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02 agosto 2009

Outro postal


Ao fim de uns dias em Londres, descubro que afinal não me aguentaria muito tempo a viver aqui. Olhando à minha volta, sei que é verão. As pessoas andam de sandálias, calções, alças, num descascanço que me faria morrer de hipotermia. É julho e agosto, todos os dias o céu está como chumbo e mais tarde ou mais cedo dou por mim a correr para uma porta qualquer para fugir à carga de água que se entornou pela cidade fora.

31 julho 2009

Postal


Reciclam-se bifas e cartão. Ainda não tive coragem para espreitar um destes contentores.

26 julho 2009

Não é medo, é receio


Na montra de uma farmácia inglesa, descobri este cartaz. As casas de banho públicas estão cheias de avisos sobre os espirros tosses e lavagens de mãos. Já me cruzei com várias pessoas que abrem portas com os pés. Ontem contaram-me de um avô que aconselhou a neta universitária a cumprimentar os amigos ao longe, i know they're your friends, but just wave them from a distance.

22 julho 2009

Faitedaivar

Os meus dias têm sido passados na biblioteca de uma universidade em Londres. Para além das horas de trabalho, descobri que aquele edifício de cinco andares cheio de pessoas e de silêncio tem uma densidade de homens bonitos verdadeiramente inacreditável. De várias idades, cores e estilos, nunca tinha visto tanto homem bonito no mesmo sítio. Será isto a alegria no trabalho?

17 março 2009

Start Spreading the News

Nova Iorque, 6:14 pm, Dia de São Patrício. A outrora chique e selecta 5a Avenida veste-se de verde para acolher a parada que exalta o Santo Irlandês mais comemorado dentro e fora da pequena parte da ilha. Pessoas de todas as idades, raças, estratos sociais e profissões enchem as ruas vestidas de verde, com colares de contas, cabeleiras, jóias, cachecóis e autocolantes alusivos ao tema, invariavelmente representando um trevo de quatro folhas, verde.
Balões, bandeiras e tapetes com as cores verde e branco - e alguns apontamentos de laranja - adornam os hotéis, restaurantes e, sobretudo os bares irlandeses, onde o consumo de cerveja atinge os valores máximos do ano.
É óbvio que tanta folia requer contenção, em especial visto se tratar do país onde tudo é permitido - desde que dentro das normas pré-estabelecidas e acordadas pelo poder vigente - e, como tal, New York's finest - leia-se, a polícia - saiu para as ruas, causando transtorno aos transeuntes que queriam visitar esta ou outra loja mas que não podiam porque havia sido determinado que na rua só se andava de Norte para Sul, ou de Sul para Norte, em filas de dois ou três, conforme os casos.
Curioso também são os nomes que os bravos heróis do pós 9/11 ostentam nos seus crachás: Sol, Vazquéz, Giardinelli, Farino, Meléndez, O´Shaughnessy, O´Hara, O´Riordan. Apelidos americanos, nem um.
À entrada de uma igreja, inúmeros elementos fardados de gala, cohabitam com outros mais ou menos coloridos e trajados com túnicas coloridas, de padrões africanos - they're shooting a movie', oiço. E vejo holofotes e meninos de boné de pala e mikes a correr de um lado para o outro. Uns metros adiante, cerca de 60 pessoas fazem fila. Descubro que procuram a refeição do dia, que será distribuida gratuitamente dentro de minutos.
Mesmo ao lado da 5a Avenida. Chique, cara e fashionista.
É assim, Nova Iorque.

Come Fly Away

Em trânsito novamente. Desta vez para o outro lado do mundo. É engraçado como se consegue adivinhar as razões de viagem das caras que encontramos nos aeroportos.

Os casalinhos sorridentes de mãos dadas, andando lentamente através dos corredores, apaixonados e prontos a iniciar (mais) uma qualquer lua-de-mel numa ilha tropical algures plantada. Os emigrantes, carregados de sacos, saquinhos e sacolas, que retornam ao seu exílio, falando alto em português, com mais ou menos sotaque, como que a dizer, 'eu também faço parte'. Os turistas estrangeiros, branquinhos e loirinhos, regressando de férias lusas, com t-shirts, meias pelo tornozelo e óculos esquisitos, carregando malinhas sofisticadas e práticas, os imigrantes, encurvados e de ar triste, com bilhetes comprados a prestações durante meses a fios para visitarem a família que ficou na terra que deixaram. Os executivos, com ar superior e blasé, 'sim, viajo muitas vezes, e depois?'. O tuga esperto, que conta piadinhas aos seguranças do raio-x e fala de futebol e de 'gajas' alto e bom som, para que todos vejam que ele tem 'posses' para viajar. As hospedeiras, esvoaçando por entre os comuns dos mortais, passando à frente de todos com as suas fardinhas e sapatinhos e casaquinhos e chapelinhos iguais.

E o Zé Pedro dos Xutos e o outro rapazinho que toca guitarra ou baixo ou outro qualquer instrumento na banda, que fizeram check-in no mesmo vôo que eu.

São assim os trânsitos. São assim as viagens.

11 março 2009

Rostu inu turansurêchonu

Japão, 22:58h, e os néons em forma de rabiscos gritam num céu escuro e limpo em cores de verde, azul, encarnado e amarelo. Na rua, homens e mulheres movem-se apressadamente para apanhar o último comboio para casa, pequenos, franzinos e com expressões de grande seriedade, como os fatos cinzentos e gravatas sem cor que ostentam.

A estatura japonesa levou algumas companhias aéreas, operando de e para o Japão, a adicionar 3 assentos por fila na classe económica, aumentando assim a oferta de lugares sem necessariamente comprometer o conforto do passageiro.

Outro fuso horário, outros costumes. Aqui, nada é fácil, nada é garantido. Viver é um privilégio alcançado à custa de muito trabalho, dedicação. E honra. Honra que garante a praticamente não existente criminalidade, honra que dignifica e valoriza o indivíduo, independentemente da posição sócio-económica que ocupa, honra que traz força para vencer na adversidade. Numa terra onde há terramotos, maremotos, vulcões, montanhas inóspitas e vales agrestes, apenas 10% do espaço é habitável e a existência não é um dado adquirido, mas uma conquista individual.

Talvez por isso o reverso da medalha aparente uma grande estranheza ao ocidental. Desde os Pachinko - salas forradas a néon rosa-shock intermitente com máquinas de jogo semelhantes a um pinball com grandes desenhos dos primos e sobrinhos dos Son-Gokus e Sailor Moons deste mundo, às livrarias com filas interminaveis de pocket Manga, dos mais diversos e variados temas - histórias sobre amizade, episódios de guerreiros intergalácticos invictos e soft-porn - abrindo da esquerda para a direita e cuidadosamente embrulhados em plástico selado para evitar a propagação de possíveis doenças, tudo parece saído de um qualquer desenho animado e destinado a trazer um pouco de alegria e excentricidade.

O tema da saúde pública é, aliás, um assunto de grande preocupação na sociedade japonesa, em que as pessoas se auto-colocam máscaras descartáveis na cara, não para mitigarem possíveis efeitos resultantes da poluição, mas para evitarem contagiar outros com os seus germes.

Igualmente preocupante é o cuidado com a higiene, sendo as retretes equipadas com tampos aquecidos com duches (shower), duche para senhoras (bidet) e secador de partes privadas (dryer), todos eles com fluxos e temperaturas reguláveis. Alguns possuem ainda a opção de regulação do volume do autoclismo (loud/quiet). Curioso é que tais sofisticados equipamentos cohabitam lado a lado e em cubículos de igual número com retretes 'à turca´, o que se torna menos agradável quando se pensa que, ao se entrar nas casas de banho das empresas, é necessário descalçar os sapatos de rua e colocar os chinelos comuns- rosa para as senhoras e azul para os senhores - de utilização das instalações.

Narita kuko é ité okudasai, por favor.

03 agosto 2008

Highlands

Será que se eu levar a guitarra portuguesa ou um cavaquinho eles deixam-me entrar na festa?

E, outra coisa, very important:

Ness, eu vou apanhar-te no teu loch! E para mais, com uma garrafa de scotch na mão, vai ser trigo-limpo-farinha-amparo. Ah pois vai! Desde Arthur Grant, até à chegada da oitoecoisa às Highlands, o mistério resolver-se-á.

imagem aqui

06 junho 2008

02 junho 2008

Conversas de amigos

Cenário: um jantar de amigos, dois homens gay e 3 mulheres indecisas entre a heterosexualidade, a abstinência e a bisexualidade.

- Ando preocupada com esta história da palma africana, a continuar assim a fome vai ser mesmo uma realidade em todo o mundo e já está a começar.
- A propósito, outro dia li num artigo que o sémen tem um valor nutritivo equivalente a duas colheres de milho.
- A sério, e quantas mamadas terei de fazer para poder fazer umas arepas para o pequeno almoço?
...
(um dos homens para o seu companheiro)- estamos safos mi amor, nós os dois somos uma familia autosustentável...

Do lado de lá


Quando cheguei à Colômbia, um dos temas recorrentes em todas as conversas era o aumento dos preços dos alimentos, toda a gente se queixava do mesmo e era comum a justificação dada: cada vez há menos terras para as batatas, as frutas, as hortaliças, pois cada vez crescem mais os cultivos de palma africana e de cana de açúcar, cujos frutos já têm compradores seguros do lado de cá e destino certo, os biocombustíveis. Um dos meus amigos dizia que agora já não é válido o que antes ensinavam na escola primária, em Antioquia cultiva-se o milho, em Cundinarmarca a batata, etc; agora na Colômbia inteira de norte a sul se cultiva palma africana. Os megaprojectos de palma africana são um dos apanágios do Governo de Uribe que quer aumentar a extensão dos cultivos de palma até 14% do território nacional, e dos paramilitares, quem são os encarregados de “cuidar” estes cultivos. Claro está que estas funções de cuidado implicam também fazer sair os camponeses e camponesas de determinados territórios, aumentando as cifras do deslocamento interno. Mas como o Governo têm como função inserir laboralmente as pessoas deslocadas, estas acabam muitas vezes por serem depois contratadas para trabalharem nas terras que antes um dia foram suas ou de outros deslocados. É um círculo perfeito. De rabo na boca.

28 maio 2008

Grrrelatividade

Na semana passada visitei o American Museum of Natural History, na esperança de poder rever os esqueletos dos dinossauros que continuam a fazer as delícias dos crescidos, ao mesmo tempo que inspiram o mais profundo dos terrores às criancinhas que por eles são arrastadas por meio de ossadas fossilizadas dez vezes maiores que eles e vários milhões de anos mais antigas.

Em frente ao esqueleto completo de um T-Rex estava um homem, sózinho, de mãos entrelaçadas atrás das costas, e com um ar profundamente infeliz.
Ao seu pescoço estava pendurado um cartão que dizia 'John Doe, Ph. D.' AMNH Staff- Ask Me!', e dele depreendi que seria um cientista que, em vez de ter partido em busca de uma nova espécie enterrada há séculos no deserto de Gobi, ou similar, passava os seus dias enfiado numa sala de museu, rodeado de ossos e a sorrir a visitantes desconhecidos, na esperança de captar a sua atenção e de poder exibir todo o conhecimento acumulado ao longo de vários e árduos anos de estudo.

Reparando que tinha algo na mão, perguntei-lhe de que se tratava. 'Uma garra de T-Rex fossilizada', respondeu. 'Posso segurar?', perguntei. 'Yeah, sure!'. E enquanto virava e revirava o objecto, por meio de sorrisos apatetados e efusivos, mas respeitosamente silenciosos, 'UAUS!' ele lá me foi explicando que a garra era revestida de queratina, que caia com uma grande periodcidade para ser logo substituida por outra nova, etc, etc, etc, informação que eu ia registando, acenando com a cabeça e proferindo uns, 'is that so?', 'really?', 'oh, right!', cheios de interesse genuino.

Se ao menos 'John Doe Ph.D' soubesse a enorme alegria que me deu...

23 maio 2008

Bogotá em imagens





Não é fácil tirar fotografias em Bogotá. Não é normal ver turistas a tirar fotografias como em Lisboa ou em Barcelona e há muita desconfiança, as pessoas não gostam que lhes tirem fotografias pois pensam logo que se está a fazer inteligência para algum dos grupos armados. Quando a policia ou os seguranças nos viam, ameaçavam-nos dizendo que não podíamos tirar fotografias porque estava proibido (na Colômbia está institucionalizado um Estado de Sitio por causa da guerra, perdão do conflito armado interno). Assim sendo, estas são algumas das fotos possíveis da cidade, principalmente da zona centro. Da zona norte, a parte rica que faz lembrar a Noruega não tirei nenhuma pois havia policia e seguranças a cada dois por três.

23 abril 2007

Histórias de estradas (II)


- WELCOME TO HELL!!!

[freeze!]
Olho para o M., o M. olha para mim. Tarde demais para voltar atrás, já démos uns bons três passos em frente. Tornamos a olhar um para o outro e começamos a dirigirmo-nos em slow motion para o balcão.

Uma longa fila de bancos altos em frente ao balcão está toda ocupada (à excepção de dois lugares à esquerda) por indivíduos que chupam cigarros (estranho, a lei anti-tabaco está mais que promulgada e em vigor aqui nos U.S. of A., penso eu) roem palitos, bebem cerveja e - sobretudo - olham para a nossa lenta caminhada. Todos eles vestem calças de ganga, têm chapéus de cowboy e trazem um sorriso irónico no rosto, observando-nos. Os 'gringos' são eles, não sei o que seremos nós para eles, não temos ar de 'chicanos' (isso já eu tive oportunidade de perceber que não associam o nosso fenótipo aos mexicanos). Passamos por uma área de mesas, onde se sentam mulheres de ar atrevido, entretidas a falar com outros homens, em conversas que adivinho pouco ingénuas.

Chegamos ao balcão, fazendo uma diagonal que nos leva aos dois únicos lugares vazios. Sentamo-nos. O empregado, de copo e de toalha na mão - fingindo que o seca - pergunta-nos o que queremos. Olhamos para a direita e temos toda uma fila de cowboys de olhos postos em nós. Olho para o M. e ele anui com um piscar de olhos. Peço então:

- Duas cervejas, por favor. E uma rodada aqui para os senhores do balcão. É por nossa conta.

Faz-se algum silêncio, o empregado tira duas canecas e enche-as, enquanto nos olha de soslaio. There you are, pousando as cervejas. Começa a servir aqueles que já têm as canecas vazias. Já mais confortável (não tenho colarinho, mas se tivesse desapertava-o), dou um longo golo na cerveja. O silêncio é, então, quebrado pelo cowboy que se senta ao nosso lado, o mesmo que nos saudou assim que franqueámos a porta do bar:

- So, where are you guys from?

Ui, lá vem a pergunta difícil. Considerações à parte em relação aos conhecimentos geográficos dos norte-americanos, decidimos pela resposta mais eficaz: We're from Portugal, next to Spain, Europe. Empurra o chapéu para trás, e troca o palito de um lado para o outro da boca. Estende-nos a mão e diz:

- Nice to meet you, pals. My name is Mule Skinner. And yours?

Dou mais um golo valente na cerveja, tentando perceber o que é aquilo quer efectivamente dizer. Mas o tipo até é simpático e começa-nos a contar uma das histórias mais inverosímeis que alguma vez ouvi: mudou-se com a sua 'companhia' de teatro para o Arizona e ganham a vida a simular tiroteios do velho farwest no próprio do farwest para os turistas que ali passam. Fazem vários espectáculos por dia, que nos relata pormenorizadamente. O Mule Skinner - o seu nome artístico - é um dos dois cowboys que está presente no tiroteio final, naquilo a que aqui chamaríamos de mano-a-mano. Infelizmente, é ele invariavelmente o que morre. O espectáculo acaba com Mule Skinner já dentro do caixão. Olho para ele e, já turvada pela terceira caneca de cerveja, penso que gostaria que - nem que por uma vez, uma só vez - fosse ele o sobrevivente...

Os olhares há muito que se desviaram de nós, deixámos de constituir matéria de interesse e/ou atenção. Mule Skinner pergunta-nos onde vamos pernoitar. M. diz que estávamos a pensar dormir no carro na berma da estrada, the road is long e amanhã temos muitas milhas para fazer. 'Bom, eu se estivesse no vosso lugar não arriscaria. Com a chuva que caiu, todas essas pequenas criaturas mortíferas - escorpiões, lacraus e SÓ a cobra mais venenosa do planeta (a mojave green) saíram das suas tocas, aproveitando this moisty environment. Entram-vos pela parte de parte de baixo do carro e a primeira dentada/picada é letal. Ainda por cima aqui, in this back of beyond. Eu não arriscava'.

Despedimo-nos de Mule Skinner, já emocionado com a partida dos seus mais dois recentes amigos europeus (ou das beers, talvez). Acenamos aos demais, que nos levantam a ponta do chapéu. Faço o mesmo movimento com as mãos na porta que fiz para entrar, empurrando-as no sentido oposto.

Entramos no carro em silêncio e só paramos - depois de cruzada a fronteira dos estados do Arizona com a California - no primeiro motel que se adivinhava da estrada, com o letreiro néon a anunciar vacancies.

20 abril 2007

Histórias de estradas (I)

Joshua tree

Deserto do Mojave (Arizona), Setembro, 1996.

Se não fosse o ar condicionado do carro já tinha derretido de certeza. Aliás, tudo parece liquefazer por aqui: os cactos gigantes em forma de tridente, as joshua trees (a única vegetação que tenho visto) as pedras, os abutres, os sinais de trânsito, tudo. O ar, ao fundo, assemelha-se a uma massa espessa e turva. Quase que jurava que podia chegar lá com uma colher, tirar um bocado e comer. Não estou dentro de um quadro de Dali, mas não devo andar muito longe.


Estou cansada, apetece-me enfiar qualquer coisa fresca pela goela abaixo e esticar as pernas, já passei a fase da fome. Quebro o silêncio e proponho ao M. uma paragem para beber a dita, não importa onde, o primeiro sítio que encontrarmos. Estou farta da paisagem cromatico-monótona do deserto, do ar hipocritamente fresco da ‘gaiola’ que nos desloca de um lado para o outro a não-sei-quantas-miles-per-hour (não esquecendo as vantagens das mudanças automáticas). Fizemos uma grande tirada hoje e amanhã temos de chegar a Los Angeles. Depois, começar a subir a A1 em direcção a San Francisco (não sei porquê, tenho cá uma fezada por esta cidade). Não faço ideia onde vamos dormir, eu e o M., como estamos amuados desde ontem, não conversámos pelo caminho: mais de 500 km autistas, tomar decisões não está fácil. Por mim, terminava o dia aqui, bebia a tal fresca, reclinava os bancos para trás and end of story.


Vejo umas luzes a piscar ao fundo, as neon lights às quais já me habituei por estas bandas. Ou é motel ou é bar (ou então as duas coisas, melhor ainda). Hum, não me parece motel, não diz vacancies. Será um daqueles dinners de estrada? Também serve, gosto da mística dos dinner- in-the-middle-of-nowhere (parece que estou no meio de um videoclip do Tom Waits, menos mal): tudo e todos de passagem, o café servido directamente da cafeteira para a mug, menus de elevado teor calórico, autênticas bomba de colesterol.


Arriscamos, saímos do carro, levamos com o bafo quente do deserto que nos bate no rosto com a força de uma chapada e aproximamo-nos do edifício: afinal sempre é bar. Vejo umas portas de madeira a 2/4, daquelas que têm gonzos e que têm que ser empurradas para dentro. Percebo, então, que – caraças - estou mesmo no farwest: é um saloon! [Bem-feita, não era eu que queria ter experiências novas e verdadeiras? The real thing?] Respiro fundo, empurro as duas portas com as duas mãos e ouço – vindo de dentro do saloon– a mais insólita saudação de sempre:


- WELCOME TO HELL!!!

[Continua]

16 março 2007

História de uma viagem entre duas quase cidades

Percorro todos os dias os cerca de 80 km que me transportam de uma cidade do litoral à Beira.
Ontem, dia do consumidor, o autocarro que me conduz ao destino atrasou cerca de 50 minutos. Os passageiros impacientes barafustavam: "isto só acontece neste país! Se estivessemos na Alemanha ou em França nada disto acontecia". Resolvi entrar no gabinete da empresa e escrever uma reclamação.
Chego cá fora e pergunto a uma senhora: "porque é que não faz uma reclamação e pede o reembolso do bilhete?". Ela respondeu-me: "Ó menina, é que eu não sei escrever".

[Escrevi-lhe a reclamação que ela ditou com as palavras que sabe dizer e não escrever.]

13 novembro 2006

Lembranças

Vivi numa cidade onde me cruzava frequentemente com um rapaz que pedia dinheiro para comprar cães-guia para uma associação de cegos, sempre na mesma esquina movimentada. Ele era muito insistente, chato mesmo, e como nunca vi mais ninguém da mesma associação em lado nenhum comecei a pensar que era um agarrado com imaginação e veia para o dramatismo.
Um dia em que estava muito neura com a vida, ia para casa com os olhos cheios de lágrimas e a alma de tristeza, ele veio-me pedir a fatídica contribuição. Disse-lhe hoje não é um bom dia, deixa-me em paz. Ele parou, pôs-me as mãos nos ombros, olhou bem para mim e convidou-me para ir tomar café. Sorri, respondi que não me parecia boa ideia. "A mim também não, mas queria fazer-te sorrir e consegui". Deu-me um beijo na cara e foi-se embora.
Lembro-me muitas vezes dele. Hoje, por exemplo.

17 outubro 2006

Breves do Mundo Animal


Ontem fui visitar O Monte Selvagem, uma reserva animal no Lavre, Alentejo, um programa fantástico para quem tem criancinhas que adoram animais e para quem não gosta de ver os animais em jaulas.
As avestruzes chamaram-me particularmente a atenção, pois adoro encontrar na natureza exemplos que contrariem a ideia generalizada de que a reprodução é tarefa exclusiva das fêmeas, e nos meus parcos conhecimentos de biologia ainda só tinha na minha lista o cavalo marinho. Aprendi então que as avestruzes apesar de serem aves não voam, sendo por isso chamadas ratitas, podem correr a velocidades de 60 km por hora, têm cérebros pequeninos e grande longevidade. E que nem todas as que parecem ser o são, pois existem Avestruzes, Emas e Nandus, aparentemente semelhantes mas diferentes na sua origem, morfologia e modos de reprodução.

As Avestruzes, originárias de África, são animais gregários e no grupo distingue-se um macho e uma fêmea dominante que cuidam os ovos das várias fêmeas. A nidificação, que dura entre 35 e 45 dias, é feita de maneira repartida; a fêmea, que tem a penugem castanha choca os ovos durante o dia e o macho, de penugem preta, durante a noite, pois assim ambos se camuflam protegendo melhor a descendência. Quando nascem os filhotes (entre 15 a 60 por grupo), são cuidados por ambos, sendo o macho particularmente agressivo com quem se arriscar a penetrar no seu território (quando virem uma avestruz com as patas com uma risca vermelho vivo, o melhor é sair de perto bem depressa, pois esta ave com duas garras tem como arma principal o pontapé e força para matar uma pessoa).

As Emas vêm da Austrália, são animais em geral solitários, e aqui é o macho que choca os 5 a 25 ovos das várias fêmeas que copulou (linda palavra). Durante os cerca de 55 dias da gestação não come, não bebe, não urina, não defeca, não nada, e quando nascem os filhos é ele quem os acompanha. O mesmo se passa com o Nandu, originário da América do Sul. Os machos que em geral vivem solitários, quando chega a época da reprodução cortejam várias fêmeas e sozinhos cuidam os 10 a 60 ovos postos por elas, constróem o ninho, incubam os ovos e acompanham os pequenotes nos seus primeiros passos.

Como diziam os grandes Irmãos Catitas, “a natureza é uma beleza e as criaturas são todas puras”.

17 setembro 2006

ROUTE 66



Imagem aqui

Faz hoje 10 anos que voltei de uma das mais lendárias viagens: a Route 66, estrada que percorre (quase) coast to coast os E.U.A. Não a fiz, no entanto, do princípio ao fim.

A estrada é interrompida por outras estradas principais, mas vale a pena o esforço acrescido de leitura dos mapas. E a teimosia em querer percorrê-la. O deserto do Arizona, o Grand Canyon, Nevada e Las Vegas, a entrada triunfal em Los Angeles pela Sunset Boulevard. Houve mais caminho a seguir, mas esse já não conta (pelo menos no itinerário da mítica estrada).

Assinalo apenas o regresso: uma noite em branco no areoporto de San Diego, na companhia de 'New York Trilogy', de Paul Auster.

Those were the days...