31 dezembro 2011

Porque a vida é bela

O dia de amanhã é o primeiro de um novo ano mas apenas mais um a seguir a todos os outros das nossas vidas. Um Ano Feliz, passado a celebrar vidas bonitas como as nossas, é o que desejo às oito gajas, ou nove e tal...

24 dezembro 2011

Silent night

E tomem lá mais esta, cheia de espírito natalício.

23 dezembro 2011

Um natal feliz

Com perú, com bacalhau ou cabrito, ou mesmo sem eles, mas com o brilho nos olhos só porque temos família que se faz de amigos e de parentes. Um natal feliz para as personalidades múltiplas que vão compondo estas páginas e para quem se dá ao trabalho de as ler. (este senhor que se segue sorri com a boca e com os olhos, e eu rendo-me ao seu sorriso...)

19 dezembro 2011

Outra caderneta de outro novo bairro

A dona Rosa dos jornais e o senhor António das frutas que parecem esperar a minha saída apressada pela manhã para me darem os bons dias, a rapariga de olhos gigantes que à porta da garrafeira me detém para uma gargalhada partilhada entre dois dedos de conversa em que maldiz o género masculino, o senhor da bilha de gás que em nada se assemelha à rapariga da Galp e que vive rodeado de gatos, os empregados com ar gasto e pouco brioso do restaurante da frente, o senhor Victor do talho que corta carne com a delicadeza e a distinção de quem faz arte, a família de brasileiros que no andar de baixo recebe gente dia sim dia não e que me custa perceber se confraternizam ou se se matam. A "menina" Estrela que mora no andar de cima, que leva para mais de duas décadas de avanço em relação a mim e que me confidencia que o segredo da sua jovialidade é nunca ter casado nem ter tido filhos. As ex putas, os ex toxicodependentes e outros párias, todos alcoólicos, todos sem dentes, que vegetam no take away da frente e que controlam a rua. O rapaz imigrante que na sua loja de conveniência vê televisão no ecrã micro enquanto aguarda a entrada de um cliente menos desconfiado a quem confidencia vender muito mais barato que o "chino" da rua. Outra dona Rosa que aproveita cruzar-se comigo para falar das articulações e da puta da idade, que traz sapiência mas não saúde.
Como é boa a vida num bairro em que as pessoas se olham nos olhos!

42 abençoados

A vida é para valer, é uma só e é a arte do encontro. Ainda bem que te encontrei há tantos tantos anos atrás. Parabéns, querida oito aniversariante.

18 dezembro 2011

Ou como fracassamos sempre que nos queremos tornar naquilo que não somos



E por que carga de água lhe pus eu este título?! Talvez por ter postado a des(h)oras e com alguma obnibulação devido aos açucares resultantes da digestão dos alcoois. Toda a gente sabe que Pai Natal há só um.

17 dezembro 2011

Há 15 anos...

não estava um dia lindo como hoje mas foi seguramente o mais belo da minha vida. Almocei na Antiga Casa Faz Frio, interrompendo as garfadas para uma respiração profunda durante mais uma contração, o pai da criança c'os nervos, o Zé, empregado da casa e amigo, que transpirava quase tanto quanto ele e ambos muito mais que eu. Dez voltas a pé ao jardim do Principe Real para que a digestão se fizesse, uma paragem no Porão de Santos para dizer à quase-tia que o ia ser, uma viagem debaixo de chuva intensa até ao hospital, horas ligada a uma maquineta e as águas que não rebentavam, e a epidural que não vinha, e as contrações ao rubro, uma cortina rasgada, as águas que sairam à força de uma alavanca gigante e a epidural que não veio, e respirar o tanas!, qual respirar, qual controlo que aquela merda dói no momento da expulsão.
Às 23 horas e 13 minutos, relógio de parede assim dizia, ouvi-lhe o primeiro choro e despedi-me da minha barriga. (texto editado às 03h44 da manhã do dia 18) Quinze anos depois já comemorámos em separado; ela na casa de uma amiga que convidou mais amigas e lhe prepararam uma festa e eu a dançar até há 44 minutos atrás com pretextos vários, entre os quais celebrar a minha mais primorosa obra de arte. E eu que sempre me achei um ser sem arte!

15 dezembro 2011

caderneta do novo bairro

A mulher zangada que grita com toda a família e de quem só conheço a voz. A velhota meia surda do andar de cima que ouve a eucaristia dominical todas as semanas. O velhíssimo cão que desce as escadas do terceiro andar ao colo do dono. A angolana enorme que vende comida para fora e me trata por querida enquanto enche uma embalagem com moamba. A tia desempoeirada do restaurante marroquino que distribui sorrisos de madeixas loiras. A chinesa da loja que nos segue à distância entre taparueres e lâmpadas para ter a certeza que ninguém a rouba. O homem das obras do prédio do lado que canta queen e antónio variações.  O dono da mercearia que pendura na parede os desenhos do neto. O bêbedo desdentado que quer ser amigo da angolana mas que ela enxota com um olhar sério. Os homens da funerária que parecem mais mortos do que os clientes que enterram. As festas dos brasileiros aos domingos à tarde que inundam o bairro de samba e gargalhadas.

13 dezembro 2011

12 dezembro 2011

interlúdio musical



Misteriosos caminhos os das sinapses cerebrais. 

Hoje só me vêm à cabeça músicas assim. 
(E descubro como são, afinal, lindas)

09 dezembro 2011

Todos os anos a mesma história,

lá vamos nós representar uma tradição não acreditamos mas que se repete há 2011 anos, o pai natal que nao existe e que é producto da coca-cola mas que ainda por todo o lado a fazer fotografias com as crianças, o menino jesus nas palhinhas deitado ao lado da sua mãe que é virgem mas que o concebeu com um pai que deu logo á sola e foi para o céu salvar a humanidade e deixou a mãe a cuidar o menino, a aturar-lhe as birras e a fazer dele um homem, o san josé que não é pai dele mas que fez mais por ele do que se fosse, as luzes de natal por toda a cidade a gastarem a electricidade que nao temos, os quilos e quilos de papel de embrulho e de plástico que contaminam o ambiente e as coisas inúteis que as pessoas oferecem para mostrarem que gostam de nós, as gestões das familias separadas, o 24 com a mãe, o 25 com o pai, o comércio a queixar-se ano após ano que este ano o negócio está pior, a ausência dolorosa de quem já não está entre nós. Todos os anos montamos a farsa e nos montamos nela.

Tenham uma boa farsa 2011.

08 dezembro 2011

Digamos que foi uma noite

... "espiritualmente correcta".

É bom ter amigas como vocês. (ainda tenho uma Mary e uma Margueritta a falarem dentro de mim)

07 dezembro 2011

Hoje vai ser assim...


Mas este também não podia faltar

E amanhã é que vão ser elas. Graças à Senhora da Conceição, é dia feriado. Obrigada, senhora.

06 dezembro 2011

Quantas notas cabem numa vida?

Já lá vão cinco meses, hoje mesmo, que foste nessa tua viagem e eu a precisar de te falar na 2ª pessoa para te dar um puxão de orelhas e para podermos rir os dois.
Com que então, sempre foste um aluno exemplar... Mas viste, eu sei que viste, a caixa repleta de cartas trocadas entre ti e os teus pais e que eu descobri e "violei" com a minha irmã há dias. Cartas dos tempos em que foste entregue aos teus "amigos" padres em regime de internato, na que há-de ter sido uma tentativa desesperada dos teus pais para que tivesses juízo. E nelas, não há dúvida, bem se vê o cábula que eras. Oh pai, não me digas que não, não me lixes! Em 1958, conta redonda, fácil, já levavas 20 anos, estavas no 7º ano da época (no 7º ano!) e os alertas do director para o comprometimento do teu ano lectivo acompanhavam os teus textos quase sempre vazios e elípticos. Tu próprio dizes num deles que tiveste negativa a Filosofia "mas não faz mal, porque vocês sabem que sou bom a Filosofia". Hã hã...Ou ainda "mas as notas não interessam, o que interessa é passar, não é?"
Pois é. Se calhar até tens mesmo toda a razão. Para que raio interessam as notas nesta vida se o que importa mesmo é vivê-la e as notas são nada? Percebo que quem fez da vida o que tu fizeste, com algumas notas negativas mas com elevados valores, não se disponha a revelar à descendência esses pés de barro sem significado. Porque foi no caminho que percorreste que te conhecemos, que aprendemos as tuas mágoas, que te tornaste na pessoa valiosa que amámos. Nela ficaram as marcas de um casamento cheio de amor mas atormentado e encurtado pela ressaca de uma Guerra Colonial na 1ª pessoa, um outro em que reinou o desamor mas que durou uma vida de fuga e fingimento. E a guerra, ainda a guerra, sempre a guerra, que te enfiou o focinho nos copos de whisky como a avestruz o enfia na areia, que te impedia o sono nas noites em que os foguetes estouravam nas festas de Colares, de Almoçageme, do Mucifal, de Nafarros... Suspeito que mesmo sem foguetes e sem festa, era ela que estourava dentro de ti e que te impedia o sono nas outras noites também. Foi dela que vieste cheio de tiros colados à pele mas foi dela também que te fizeste sobrevivente numa vida em que as notas são nada, uma merda!

04 dezembro 2011

Porque os Beatles são sempre um belo pretexto

Happy birthday!!!

Aos 38 ou aos 40, ou mesmo aos 40 e picos, é muito bom ter os carochas a cantarem os parabéns. Felicidades, querida oito e sempre sempre na nossa companhia.

03 dezembro 2011

Pedro

A idade faz-nos estas coisas, traz a recordação do que nas nossas vidas valeu a pena e extrai dela aquilo que não valeu, nem uma pena nem nada, nem um chavo sequer.
Hoje é dia 3 do último mês do ano e lembro, por ser o dia dos seus anos, um dos grandes amores da minha vida.
E falar de amores não é uma banalidade. Quando se leva pelo menos metade de uma vida às costas, a palavra amor é uma constelação onde poucas estrelas cabem. E ele cabe não pelo amor que lhe tive, que foi muito mas repleto de adolescência tardia, mas mais, muito mais, por aquele que ele me dedicou. Hoje reconheço essa grandeza com muita saudade. É sempre assim, só anos passados se consegue dar o devido valor ao que se deixou fugir.
O Pedro era um homem de palco mas cheio de medo das luzes. Único na forma como contava anedotas e tão capaz de papéis cómicos, tão a jeito da sua fisionomia, como de papéis dramáticos que me faziam chorar de comoção quando subia a palco. Um homem bonito e que sabia provocar o riso nos que o rodeavam mas que chorava muitas vezes em silêncio. Um homem com uma só cara.
Um dia escolheu voar e eu sabia que um dia havia de ser essa a escolha. Conhecia-o e entendi-o como um gesto de coragem. O derradeiro mas, talvez, o único gesto de coragem que teve perante uma vida que não ia com ele e com a qual ele travava uma luta desigual. Quando o telefone tocou eu quase que já sabia que notícia ele me trazia do outro lado do fio.
Parabéns meu amigo, parabéns meu amor. Hoje eu brindo à tua vida, da qual eu me honro ter feito parte, e que foi enorme.

Frases sábias das amigas

"Há quem escolha fazer da vida uma obra prima e quem escolha fazer dela uma obra pimba!"
Como às vezes é tão fácil ver a luz e perceber os equívocos da vida!

02 dezembro 2011

Ainda que o essencial seja invisível aos olhos...

...a elegância lê-se nos gestos mais banais como, por exemplo, respirar.

01 dezembro 2011

Curta do oito aos sábados (ou às quintas feiras por ser dia feriado)



"As coisas que amamos
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto." Carlos Drummond de Andrade

29 novembro 2011

Aprende-se muito com adolescentes em casa. Aprendem-se palavras e expressões, músicas e vídeos. A nova paixão cá em casa é o Nurb.



Ou muito me engano, ou ainda vamos ouvir falar deste miúdo.

26 novembro 2011

Vantagens de habitar um primeiro andar baixinho ao pé de restaurante onde se apanham grandes pifos

Acabou de embater uma coisa destas, em tamanho gigante e apenas com o cartão semi-aberto, na minha janela e com votos gritados de "Feliz Natal". Presumo que a noite possa ter corrido mal a alguém mas eu fiquei a ganhar.

23 novembro 2011

Ele vem aí para ficar

...apesar das mínimas baixas.
EI, DEPRESSÃO DOS DIAS INVERNOSOS, VAI PRÁ-PUTA-QUE-TE-PARIU!!!

20 novembro 2011

A minha árvore

Não tive dúvidas. Mal tinha ainda entrado naquela que é agora a minha casa, já a sabia minha, como se de alguma forma eu já a habitasse. Percorri os espaços com uma não estranheza que chegava a ser inquietante. E foi ao chegar à cozinha que vi, para lá da janela, a árvore a que passei carinhosamente a chamar a minha árvore.
Era grande, majestosa até, linda, com o sol as folhas ganhavam diferentes verdes. Senti-a como um elemento protector e detinha-me horas a fio a beber o meu café matinal e a olhar para ela. Uma árvore perde as folhas a cada outono que passa, assim como nós perdemos o cabelo e ficamos mais tristes. Mas a primavera renova-a, traz-lhe vigor e a esperança de ser de novo habitada. Eu via-a perder a alegria a cada dia mas não a força. Nela pousava quase todas as manhãs um melro, não sei se o mesmo ou se vários, com o qual me habituei a uma troca de assobiadelas. Fascinaram-me sempre, os melros. Penso muitas vezes que eles transportam a alma de pessoas que amei e que, como eu, se entregavam facilmente a uma conversa assobiada. E como são simples! Completamente negros, com o bico laranja. A beleza que lhes vem da simplicidade.
Há dias fui sobressaltada com o som seco e frio de um machado que, aos poucos, desmembrava a minha árvore, sem qualquer amor, sem qualquer emoção. Parece que largava muitas folhas e que a vizinhança se queixava dos estragos e do lixo.
Da minha árvore sobra um coto. Morreu a esperança de a ver tornar-se verde. A minha cozinha está despida e pela janela só o branco sujo dos muros mas não a vida. Em mim, ficou maior o medo do uso dos possessivos. Tanto a que eu chamei meu e que a vida (ou a morte) me levou em escassos meses.
O melro, não sei se o mesmo ou se outro, canta agora numa outra árvore num quintal lá adiante. Não sei se tem quem fale com ele. Espero que sim porque eu sinto-lhe a falta.

19 novembro 2011

Às minhas parceiras setipicosoiticoisanovital

De uma múltipla com falta de inspiração e medo da exposição. Mesmo a precisar de um jantarinho animado e bem regado.

13 novembro 2011

Ruínas

Por onde quer que tenha começado,
pelo corpo ou pelo sentido,
ficou tudo por fazer, o feito e o não feito,
como num sono agitado, interrompido.

O teu nome tinha alturas inacessíveis
e lugares mal iluminados onde
se escondiam animais tímidos que só à noite se mostravam
e deveria talvez ter começado por aí.

Agora é tarde, do que podia
ter sido restam ruínas;
sobre elas construirei a minha igreja
como quem, ao fim do dia, volta a uma casa.

Manuel António Pina

12 novembro 2011

10 novembro 2011

Morena, inteligente, serena
curiosa, incisiva, sagaz
cordial, convicta, genuina
tolerante, misteriosa, mordaz
genuína, divertida, perspicaz

De humor raro que se faz de palavras poucas e olho vivo, esta múltipla estranha-se e depois entranha-se.
Parabéns, querida oito!

09 novembro 2011

Um dia destes...

faço a chamada e marco falta a quem não estiver. Ou será melhor marcar um jantar?

São mesmo o melhor do mundo

Informavam-me que amanhã temos a fotografia da classe e quase me ordenavam que eu devia vir aperaltada, "impecável!", exclamou o V. Retorqui um ora, pois não ando eu sempre impecável e bem apresentada?! Foi então que da boca de D. ouvi a revelação: entenda, professora, que nós sabemos que anda sempre a 100%. Mas o que queremos é que amanhã esteja a 200% para que em vez de parecer ter 35, pareça ter 25.
Não é da boca das crianças que sai sempre a verdade?

08 novembro 2011

Inesperada e profunda declaração de amor (ouvido no metro)

Sabes, pá, eu durante o dia até nem me sinto nada mal sozinho. Consigo suportar bastante bem. Mas à noite é que me faz cá uma falta ter companhia... Não queres namorar comigo à noite?

Dedicatória a uma oito transtornada


Desculpa lá, amiga oito, transtornar-te nesta nossa casa, mas parece que cantei esta canção ao longo de todo o meu sonho.

07 novembro 2011

Do not disturb

Entre o que tenho de um lado e não quero, e o que queria por outro e não tenho, acho que preciso de uma electrocução. Vou ali sentar-me um bocadinho na cadeira eléctrica. Por favor, não incomode.

Tacones Lejanos

Sabes pá, há dias em que se acorda já com a raiva do que se foi e do que não se chegou a ser. E ela, a puta, irreprimível, a bailar entre a goela e o ventre, come-nos por dentro e nós a querer expulsá-la a cada expiração e ela, insidiosa, provocadora, que não vai, não vai.
Acendo um cigarro, ponho o café a aquecer no pucarinho de alumínio, dou um golo e travo já o fumo de outro cigarro, abro e fecho as portas da varanda que atravesso num e noutro sentido e sempre sem saber onde vou quando as passo para o interior.
Por que razão a raiva, pergunto eu. E por que não?, torno. E por que raio de moralidade tenho de me sentir pecadora ou culpada pela sua existência dentro de mim? E que culpa tenho eu que ela tenha vindo cá morar? Não a chamei e até nem consigo conviver muito bem com ela, mas enviaram-ma com muito carinho e tenho de a aceitar.
Vou sair, penso, e transformar em passos sincopados a dor que vai cá dentro. Caminharei por algumas horas sobre os passeios desta cidade. Paro em frente à montra de uma sapataria, entro a medo que o dia não se conjuga com o verbo confiar-em-si. E olha, vê tu bem, transformei a tal coisa que tinha cá dentro num par de sapatos que para além de não muito caros, até são de salto alto, acessório que uma voz amiga me confiou não dar muito jeito mas fazer muito bem.
Hoje saí para a rua com 66 euros de raiva nos pés, que calquei, pisei, sacudi, esmaguei e acabei por abandonar nas pedras da calçada. A raiva, porque os sapatos, sendo de salto, fazem-me mesmo muito bem.

04 novembro 2011

Amores à primeira vista

Cheguei ao grande supermercado de livros muito tempo antes da hora marcada para o happening de fim de dia. Como sempre, uma impossibilidade de ali entrar, ali ou em qualquer livraria, e sair de mãos a abanar. É como a velha história de ir a Roma e não ver o Papa. Mesmo se não uma impossibilidade, uma enorme dificuldade.
Deambulei com algumas ideias bem claras na minha cabeça do que gostaria de levar para casa. Havia começado a ler, por sugestão de uma amiga do peito, um romance de Ricardo Adolfo, uma surpreendente revelação na literatura em português, mas que tive de deixar para trás no momento de retorno à pátria. "Depois de morrer aconteceram-me muitas coisas" é uma história apaixonante narrada por um imigrante ilegal que se perde na cidade onde habita não conseguindo encontrar o caminho para casa. Encontrei-o e pu-lo na cesta. Procurei "A Cidade dos Prodígios", sem sucesso. A paixão que trago por Barcelona precisava de ser alimentada por um romance que me falasse dela e era este mesmo que tinha na fisgada.
Mas como tantas vezes me acontece na vida, às vezes basta-me querer para que a surpresa me caia mesmo à frente do nariz. Não estava lá o que eu procurava mas bastou-me varrer com o olhar o primeiro expositor dos estrangeiros traduzidos para me deparar com uma capa fabulosa, ilustrada por uma imagem lindíssima do fotógrafo do instante, Catalá Roca.
E agora ando com Clara, com Daniel, com Barceló, com Julián Carax e mais umas quantas personagens, a viajar pelas ruas da Barcelona do princípio do século XX.
É o que eu sinto: Barcelona vai comigo e eu vou muito bem com ela. E este é um amor à primeira vista nada traiçoeiro.

01 novembro 2011

Inventem-se novas famílias

Tornei este outono a Barcelona com umas coisas no coração, que entretanto deixei cair pela janela (consta que em Barcelona objectos volumosos podem cair das janelas fazendo perigar a vida a passeantes mais incautos) mas vim de lá com outra bem maior. Regresso com a certeza que a família não é o conceito abstracto a que nos habituámos mas sim as pessoas e os sítios onde nos sentimos bem, onde somos de verdade, aos quais sentimos pertencer sem que pertença signifique posse. Estar em família significa cooperar, enfrentar a vida com o(s) outro(s) entendendo e respeitando silêncios, partilhando dores e alegrias. Significa discutir pontos de vista, respeitar espaços e ideossincrasias, rir, brincar, chorar, aconselhar sem impor, concedendo ao outro a liberdade das suas próprias escolhas.
Estive em família e isso é sentir-me em casa. O caminho para Portugal é por aqui (<). O meu corpo partiu mas parte de mim ficou por ali.

20 horas e 54 do dia 8 de novembro e temos


visitantes no nosso gulobe! Há muito que não me lembro de tal coisa acontecer...

Felizes reencontros outonais

ou ready for life!

31 outubro 2011

É impressão minha...

...ou este anúncio é mesmo o mais estúpido, conseguindo suplantar o da Planta?

26 outubro 2011

Ah tigre!


Às voltas com a crise e com a satisfaçao de necessidades básicas de ordem alimentar e outras, fui encaminhada, por misteriosos critérios da web, para o até entao ignorado site "losplaceresdelola". Sem saber muito bem o que fazer, e a princípio encavacada como se alguém estivesse a espiar-me, venci o medo do desconhecido e lancei-me a explorá-lo. Eu, que só com olhares de esguelha me atrevi a mirar a montra de uma sex shop, imagine-se, entrava agora no mundo novo de artigos estimulantes para as necessidades libidinosas. Entre sugestoes várias, despertou-me particular atençao o Tiger G IV (4a generación), singelo vibrador duplo que promete penetraçao com muito prazer, vibraçao clitorial, máxima potência, para além de loucuras submergíveis e à tona de água.
Ora, deitei-me a contas à vidinha. Se em vez de um Tiger arranjar um amante, tenho de contar com pelo menos 15 euros para cada jantar rachado a meias numa tasca razoável. 7x15... 7 jantares e já o material compensa. Juntando-lhe prendinhas, fins de semana pseudo românticos, gasolina para as visitas, saídas aqui e acolá, contas de telemóvel, está a coisa amortizada em menos de nada. Se a isso acrescentar a virtude de nao falar, poupando nas vazias juras de amor, nas batalhas verbais e na saturaçao que delas advém, nos silêncios que incomodam por estarem sempre no momento errado, nao me restam dúvidas. Um clique no "Registrate", outro no "añadir a tu cesta" e já está. Primeira medida de austeridade tomada e satisfaçao a qualquer hora garantida. O Tiger G IV é meu, até que saia o de 5a geraçao, desde que este mantenha como característica a mudez total, que aqui quem fala sou eu.

25 outubro 2011

Tudo era mais tranquilo quando tinha 5 anos

Consulta no pediatra. Agora também a criança faz perguntas, puberdade oblige. 

Púbere que anseia por ser adolescente: É possível que eu já tenha esperma?
Médico, pedagógico: Se acordas molhado, sim. Se são só umas gotas durante o dia, é porque te entusiasmaste com qualquer coisa, e pode ainda não ser esperma.

No fim da consulta, o miúdo regressa ao ataque.

Púbere petiz: O que são chatos?
Médico, seríissimo: São piolhos da pila.

O que eu gosto de respostas simples.

23 outubro 2011

Da janela da frente para a minha


Do prédio em frente, umas janelas abaixo, saíu esta manha à varanda. Camisa de dormir descomposta e pantufas vermelhas, os cotovelos apoiados no varandim suportando um corpo hoje agastado, percebi que chorava, enquanto a chuva lá fora, e o choro, a princípio discreto, ía-se tornando mais intenso e descontrolado.
Encontro-a de novo, horas mais tarde, corpo atirado numa cadeira, a mesma camisa, as mesmas pantufas vermelhas e uma dor que já nao consegue calar.
Chora, leva as maos aos olhos com fervor, fala sozinha, afaga os cabelos despenteados, as maos que entalam a camisa por entre as pernas, chora de novo, torna a falar. E ninguém a ouve, ninguém excepto eu, que percebo a sua dor, que me encontro nela e com ela me inquieto. Seja lá o que for que lhe aconteceu, é contra o vazio que luta, o corpo incapaz de se erguer daquela cadeira.
E eu a vê-la e com vontade de a abraçar e de lhe dizer que a dor que sente vai ser mais pequenina daqui por uns tempos. Sem que ela sequer suspeite.

03 outubro 2011

mistérios da vida

Eu + aqui = 4 anos e 1 mês.

Nunca vou perceber como acabei por gostar tanto de umas malucas tão insanas como vocês!

À atenção da oito (ou banda sonora para o post de baixo)

28 setembro 2011

Ouvida na sala de aula

A discussão estava lançada e versava sobre as disputas meninos - meninas, direitos de ambos e deveres de cada um para consigo próprio e para com o outro. Claro está que, com 9 ou 10 anos, cada uma das partes apenas tem a dizer da outra o pior possível, recusando quase todos o simples facto de partilharem a mesa com o género oposto.
Eis que o Vasco, normalmente portador de palavra sensata, resolve dizer, alto e bom som: "Pois eu até gosto muito das meninas! E não tenho dúvida nenhuma: quando for adulto quero casar-me."
Até aqui a coisa ía, provocando muita risota e algum rubor no semblante de algumas das "fillettes" que se sentiam já visadas. O pior veio a seguir, quando o Vasco especificou:
- Quero casar-me porque quero ter alguém a fazer-me o jantarinho e a ocupar-se da cozinha e das crianças enquanto eu vejo televisão e leio o jornal.
Nesse momento, a risota foi geral e até eu não resisti. Mas no meu íntimo não deixo de pensar nesta concepção de mundo que já existe nesta verde cabecinha. Bem sei que este e outros vascos da mesma idade têm muito tempo pela frente para reformularem os seus modelos mas... será que reformulam?

26 setembro 2011

Ouvido na rua

Ele: E acordaste e estavas a sonhar contigo própria?
Ela: Eu às vezes acordo e estou eu ao meu lado!

Ou isto era conversa de engate ou o meu Eu é muito mais uno e muito menos esquizóide do que eu supunha. Um daqueles momentos em que me sinto estranhamente equilibrada.

17 setembro 2011

O fascinante mundo de Jack (sendo este um taxista absolutamente saudável)

(Promissora cliente tentando engolir à pressa o último pedaço do bolo de arroz antes de entrar no táxi.)
Cliente - Desculpe tê-lo feito esperar.
Jack - Sem problema. Estava com fome?
Cliente - Fome, fome... Não era fome mas sim necessidade de comer. Estava a sentir-me um bocadinho mal disposta.
Jack (interessadíssimo e mostrando-se conhecedor) - Mas tem problemas de glicémia?
Cliente - Bom, que eu saiba não. Era apenas uma fraqueza.
Jack - Eu, graças a deus, não tenho problemas nenhuns de diabetes, nem colesterol, nem hipertensão. Nada... A única coisa que tive até hoje foi uma neoplasia no intestino aos 26 anos. (cliente à rasca, sem saber o que dizer). Duma vez cortaram-me 1 metro e meio de intestino. (cliente solta um "ha ha..." só para não estar caladinha). E não faço control nenhum!
Cliente - Então mas não era melhor fazer?
Jack - O que faltava enfiarem-me um chicote deste tamanho ( gestos largos das mãos que largaram o volante), desculpe a expressão, pelo rabo acima!
Felizmente as viagens de táxi terminam mais cedo ou mais tarde e esta foi curtinha mas um bom taxista pode dar-nos a conhecer todo um mundo novo.

12 setembro 2011

Ter e não ter

Tenho saudades dos dias em que me sentava ao teu colo e tu, sem admitires que podíamos ser em tudo diferentes, me obrigavas a copiar de olho os desenhos das capas dos cadernos. Eram os Meninos Rabinos os das capas dos cadernos, lembras-te? E o meu insucesso estampado na tua desilusão. Tenho saudades de quando nos penteavas a preceito, a mim e à minha irmã, ou não nos penteando, e nos fotografavas enfeitadas de flores ou de colares de pedras falsas, verdes e cor de rosa.
Passaram tantos anos e tu sem nunca me dizeres "amo-te" e eu sem nunca te dizer "amo-te".
Lembro aquela vez em que não tinhas roupa lavada para que eu e a minha irmã fossemos à praia, e esta é a única explicação que aceito, e em que nos convenceste que em Espanha toda a gente ia à praia com aquela vestimenta a que nós chamávamos camisa de dormir. E fomos. Eu sempre cheia de vergonha mas fui. Só tu para me fazeres exibir uma camisa de dormir em plena Praia Grande! E depois da praia, eu invariavelmente escaldada, passavas-nos no corpo álcool canforado, com propriedades calmantes e refrescantes que só tu sabias. Porque nunca te disse, como não te disse que te amava, mas a mim pareciam-me agulhas.
Tenho saudades da tua música sempre a tocar e de saber que nunca estavas lá, de onde a música saía, porque te deslocavas como os gatos e subias as escadas sempre sem ninguém dar por isso. Se quisessemos encontrar-te, o melhor era usarmos o olfacto e detectarmos de onde vinha o cheiro a cigarros que comias e que bebias como bebias café.
Tenho saudades das tuas mãos que raramente tocaram as minhas, pelo menos não a tempo de eu o poder recordar. Mas as tuas mãos são em tudo iguais às minhas! Agarravam a vida e os livros e o volante do carro que te herdei da mesma forma que as minhas agarraram as tuas a poucos dias de desistires de me querer.
Ensinaste-me quase tudo o que sei e muito mais quiseste que eu aprendesse, sem sucesso. Mas ensinaste-me aquilo que para mim é fundamental, a lealdade.
Tenho saudades das tuas mãos que raramente tocaram as minhas, da tua música, dos teus discursos ateus viscerais, das nossas discussões por convicções diversas, das vezes em que não me disseste que me amavas e das vezes em que, a caminho do fim, eu tive coragem de te chamar "nomes maricas" e de te dizer "amo-te".
Tenho saudades tuas, pai.

15 agosto 2011

e amiga

Soneto do amigo, Vinicius de Moraes, saravah!

Enfim, depois de tanto erro passado 
Tantas retaliações, tanto perigo 
Eis que ressurge noutro o velho amigo 
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado 
Com olhos que contêm o olhar antigo 
Sempre comigo um pouco atribulado 
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano 
Sabendo se mover e comover 
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

03 agosto 2011

foi você que pediu

uma máquina de lavar azul? e para quê azul se a imaginação é o limite para a sua máquina? saiba mais aqui

23 julho 2011

Frase Nicola

"Um dia alguém vai dizer-te: amo-te e tenho saudades tuas. Hoje não é o dia."

04 julho 2011

i just can't get enough

Finalmente encontrei a autocaravana, depois de muitos anúncios e telefonemas. Mas nem aqui me safei de burocracias. As autocaravanas precisam de seguros. Os seguros são caros. Através do clube português de autocaravanismo consegui chegar a um seguro razoável, que não me deixa sem dinheiro para o gasóleo. Fiz-me sócia. E o grande momento chegou: 
"Companheira oito e coisa,
Acusamos a recepção da sua candidatura a sócia do C.P.A.
Foi-lhe atribuído provisoriamente o nº 1234.
Após aprovação formal em reunião de Direcção, enviaremos toda a sua documentação.
Ao dispor, Saudações Autocaravanistas"

Oh a infinita glória de ser autocaravanista.


03 julho 2011

brisa

Recordo o prazer daqueles dias em dormia na casa dos meus avós, aqueles dias que se sabiam iguais, em que o tempo era diferente do tempo da escola ou dos fins de semana. Era aquele prazer que sentia ao acordar com o canto do galo tediboy, despedir o meu avô que saía logo cedinho para trabalhar e ficar só eu e a minha avó a fazer as rotinas da vida: dar dois biscoito ao cão da vizinha acompanhados de umas palavras meiguinhas, recolher o ovo quentinho da galinha e fazer uma gemada com pao e ovomaltine, tratar dos animais, as rendas e os bordados, o repassar vezes sem conta o enxoval já preparado para um futuro que levaria muitos anos a chegar, o descobrir uma e outra vez os jogos de madeira que o meu avô guardava como a um tesouro, escondidos sempre no mesmo sítio, usados e voltados a guardar, com cumplicidade e respeito. Foram momentos que deixaram de repetir-se há muitas vidas atrás mas que ao recordá-los parecem atravessar-me de  novo vindos de lá muito atrás para dizer, presente!

retroprospectiva

Ah que saudades do tempo em que a oito pendurava frequentemente posts fresquinhos aqui neste lençol, das descriçoes das casas habitadas por bichos e quem sabe que mais, das histórias de videntes em istambul ou do rapaz que comia sapos (ou seria lagartos?), de quando se brincava aos amores ou se escrevia ao desafio, se debatiam opinioes e havia comentários sérios, divertidos ou fora de tom. Que saudades do tempo em que isto nao era um velho café abandonado onde se vêm cá guardar umas coisas porque nao se sabe muito bem onde pô-las. Qualquer dia falo com as minhas sócias a ver se damos aqui uma limpeza, pomos um letreiro na porta, vendemos isto a um milionário japonês e vamos todas de férias conhecer as maravilhas do caribe.

30 junho 2011

Dificuldades:

nao saber o que fazer com a constataçao de que as mulheres fomos ensinadas desde pequenas a desconfiar à partida e à chegada, de TODOS os homens e ao mesmo tempo, a encontrar UM a quem amar perdidamente e ser alma sangue e vida em ti e dizê-lo cantando a toda a gente. E em nesse um cai toda a responsabilidade de nao ser igual a todos os seus outros semelhantes, ao mesmo tempo que, nao se aceita muito bem se  ele for de facto muito diferente, de modos que assim é, assim como assim nao somos muitxs aqui por estes bandas, aproveito e venho cá estender uma posta de pescada neste céu azul, com aquel sol de maos lá em cima, antes que venha chuva.

27 junho 2011

Conversas cheias de passado, presente e futuro

A rapariga até já nem era uma catraia. Talvez uns 30 anos. Mostrava-se indignada e gesticulava enquanto, sentada na esplanada, discursava para o telemóvel. Quando passei, não pude deixar de ouvir: "tu, no dia em que souberes cativar uma mulher...!" e insistia, não fosse ele ser surdo, ´"siiiiiim, no dia em que souberes ca-ti-var. Ouviste bem?".
Eu não quis ouvir mais mas não consegui conter uma gargalhada. Ca-ti-var. Há homens que sabem, mas aqueles que não sabem também não acredito que venham a sabê-lo.

24 junho 2011

Estou mesmo precisada

Ora aqui segue uma anedota de salão, que fica sempre bem

Casal supé-queque discutindo organização da vida semanal de recém casados:

-Olhe, Kiki, há certas rotinas a que, a partir de agora, a menina tem de se habituar. À segunda e à quarta feira eu jogo golfe com a rapaziada da empresa; à terça reunimo-nos sempre para uma prova de vinhos; à quinta tenho uns amigos com quem pratico ténis; e à sexta é quando jogo umas cartadas de póquer. Ao fim de semana eu e a menina podemos então passear e dedicarmo-nos às nossas actividades como casal.

- Certo, amor. Em contrapartida também tenho umas actividades de que não abdico: às segundas, quartas e sextas fode-se nesta casa. Quem está, está. Quem não está, estivesse.

22 junho 2011

este ano na praia


foto aqui

rame rame

É estranho, sinto-me estranhamente próxima dele e muito muito distante. Ele diz que me ama, me quer e me deseja. Eu acho que ele me ama porque me deseja. Da minha parte acho que nao o desejo porque ainda nao sei se o posso voltar a amar.

O melhor seria cortar com isto de uma vez por todas em vez de andar aqui no rame rame, mas acho que tenho medo que a dinâmica de relacao dele com o filho ainda nao esteja resolvida, ou entao é mesmo a nossa dinamica que ainda nao está resolvida, e eu acho que se eu disser que nao quero nada com ele, ele pode abandonar o filho que tanto o adora.

Se assim é, eu devia era dar-lhe um par de patins já.

Mas também nao é bem isso, já nao sei o que sao os meus medos e o que sao as possibilidades reais, nao sei.

Como eu gostava de me abrir às pessoas, ao mundo a mim mesma, abrir o coraçao em vez de insistir em ser a minha própria carcereira.
Receita de mulher

As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
Qualquer coisa de dança,
qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize
elegantemente em azul,
como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. É preciso
Que tudo isso seja belo. É preciso
que súbito tenha-se a
impressão de ver uma
garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só
encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas
que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso,
é absolutamente preciso
Que seja tudo belo e inesperado. É preciso que
umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como no âmbar de uma tarde. Ah, deixai-me dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos então
Nem se fala, que olhe com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas,
e as pontas pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras:
uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes. Indispensável.
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem
No entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser frescas nas mãos, nos braços, no dorso, e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior
A 37 graus centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras
Do primeiro grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não estará mais presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.

Vinícius de Moraes

Sinfonia nº 40 de Mozart



Para a oito aniversariante que entrou ontem neste mundo das mulheres de quarentas

20 junho 2011

Amanhã...

... coloca-os nas orelhas e sai para a rua com a certeza que o dia é teu. E depois de amanhã, e depois de depois de amanhã...

17 junho 2011

Porque hoje é sábado

e porque pintar paredes é uma forma de expressao como outra qualquer, aqui fica mais uma curta do oito:


BIG BANG BIG BOOM - the new wall-painted animation by BLU from blu on Vimeo.

14 junho 2011

this is your birthday



Hoje é o teu aniversário, querida oito, e queremos que tenhas um dia muito feliz, hoje e sempre.
E cá estão os Beatles a "regarem" ocasiões importantes.

08 junho 2011

banda sonora casual

A amiga contou que encontrou a casa para onde vai viver, depois de anos de infelicidade. Contou como chorou quando saiu da sala onde assinou o contrato da casa nova. Contou como está com medo mas também com muita vontade de tudo o que aí vem. Enquanto isso, o que tocava era isto na minha sala:





Ou muito me engano, ou os Beatles conseguem ser a banda sonora de quase tudo o que acontece nas nossas vidas.

07 junho 2011

o que é natural é mesmo bom

e como até nao fui em quem escreveu isto lá em baixo, aproveito e faço aqui um comentário para encher chouriços, ou neste caso, pepinos.

A primeira aclaraçao que quero fazer, ainda que nao seja relevante para o essencial da questao, é que, do que li nos jornais espanhóis sobre a história da infecçao com a bactéria do pepino espanhol na Alemanha, nunca vi mencionado nada sobre a sua origem ser de agricultura biológica

Mas isso nao é relevante para a questao. É um facto que prefiro quinhentas mil vezes produtos de origem biológico, tratados sem pesticidas, que sejam produzidos relativamente perto de onde vivo e que nao tenham que consumir imenso combustivel para poder chegar às lojas onde compro. Aprecio muito mais o sabor dos alimentos quando estes sao cultivados de acordo ao seu tempo certo e nao sobre pressao. Tenho a certeza que os produtos químicos industriais com que aceleram a amadurecimento ou protegem os alimentos sao nocivos para os mesmos, para os mantos freáticos e para o ar dos sítios onde sao produzidos (muitas vezes em diversos pontos do planeta, onde o trabalho de uma pessoa é pago a preço de escravo).

Mas tudo isto nao exclui que os alimentos, sejam eles de origem biológicos ou nao, têm de ser submetidos a um controlo de qualidade para poder evitar situaçoes como esta. Nao é fácil detectar a bactéria, mas em vez de mandar alfinetes para a polónia, bem se podia investir em investigaçao para prevenir situaçoes como esta.

05 junho 2011

banda sonora desta noite



(cheira-me que vou continuar a sentir-me mal mos próximos tempos)

03 junho 2011

Tudo tranquilo em Atenas

01 junho 2011

O que faz falta é abrir os olhos

e abrir os olhos é, neste caso, bater no ombro de quem nos dá notícias e perguntar: por que razão nada sabemos sobre o que se está a passar nas ruas da Grécia?
há live stream aqui, notícias aqui ou aqui, mas pouco ou nada se sabe em Portugal.
Soube disto pelo  Portugal Uncut. E fiz o que lá sugerem: enviei emails a meios de comunicação social, pedindo que nos informem do que se passa no mundo e na Grécia.
Depois de terem ignorado os dias iniciais dos protestos em Espanha, e de terem feito uma cobertura tardia e limitada das repercussões em Portugal, os media portugueses insistem em fechar os olhos, ou em tentar fechar-nos os olhos, em relação a outro palco de contestação em curso: a Grécia.
São pelo menos cem mil nas ruas em Atenas há vários dias, a protestar contra as medidas de austeridade, a intervenção do FMI, a complacência do governo, a vida que não podem viver.
Nisto, os media portugueses não estão sozinhos: o bloqueio é geral. Percebe-se que o efeito claro das políticas de austeridade impostas pelo FMI desde há um ano não seja uma visão agradável que para quem tenta implementar o mesmo plano sanguessuga por outras paragens; e menos será a consciência de que as pessoas não estão rendidas ao que lhes vendem como inevitável, e que um ano de austeridade e ameaças as faz sair para a rua em massa. Mas não será precisamente porque a Grécia é um exemplo tão próximo e claro que o jornalismo digno desse nome devia fazer questão de pelo menos noticiar? já nem falamos de isenção, debate, investigação - apenas da obrigação básica de informar. Mais ainda num país em campanha eleitoral para umas eleições que se disputam em torno das questões da austeridade e das imposições da mesma troika responsável pela situação grega.
Existem alguns artigos on-line|1|, transmissões em directo|2|, e até a hashtag #greekrevolution no Twitter. Se os media não cumprem o seu papel, há quem o faça. Mas acreditamos que o contributo da comunicação social para o debate e a informação dos cidadãos é insubstituível, e que jornalistas sérios não prescindem das suas obrigações éticas. Por isso, aqui fica o apelo: façam o vosso trabalho, e informem-nos acerca do que se está a passar na Grécia.

Quantos mais formos, mais eficaz será a nossa voz.

31 maio 2011

Os peixes vermelhos

amadurecem nas árvores e vivem entre as nossas bocas. E é essa liberdade que os mantém vivos e vermelhos. Os aquários constrangem.
(para a 8 da aquariofilia, uma curta-ao-sábado-que pode-até-ser-terça-feira)

30 maio 2011

O que é natural é bom

Li no Público que a bactéria que anda a matar na Alemanha vem de pepinos biológicos espanhóis.
Pondo de parte todo o caos lançado quando se acusa um país de andar a exportar vegetais contaminados com uma bactéria (li também que o governo espanhol está a considerar a hipótese de exigir responsabilidades à Alemanha devido às especulações que têm surgido), esta história faz-me pensar nos milhares e milhares de seguidores da ideia de tudo o que é biológico é bom.
Ah e tal os pesticidas matam. Pois matam. Mas também a Escherichia coli mata. Ou a cicuta.

29 maio 2011

Eloisa e os bichos

mais uma deliciosa curta do oito aos sábados que às vezes sao domingos. Sobre os países que ganhamos e que perdemos.



Made (e muito bem) in Colombia

28 maio 2011

Deram-me ordem que a soltasse...

e a franga acabou nisto:

Alguém me chamou?

Vou manifestar o meu desalento com a porra dos políticos e das políticas e voltarei mais tarde.

Une histoire d'amour



Ou de como no teu amor me reencontro.

27 maio 2011

Oito, volta lá!

"Quando surgiram as questões sobre o aborto, Passos (e cito Carlos do Carmo Carapinha) disse que a lei do aborto deveria ser avaliada: “precisamos de fazer, tal como aliás está previsto, uma reavaliação dessa situação! (sic). De seguida, Pedro Passos Coelho recordou à jornalista da RR que esteve “há muitos anos do lado daqueles que achavam que era preciso legalizar o aborto – não era liberalizar o aborto, era legalizar a interrupção voluntária da gravidez -, porque há condições excepcionais que devem ser tidas em conta”. Mais adiante concluiu: “Temos de reavaliar essa situação, não no sentido de voltar a cara a esses problemas, de ter qualquer intolerância em relação a isso, mas para poder ajuizar se se foi até onde se devia ter ido ou se se foi um pouco longe demais”. Pelo meio, deixou no ar a ideia de que não se deve pôr de parte a ideia de um novo referendo (explicando mais tarde que os políticos não são donos da democracia), embora: 1) seja necessário primeiro avaliar a aplicação da lei; 2) um novo referendo não faça parte do programa do PSD."
Jmf, no Blasfémias

O Correio da Manhã, na sua edição em papel, tinha hoje uns números acerca do aborto (a propósito dos milhões que custam ao SNS). Ao almoço, leram-me qualquer coisa como a percentagem de miúdas com menos de 20 anos tinham feito 3 abortos no mesmo ano. Como não decorei o número, não o repito.


26 maio 2011

a alegria está nos pequenos pormenores

Movimento Cívico UMLLAO 
(Uma Máquina de Lavar Loiça Azul para a Oito)



Porque ninguém merece comer batatas fritas congeladas assadas no forno.

quase entropia

Tenho fome. Se cozinho para confeccionar alguma coisa preciso de lavar a louça, nao consigo cozinhar no meio da louça suja. Para lavar a louça falta-me a vontade. Decisao: batatas fritas congeladas no forno e a certeza de querer uma máquina de lavar a louça nível A de eficiência energética/ambiental e se houver em azul ainda melhor.

Dramas de uma quase solteira


Diz para aí que quando se deixa de ver nos olhos do outro um aquário cheio de peixes para se passar a ver apenas e nada mais do que uns olhos (ou outros quaisquer), então é porque está na altura de levantar a âncora e zarpar rumo a outro porto. Não interessa o se o mar é revolto, não interessam os cabos cheios de perigos à espreita que terão que se contornar, tudo menos a paz podre instalada no pântano fétido de uma coisa que já foi, não é e não será nunca mais.

Estava eu a preparar a embarcação, o astrolábio e o mirante, a estudar a posição das estrelas e a decorar algumas constelações, quando fui tomada por um calafrio tremendo e que resume o motivo da minha posta: como é que vou apertar sozinha o fecho eclair do meu vestido de noite?

Não, não vale a pena sugestões como “compra outro vestido sem fecho”. O meu dilema é grande. Anyone?

mulher à beira de um ataque de nervos

Tonturas, azia e uma urgência de emigrar. Que raio de país é este em que vivemos? Que raio de país é este em que estamos prestes a eleger (estão vocês, porque comigo o psd não conta) um 'homem invulgar' que para além de querer ser mais troikista que a troika, aparece agora com a vaga promessa de rever a lei do aborto?
Vou ali tomar um kompensan e já volto.

a partir de hoje será assim



obrigada, filipa, por lembrares o bem que isto faz.

(mas duvido que algum dia consiga fazer isto com a perfeição de movimentos com a alexandra sequeira o faz. Digam lá se não parece tão estupidamente fácil?)

23 maio 2011

prontos, pá,

Acho que (re) encontramos o nosso cabeçalho! Grande bem haja, Oito!

22 maio 2011

Pudera

A propósito de depilados, exfoliados, hidratados e esteticamente angustiados homens, lembrei-me de uma anedota. Em estrangeiro e tudo.

- Barbie comes with Ken?
- No, she fucks with Ken. But she only comes with Action Man.

pequeno nada

gosto tanto da fotografia do cabeçalho.

quem tem avó tem tudo

video de uma avó para conseguir trabalho para o neto desempregado.E o que é certo é que o rapaz agora tem imensas ofertas.

17 maio 2011

O saxofonista


Há muito tempo atrás, pelos meus 20 e alguns anos, durante um largo tempo tinha um sonho de homem ideal. Era um saxofonista, amava-me perdidamente, passava muito tempo fora em concertos, mas também estava bastante em casa, tinhamos três filhos, e tudo era lindo no que consigo recordar dessa fantasia. Para dar-lhe alguma forma para contnuar a alentá-la, algo próxima da vida “real”, idealizei o yan garbarek, vi dois concertos dele, comprei os discos, só me faltava ter um poster de tamanho gigante no meu quarto, era alguém como ele que eu desejava para viver a minha vida. Sonhava com um homem ideal, ainda pensava que a vida se escreve em traços largos e nao nos desenhos e  esboços continuos que se ensaiam na vida dos dias a dias, e que fazem apagar e voltar a desenhar, sempre jugando com as luzes e as sombras. Agora já conheço mais traços finos, já sei que os homens ideiais nao existem, já sei que o amor ata e liberta e mesmo assim, mesmo assim, anda de novo um saxofonista a rondar a minha cabeça.

16 maio 2011

Talvez seja isto

"You can´t win, Charlie Brown". No myspace deles.

libertação:

Não sei se te amei. Mas amo o que resta do que nós não fomos.

15 maio 2011

Invejo...

... a liberdade dos pássaros que esvoaçam, frenéticos, do lado de fora das minhas vidraças. Eles tão felizes e eu tão presa...

há um ano que te foste

e isto foi o que ficou:
















e pouco mais.

14 maio 2011

hoje de manha

depois de uma manifestaçao grande contra os cortes na saúde, educaçao, trabalho, cooperaçao, etc., voltava para casa a pensar: 

Em Portugal é vox populi aceite por toda a gente que somos um povo conformado, submisso, que em Espanha é que sabem sair à rua reivindicar e protestar. E contudo, temos uma história feita de muitas resistências a poderes que nao desejávamos e já soubemos voltar página e soltar a poesia na rua muitas vezes.

Na Catalunha e em Espanha também circula a ideia de que ninguém reage, que as pessoas daqui estao acomodadas nos seus cantos, que em França é que o povo sabe sair à rua, e contudo aqui nunca vi uma manifestaçao que se pudesse dizer pequena, (ainda nem há um ano, confesso que fiquei força impressionada quando vi um milhao de catalans i catalanes a ocuparem as ruas para defender o seu estatut de naçao).

Nao sei como se vê a si mesma a cidadania francesa. Se calhar,  enquanto vao montando a barricada para fechar as estradas de norte a sul, vao pensando que desde a revoluçao francesa que nao passa nada de extraordinário, que as pessoas só querem é o seu cantinho...

tendências primavera verao

dos homens com pêlos sim ou nao, acho que cada pessoa tem direito a decidir sobre os seu pêlos, independentemente de ser gajo ou gaja.

Eu cá ando a deixar crescer os meus, mais um bocadinho e consigo fazer trancinhas nas pernas e inventar a moda da pernocabeleira. Podia ser um bom negócio para o verao, junto-me aos que fazem rastas e penteados e especializo-me em pernas e passo o verao na praia em vez de estar enfiada naquela sala de trabalho que uns dias me faz estar contente de estar ali e outros me faz preguntar, mas será que quero mesmo estar aqui?

Quem vai à guerra


Quem vai à Guerra from Real Ficção on Vimeo.


Ontem vi este filme, realizado pela Marta Pessoa, no Indie. Agora resta esperar que não demore muito a aparecer nas salas.

13 maio 2011

O corrimao

Nao sei porquê lembrei-me do corrimao das escadas que separavam o rés do chao do primeiro andar, que separava a casa dos meus avós da casa dos meus pais e nossa, dos irmaos. Primeiro foi de metal, anos 70, depois puseram um novo, de madeira. O corrimao separava o andar de cima do andar de baixo. Eu descia por ele abaixo como se fosse um escorrega, descer as escadas era um prazer, era o meu parque de diversoes dentro de casa, passava ali horas, ou a jogar à bola com o meu irmao, um no meio das escadas e o outro em cima. Quando a minha mae se zangava comigo e vinha atrás de mim, eu fugia rapidamente pelo corrimao para o colo seguro do meu avô no andar de baixo. Muitos anos mais tarde, quando os meus avós já nao existiam, o corrimao servia para que a minha mae nele se apoiasse quando subia as escadas, lentamente, toda aquela eternidade que separava a sua cama onde estava a maior parte do tempo, horas e horas olhando para nada, pensando coisas que só ela o sabia,  da porta da rua, de toda a vida de fora que já nao sentia sua, que já nao reconhecia. Agora, o corrimao apoia o homem que já viu muitos sóis e muitas luas e quer continuar a ver mais algumas, quando este desce da solidao da sua casa para a solidao da rua.


O corrimao separou e apoiou muitas vidas nas nossas vida naquela casa. Está bambo, meio torto, mas continua lá entre aqueles dois andares aos que ainda chamo casa, apesar de que deixei de viver lá há muitas casas e muitas vidas atrás.