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26 junho 2008

Tudo água


A vermos o seven digo-lhe "o teu sorriso é tão parecido com o dele". Ele responde "também acho, a gargalhada do morgan freeman soa igual à minha".

(nós bem tentamos os piropos manyfaces, vocês é que não nos levam a sério)

25 janeiro 2007

Ensaio

Atravessava a cidade, observava as pessoas. Apressadas no seu passo urbano, passavam pelas passadeiras, esperavam impacientes o autocarro, detiam-se nas montras com olhares ávidos. Apertadas nos seus fatos, nos seus corpos, nas suas prisões sociais, nas convenções que se lhes pegam ao ser como se de uma segunda camada de pele se tratasse. Os homens com fatos e gravatas, iguais entre si, produtos do mesmo modelo que lhes diz que para pareceram sérios e responsáveis necessitam de uma farda que o demonstre. As mulheres com as suas saias apertadas, um pouco mais coloridas mas igualmente presas a uma tristeza que insiste que a vida é assim e não pode ser diferente. Todos iguais, com ares tristes ou zangados, vazios de personalidade, cinzentos, escuros no vestir e na alma. Só os velhos pareciam caminhar de forma diferente. Paravam nos bancos de jardim, sentados olhavam como se o mundo estivesse todo à sua frente para ser admirado. E de repente passa ele, com todo o seu corpo atravessa o ar com um jeito tranquilo, dengoso, bonito, leva no rosto um sorriso e no corpo uma gabardina vermelha que avisa ao longe que ele vai passar. Lembro-me da súplica do Manyfaces, abro a janela do carro, passo junto a ele, e sem tirar os óculos escuros digo: “Deixe-me dizer-lhe que o senhor é muito mais do que razoavelmente bom, é uma luz intensa que atravessa toda a cidade.” A cor da sua gabardina reflecte-se na minha face, envergonhada, arranco rapidamente. Merda, não sei mandar piropos, corro para casa e ensaio de novo em frente ao espelho.

12 janeiro 2007

Apelo à indiscrição

Queixa-se o leitor manyfaces nesta caixa de comentários da elevada discrição das mulheres portuguesas. Que não se nota que olhamos para eles e nem um piropo levam na rua. Que não lhes abafamos o ego.
Andou para aqui esta múltipla a queixar-se do excesso de atenção que os homens em geral nos dão, e é caso para dizer uns são filhos e outros são enteados.
Provavelmente um dos motivos que nos impede a andarmos por aí a apregoar "és bom como o milho" ou "e ainda dizem que as flores não andam"; ou a atirar olhares lascivos é sentirmos que isso é uma invasão da privacidade alheia.
Mas sim, tem razão o manyfaces quando diz que uns olhares mais gulosos só fazem bem e não fazem mal como apregoavam os Ena pá 2000.
Olhe, vamos fazer um trato. O manyfaces convence os do género masculino a não serem ordinários e eu exorto as do género feminino a serem mais expansivas. Boa?

Até lá fica aqui o delicioso apelo, em pré-publicação:

«Há dias em que me sinto uma merda mas lá me esforço para parecer interessante, cabelinho cortado, barbinha bem feita, conversa caprichada ao almoço.. vou-me sentar lá na mesa das estagiárias, sigo as recomendações dos gatos e não me aventuro em mesas de gajas boas, que essas são forretas nos olhares, mas mesmo assim nada...Acho que vou pôr anúncio no Correio da Manhã: " gajo apenas razoavelmente bom procura gajas da mesma condição para olhares e piropos. Assunto sério." »

10 janeiro 2007

Inspecção periodica obrigatória

Como tenho sempre carros velhotes, regularmente tenho de passar pelo número da inspecção ao dito. Há sempre uma altura em que eles me pedem "agora deixe-me ser eu a fazer", como se o facto de ser mulher me tornasse incompetente para dar umas guinadas no volante ou para travar a fundo. A parte das luzes, vá, deixam-me ser eu a fazer.
Acabo por lhes dar o desconto, afinal uns tipos que passam o dia a respirar monóxido de carbono dos tubos de escape alheios têm direito a poderem distrair-se durante os breves minutos em que olham para o meu rabo pelo canto do olho e me fazem pensar "será que não vai passar?", brindando-os com o meu melhor ar de donzela em apuros.
Temos de ser uns para os outros.

27 agosto 2006

o admirável mundo novo

Assumidamente confiante marcou caminho deslizando de queixo erguido ao largo do prédio coberto de andaimes e engoliu todos os piropos mais e menos sem graça que iam caindo do terceiro andar. "Comia-te toda ó giraça!", "És boa!", "Leva-me pra casa que eu mostro-te como é!" e o inevitável, "Ó febra!!". O 36 estava ainda imóvel ali na paragem como percebendo da sua pressa e subiu os degraus aliviada. Que dia chato.
Olhou em volta os outros passageiros recortados no contra-luz de fim de tarde, em pausa, como se alguém tivesse premido o botão do comando da tv. A multidão como um vasto mar de sombras estáticas, desistentes de mais um dia qualquer. Também se sentia assim. E implodiu. O motorista enfiou a primeira e ela implodiu. Abriu uma janela. levantou a blusa branca, estatelou as mamas contra o vidro e gritou bem alto para o terceiro andar do prédio, "O que vocês queriam sei eu!". Risos, gargalhadas sonoras, mais uma centena de piropos todos em simultâneo e sem tradução possível e o autocarro arrancou. Baixou a blusa e sentou-se. Assumidamente confiante. E sorria. Agora os passageiros ainda pareciam belos no contra-luz de final de tarde mas já não eram sombras estáticas.