a morte de uma mulher como eu, com o mesmo nome e a mesma idade, brutalmente assassinada pelo seu ex-companheiro há dois anos atrás.

Eu poderia ser elas e elas poderiam ser eu.

Montanhas e vales

Segunda-feira as 11 da manha chega o mail, 'Preciso do plano de negócios pronto até Sexta-feira'. Respondo que claro, desde que largue tudo que tenho em mãos, e comeco a escreveria e a recolher as partes que já havia preparado e que estavam disperas no meu pc.

Terça-feira as 4 da tarde, entra-me no gabinete e pergunta-me pelas folhas de excel. 'Folhas de excel?' inquiro eu. Sim, a parte financeira. Apenas preciso da parte financeira do plano de negócios. OK. Largo a parte da estratégia, da análise do mercado, da concorrência, do plano de marketing e começo no 'number-crunching'. Ao fim do dia, o meu chefe vai-se embora sem sequer se despedir - está furioso. Nos seus olhos leio insultos infindáveis à minha competência e ao meu trabalho.

Quarta-feira de manhã entra e nem me fala. Grunhe qualquer coisa à secretária e fecha-se no gabinete. Às 4 da tarde bato à porta e mostro-lhe a análise financeira. Ele engoliu em seco, pois não estava à espera. Para não dar parte fraca diz que o que precisa realmente é de resultados agregados num só quadrinho de excel , 'veja, assim'. E que não tem a certeza se quer olhar para investimento ou depreciações. Eu respondo-lhe que me deixe tratar do assunto.

Quinta-feira de manhã pede-me a agregação dos valores até as 3 da tarde, se eu consigo se-faz-favor-era-mesmo-fantastico-se-o-fizesse e eu respondo, 'claro que sim, não se preocupe'.
À 1 da tarde tem a pastinha com tudo em cima da secretária e a caixa de mail com os ficheiros relevantes. E um sumário executivo dos resultados.

Às 5 da tarde entra no meu gabinete e pergunta se eu quero um presente. Oferece-me um saquinho de pano com flor de sal de Tavira, 'sabe, já o tenho no abinete há algum tempo e esqueço-me de o levar para casa'. Eu agradeço. Ele sai, para regressar passados 5 minutos, sentar-se e começar a contar coisas e anedotas, algumas até com piada.

Depois vai para casa, despedindo-se efusivamente. Adora-me outra vez.

E eu que nunca gostei de carrosséis...

02 abril 2009

Discriminações

Um jovem professor dirigia-se a uma classe de adolescentes de 14 anos, na qual 2 meninas usavam calções, mais ou menos nestes termos: "de qualquer maneira vocês, raparigas, se usam calções é apenas porque querem mostrar as pernas".
E isto assusta-me. Mais do que me assustam as palavras de um papa que têm como missão a manutenção de um dogma que alimenta milhões. Assusta-me que um rapazote moderno, urbano, até giraço, pregue tais ideias e dissemine a teoria de que os propósitos de homens e mulheres se diferenciam na forma como fazem uso dos hábitos que vestem. Porque sustentar que o homem que usa calções tem calor mas a mulher que o faz quer mostrar as pernas é meio caminho para legitimar outras posições mais extremistas. Faz-me lembrar um dia que, estando grávida na fila do supermercado (muito grávida!) fiz valer os meus direitos e pedi prioridade. Ouvi, da boca de um sexa ou septuagenário o bonito comentário: a puta andou a divertir-se e agora ainda tenho que lhe dar o lugar

é pior a amêndoa que o cimento

De vez em quando faço umas traduções voluntárias para a OXFAM. Ultimamente tem-me calhado provas e documentos de contabilidade, uma área que eu domino pouquíssimo. Fui à ferramenta de idiomas do google para ver se conseguia sair de dúvidas. Seleccionei traduzir de espanhol para português e escrevi “nómina”, ao que ele responde depois de pensar um pouco, payroll. Tento com outra, “supuesto”, e ele não se fica, “curso”.
De facto, não se pode ser bom em tudo, têm muito jeito para ajudar-nos a pesquisar sobre tudo e mais alguma coisa, mas os idiomas não são o seu forte.

01 abril 2009

“o que é que eu sei? “

Queria escrever sobre aquilo que não sei me dizer. Sobre aquilo que com tanta facilidade e com tanta verdade digo aos outros e não me consigo dizer a mim própria.
É tão fácil dizermos coisas .....quantas vezes arranjamos grandes verdades só para os tranquilizar, só para não os ver sofrer, e às vezes (a maior parte das vezes), só para não os ouvir mais. E eu? O que é que eu sei? E a mim, o que é que me digo a mim? O que é que me pergunto? A quê tento me responder?
Cada vez menos sinto vontade de falar. Falar do que me vai dentro, do que me assombra a alma, do que me tira o sono, do que me faz medo de ter medo da loucura, do que me preocupa num dia e no outro já não, do que me faz chorar e não quero admitir, do que me faz falta, do que me faz sentir sozinha e do que me faz querer estar sozinha.
Cada vez menos sinto a vontade de falar, só pelo facto de saber que as respostas a maior parte das vezes estão dentro de mim.
Dou-me conta que é só saber o que realmente me quero perguntar. Até que ponto me quero confrontar. Até que ponto estou pronta para ouvir aquilo que me tenho para dizer. Até que ponto estou pronta para me ver nua ao espelho. Até que ponto tenho força para arrancar os meus dentes um a um.
E por tudo isto também, cada vez menos suporto que me perguntem coisas, que me peçam conselhos, que me perguntem o que devem fazer, que esperem que eu saiba coisas que a maior parte das vezes nem sei para mim própria.

E neste exacto momento pergunto-me “o que é que eu sei? “

Eu disse “O que é que isso interessa?”
Eu disse “ ...nada.”