30 setembro 2007

Receita

Para harmonizar sentimentos que pululam como pipocas na panela: ponha o volume no máximo, levante-se da cadeira, vá respirando lentamente enquanto a música não desenvolve e depois, à medida que, dance, dance desenfreadamente, faça moche com as cadeiras, com o sofá, com o cabide da entrada, com a porta da casa de banho, com o tecto, evitando as arestas:



Quando terminar, respire outra vez fundo, beba dois goles de água e veja o vídeo.

Fica-se como nova!

A bola é redonda, tudo pode acontecer

Sábado à tarde, chuva incessante, dia de derby nacional, bilhetes para a catedral para toda a família benfiquista. Toda? Bem, quase toda. Existe uma criança que resiste ainda e sempre à febre genética pelos encarnados, e num acesso de personalidade consegue enervar toda a gente insistindo em ser sportinguista. Decidimos mesmo assim levá-lo connosco ao futebol.

Todos exibimos os nossos cachecóis com águias, o pequeno infante leva um leão na sua. Não há de ser nada. Chegamos aos lugares marcados, que isto de ir ao estádio já não é o que era, os lugares são reservados e nos inúmeros bares à escolha lá dentro até há sandes de queijo da serra ou de paio de porco preto, os couratos já devem ter dado a alma ao criador, sentamo-nos mesmo em frente à bandeirola de canto. Que emoção, com sorte vemos o golo da vitória em primeiro plano, ao vivo e a cores.

Um rapaz aproxima-nos para nos dar um conselho: é melhor que o miúdo esconda o cachecol verde, vá-se lá saber porquê sentaram-nos ao lado (mas mesmo ao lado, quase ao colo) dos Diabos Vermelhos, que ainda na semana passada ameaçaram de pancada uma mulher que era da equipe contrária e que teve o azar de se sentar perto deles. Um dos stewards vem-nos dizer a mesma coisa. Eu, que já não ia muito feliz para um sítio com milhares de pessoas potencialmente agressivas, começo a hiperventilar. Como se não bastasse, a Juve Leo está posicionada no outro canto da mesma baliza, a acicatar as almas que foram chegando para ocupar o sítio da claque. Aquela gente nem está interessada no jogo, vêem já ébrios destilar o seu fel do dia a dia para um alvo de cor diferente. As massas acéfalas assustam-me de morte.

Ajudadas pela chuva que nos encharca, tentamos procurar um sítio mais tranquilo para ver o jogo com a criança. No meio disto, tentamos explicar a uma inocente criatura de 7 anos que há gente que nos pode fazer mal apenas porque ele gosta da equipe contrária. A natureza humana é tramada.

Depois de muitas voltas e indecisões, descobrimos finalmente um sítio onde parecemos a salvo. Por incrível que pareça, o oásis estava entre as duas claques, que se coibiram de nos brindar com granadas de ataque e defesa por cima das nossas cabeças.

Duas filas atrás de nós estavam 3 mulheres sentadas, vestidas de encarnado dos pés à cabeça. Gritavam e berravam os maiores impropérios aos jogadores do sporting. O miúdo, espantadíssimo, olhava para elas que lhe iam repetiam "oh amor tu não oiças isto", "oh amor, isto não é para repetires", enquanto para baixo atiravam "oh palhaço, a multiópticas já dá desconto igual ao da idade" "Cabrão, cona da mãe, a tua avó nunca devia ter nascido!" "Liedson, devias era partir uma perna, paneleiro de merda", pontuado com "ai se a minha mãezinha me ouvisse". O estímulo aos jogadores preferidos também era bom de ouvir "Luisão, seu cabeçudo, a tua cabeça vale ouro" "ah grande Quim, anda cá que eu já te conto". Enquanto isso, Di Maria insistia em não acertar.

No final de contas, a batatada maior a que assistimos foi em campo, mesmo à nossa frente que tivemos a sorte de ver que a bola bateu no ombro do Katsouranis e toda a gente pedia penalti sem se perceber porquê. Até o santo do Rui (por esse gritava eu) se meteu ao bedelho.

Pouco depois houve finalmente um lance que ia dando golo ao Sporting. O miúdo já pensando que não sofreria sevícias, não se controlou e gritou "GOLO!". Viraram-se centenas de cabeças para ver quem era o anormal. A nossa sorte foi ter sido apenas falso alarme.

Viemos embora, incólumes mas pouco satisfeitos com o resultado. No carro ouvimos os comentários na TSF. Veio-me à memória uma tirada de um vizinho de cativo de há uns anos atrás, que no final de um jogo exclamou, batendo com as mãos na barriga, "aaah, agora vou para casa, comer que nem um porco e ver os resumos todos". Burp.

29 setembro 2007

Once in a lifetime

Andava eu por aqui e por aqui , quando tropecei nesta notícia e respectivo vídeo.

E não é que, pela primeira vez na vida, estou de acordo com qualquer coisa que Pedro Santana Lopes disse e/ou fez? Foi-se embora? Não quis falar mais? Fez muito bem. A SIC esteve mal, atropelando princípios básicos de educação e de respeito. Nem que seja para (não) entrevistar o 'the special one'. Ou o papa. Ou o zé dos plásticos.

(e acabei de saber agora mesmo, pela mesma SIC, que Luís Filipe Menezes sucede a Marques Mendes na liderança do PSD. Com a possibilidade de Santana Lopes se candidatar à liderança parlamentar. Parece que Pacheco Pereira está muito melindrado. É ir aos respectivos blogues e confirmar como vão os moods.)

Ordem e desordem


Eu sei que este meu desabafo perto deste é coisa pouca, de qualquer modo não posso deixar de me manifestar. Eu explico: durante 3 semanas a minha vida foi uma não-vida. Isto é, nada mais fiz do que trabalhar numa rotina que era muito simples: acordar alvoraçada pelo despertador, pensar 'bem que dormia ainda mais umas horas', tomar banho, vestir, bater a porta, trabalhar, trabalhar, trabalhar com um dealine a pesar mais que a excalibur em cima da cabeça.

Durante 3 semanas assim foi, o tal do deadline ocupava todo o espaço da minha mente, da minha vida, do meu tempo. Felizmente, o famigerado dia chegou, o deadline foi cumprido e lá recuperei a minha vida. Pensei então: aaaaaah! agora é que vai ser aproveitar o tempo e a vida que me foram devolvidos! Nessa mesma noite fui sair, assisti um qualquer espectáculo, jantei fora, bebi uns canecos. No dia a seguir acordei à hora que o meu corpo julgou necessário.

Sábado início de tarde - olho em volta e vejo a casa de pantanas, como já não tinha memória. Deve ser falta de cafeína, vou fazer um café, é isso, não pode estar assim tão mal. Pego na cafeteira que tem uma crosta preta agarrada ao fundo. Ok, toca de a esfregar. O café pinga e eu começo a vislumbrar a dimensão da entropia que se instalou no meu cubiculum vitae: pilhas de jornais espalhados por todo o lado, louça e mais louça por lavar, lixo cheio... Abro o frigorífico e julgo ver um alien lá dentro. Fecho-o horrorizada, mas como preciso do que lá está, resolvo fazer a limpeza necessária. O conteúdo do frigorífico vai na sua grande maioria para o lixo, resolvo atar o saco bem atado, não vá ele ganhar pernas e andar.

Sento-me com o café na mão e olho para o chão: vejo novelos de cotão, migalhas, sapatos por todo o lado, roupa, livros. As minhas probres plantas que olham murchamente para mim. Hummmm... Começo a recolher tudo, a arrumar, a limpar, a lavar...

4 horas depois - a casa está mais ou menos decente, já fiz 3 máquinas de roupa. O tempo colabora, ao menos isso. Agora tenho que ir à compras e adquirir o que me falta, deve haver uma conspiração qualquer, invariavelmente a pasta-de-dentes terminha na mesma altura que o detergente para a louça, assim como o amaciador do cabelo, entre outros. Já para não falar na comida que é inexistente, aprodreceu ou ganhou nova vida. Saio de casa e vou para uma grande superfície. Uau! Programão para um sábado à tarde...

2 horas depois, regresso do hiper. Toca a arrumar tudo. Entretanto, decido tomar banho e descubro que a minha roupa ou está suja, ou por secar ou então - pior! - por passar.

4 horas a passar roupa a ferro. Não existe tarefa mais inglória que esta. Decidi abolir as camisas do meu vestuário.

Faço o jantar e acabo o dia mais exausta que qualquer um dos 21 dias que trabalhei ininterruptamente.

Se a minha vida regressa desta forma, então quero a minha não-vida de volta.

Coisas de óptica

Depois de muito pensar e desejar, há uma semana mudei-me com a família para tentarmos melhor sorte no trabalho, no estudo e na vida. Lisboa ficou para trás e viemos para uma nova cidade, Barcelona. Só tinha estado cá um dia há muitos anos atrás, quando os meus estudantes da altura me convenceram a acompanhá-los a uma viagem de finalistas. Nessa altura tive a sensação de que era uma cidade em que um dia gostaria de viver. Hoje pergunto-me que raio me terá levado a pensar e a convencer-me disso. Por agora, os meus olhos vêm o brilho que Barcelona não tem comparativamente com Lisboa e vêm a falta do encanto que Bogotá e a Colômbia tinham. Por agora, só vejo uma cidade cheia de turistas que pululam sozinhos, aos pares ou aos montes por toda a cidade. Vejo pessoas daqui que fazem as suas vidas, de uma forma mais ruidosa que nós mas menos alegre que na Colômbia, e que hesitam entre a receptividade aos que não são daqui e a desconfiança e certeza de que o multiculturalismo e a emigração estão a ameaçar as suas vidas e a sua tão valorada identidade cultural. E vou-me encontrando com pessoas que me fazem sentir em casa, dispostas a dar uma ajuda, atenção, um sorriso, um desconto no balão comprado no parque ao conterrâneo que já cá está há 13 anos. Em geral, essas pessoas são brasileiras, portuguesas, galegas ou colombianas.
Acho que tenho de mudar a graduação destes óculos para ver se corrijo a miopia...

Remember my name


Vi este senhor pela primeira vez esta noite, mas creio bem será coisa para se repetir amiúde nos próximos tempos. O senhor que era até ontem mais conhecido pelos cidadãos de Ílhavo como o seu presidente da câmara (também responsável pela administração geral, recursos humanos, cultura, saúde, planeamento e ordenamento da cidade) é o porta-voz de Luís Filipe Menezes.

Eu via-o impante a falar e no meio dos substantivos e predicados parecia-me estar perante uma caricatura em vez de uma pessoa. Uma espécie de Santana Lopes mais feio e com defeito na fala. Isto vai ser um pagode para os comediantes com talento em Portugal.

Ribau Esteves de sua graça.

28 setembro 2007

Ainda o portão da escola

- Hoje houve um menino que gozou comigo, mãe. Chateou-me por causa dos meus dentes.
- Para a próxima, diz-lhe que vá chatear o Camões.
- O Camões não, mãe. É um poeta.

27 setembro 2007

Perdidos e achados

entrega-se a quem provar pertencer-lhe

Dúvida sobre o amor moderno

Antes, escreviam-se carta de amor, bilhetes escondidos à espera da surpresa e da alegria de serem descoberto. Hoje, escrevem-se sms, mails, mensagens no msn.
Antes, o amor era tendencialmente eterno. Hoje, o amor tendencialmente só é eterno enquanto dura.
Antes, se o (n)amor(o) acabava, devolviam-se as cartas e os bilhetes, devolvendo ao outro parte de si, da sua dignidade e privacidade. Hoje faz-se o quê? Um mail a fazer fwd dos mails e msn´s e a dizer que a pasta onde eles estavam vai ser apagada, que os sms vão pelo mesmo caminho e que, já a seguir, se vai apagar o próprio mail dos "sent items"?

26 setembro 2007

Insólito ignoto

Fritz* tinha tudo previsto. De noite não estava ninguém no consultório médico, escalaria a parede do prédio e entraria pelo tecto. Arrepanharia o dinheiro e material que encontrasse e sairia sem que ninguém desse por ele. O crime perfeito, que segundo Hitchcock acontece todos os dias.

Como alemão organizado que se preze, apetrechou-se correctamente. Calças e camisola preta, botas de escalada, mochila, cordas, arnês. Foi dura a subida, mas conseguiu atingir o 2º andar do edifício usando a sua destreza e força física, no auge dos seus 41 anos, qual Cary Grant. Preparou-se então para encontrar o melhor sítio para furar o chão e assim passar pelo tecto do consultório almejado, mas estava na sua noite de sorte: havia uma janela. Perfeito, pensou certamente, assim nem tenho de fazer barulho nem sujar nada. Abriu-a e fez-se baixar com elegância com uma corda como Tom Cruise e aterrou na sala debaixo sem fazer ruído.

Em vez dos apetrechos médicos soou um alarme inesperado e em poucos segundos viu-se rodeado de inúmeros polícias.

Havia-se enganado na planta do edifício, em vez do consultório entrou por uma sala de interrogatórios da esquadra de polícia de Ludwigshafen.





Strange but true, for truth is always strange. Stranger than fiction. (Lord Byron)


* nome fictício, assim como todos os detalhes.

Bons encontros

Estava eu deambulando pela blogosfera quanto tive um bom encontro:

"Quem me dera ouvir de alguém uma voz humana, que confessasse não um pecado, mas uma infâmia, que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam."

Álvaro de Campos

E mais nada!

A propósito da posta Augúrios, lá mais abaixo que termina com a espantosa frase "viver mata" e de uma t-shirt que vi ontem a dizer exactamente o mesmo.
Pois é sim senhora! Viver mata, a vida é uma doença crónica. Agora experimentem lá morrer sem estar vivos, não dá, é condição para morrer o estar vivo. Não há cá segundas hipóteses. Pois é, como faço para fugir da morte? mato-me?
Da mesma forma que experimentar viver estando mortos é outra grande chatice, clinicamente possível mas uma complicação com mazelas imprevistas.
Não dá, ponto final. O melhor é mesmo curtir a vida e o resto é conversa.
Desculpem lá, é que tem dias que uma pessoa acorda assim optimista. E além disso, as árveres somos nozes, olha que porra!

24 setembro 2007

Pena de Morte II

Tenho uma pena de morte por ter feito algumas das coisas que fiz.
Morro de pena por não ter feito outras.
Se a pena matasse, eu tinha a pena de morte.

Palavras sabias do Rafael

O Rafael tem uns olhos imensos e uma cara redonda de lua cheia. Dizia-lhe eu que seria a sua professora ao que ele, como quem me revela que com os seus 5 anos não tem tudo por aprender, me diz:
- Sabes, eu sei falar inglês.
- Ai sim? Que bom!
- Queres ver? "Fak iu"!

Olha Rafael, até que te percebo bem...

Pode sempre dar jeito


diz que a maldição hereditária é pior que bicos de papagaio.

Distracção III

Estou deitada a dormir. Acordo de repente, estremunhada, alertada por barulho que vem da cozinha. Vejo as horas e levanto-me num ápice a pensar que raio se passará. Na cozinha dou com a minha mãe em roupão, exibindo o ar mais ensonado e rabujento que alguma vez lhe vi na cara. Mal consegue abrir a boca para trincar a torrada do pequeno almoço e bebe o chá a olhar o infinito.
"mãe..."
"diz filha, já tás acordada?"
"que tás a fazer mãe..?
Olha-me com um ar meio escandalizado mas só consegue levantar uma das sobrancelhas. A outra está a tentar impedir que o olho se feche.
"que tou a fazer? atão tou a tomar o pequeno almoço para ir para o trabalho, que achas que tou eu a fazer?
"são três da manhã mãe...."

Distracção II


Paradas no trânsito, eu e a minha mãe. Depois de um dia de praia. O cansaço impera. Depois de quase uma hora de espera entaladas na fila, já conseguimos ver o cruzamento para entrarmos na estrada principal. Temos que nos enfiar na outra fila de trânsito, esperando que alguma alma caridosa nos deixe entrar, para seguirmos para a esquerda em direcção a casa. Estou à espera que a minha mãe faça exactamente isso, quando já quase a sentir os olhos a fechar de sono, viramos para a direita.
"mãe..."
"diz filha..."
O meu ar é incrédulo. Olho até ao horizonte e a fila de trânsito não termina, desaparece atrás de um monte.
"para onde é que tás a ir..?"
"para onde é que tou a ir? atão, para o fim da fila...."

Distracção I

Paradas no trânsito, eu e a minha mãe. Um carro pára ao nosso lado e uma senhora abre a janela. Ela e o senhor, que pelo ar percebemos imediatamente serem franceses, perguntam à minha mãe, onde fica o hotel Meridien.
A minha mãe gesticula, de braços no ar, apanhada de surpresa, a tentar desesperadamente relembrar o francês do liceu e fala muito sem dizer coisa nenhuma.
"la bas...vous allez..."
E os franceses vão respondendo...
"ah, e depois..?
E eu.
"mãe...."
E a minha mãe continua na sua demanda interminável de quem quer muito ajudar os pobres senhores que estão perdidos no meio de lisboa.
"oui...non, mais oui, la bas, la bas.."
E eu.
"mãe...."
E os franceses.
"pois, ali à direita.."
E eu.
"mãe..."
E a minha mãe finalmente olha para mim com um ar atarefado e impaciente.
"diz filha...."
"eles estão a falar contigo em português mãe..."

poema idiota

Roses are red
Violets are blue
I'm squizofrenic
and so am I

23 setembro 2007

'Cê 'Tá Rindo?!



Impossível não rir com estas 'pérolas' do youtube. :D

Telepatia

Mais um mail inútil. Um site que consegue adivinhar o que estou a pensar. Como é domingo à tarde experimento. Escolho a língua, penso num objecto e tento - aparentemente ganhei ao programa, tinha pensado em courgette e ele não acertou. Pede-me a desforra. Penso no controlo remoto da televisão e vou respondendo às perguntas que me faz. Arrisca:


22 setembro 2007

To be or not to be

Parece que qualquer coisa é boa para fazer troça de José Sócrates. Agora até a Casa Branca se mete com ele escrevendo no seu site "And thank you also for the opportunity to discuss some of our more delicate matters in the international agenda, mainly the question of Kosovo and the Middle West [sic] problem." (visto aqui) e até já disponibilizaram no youtube o vídeo do senhor a cometer a gaffe (visto aqui).

Eu que nem me costumo meter nestas tricas, não posso deixar de me indignar com a Casa Branca e com os nossos conterrâneos que acham hilariante esta tirada. Gostava de saber quantos chefes de governo conseguem improvisar discurso em língua que não a sua e têm a ousadia e a coragem de o fazer em público, mesmo sabendo que não a dominam e a calinada está mesmo ao virar da língua.

Augúrios

Uma doença súbita, um acidente de carro, um suicídio desesperado. Três mortes perto de mim numa só semana.

À porta do cemitério a minha irmã pede-me lume. Uma senhora rezingona relembra os malefícios do tabaco, os perigos para a saúde. Nem tenho força para lhe responder, fá-lo a minha irmã por mim. Viver mata.

Múltiplos livros

Desafiou-nos o jpn para uma corrente de livros. Nós, que até somos raparigas de nos ficarmos nestas coisas, apesar de já nos ter fugido o pézinho para o chinelo da resposta, desta vez damos luta. Vamos responder. Surpreendendo tudo e todos, incluindo nós mesmas.
Tratando-se de um blog colectivo, preparámos um jantar e estivémos até às 3h e picos da manhã a discutir o assunto. Na realidade, qualquer desculpa é boa para estarmos juntas e conversarmos. Livros não nos parece má ideia.

Decidimos, então, distribuir a coisa por categorias, sendo que cada uma teve direito a uma das escolhas. Mantendo a aura de mistério que nos caracteriza, não dizemos quem escolheu o quê, fica à escolha do freguês. No fundo, somos uma só com personalidade múltipla.

LIVROS QUE NOS MARCARAM

- Todos os de 'Os Cinco', Enid Blyton - porque foi com eles que comecei a gostar de ler, com a luz do candeeiro da rua que me entrava pela janela, porque já tinha passado a hora de dormir.

- Conceitos Fundamentais da Matemática, Bento de Jesus Caraça - porque finalmente percebi que a matemática existe e para que serve. Demorei 18 anos da minha vida a perceber isso.

- Anna Karenina, Tolstoi - porque foi escrito para mim.

- 7 anos no Tibete, Heinrich Harrer - veio com os iogurtes danone no ano passado e abriu-me todo um mundo novo desconhecido.

- O Principezinho, Saint-Exupery - porque me ensinou a responsabilidade por aqueles que cativamos. Porque li de tantas maneiras diferentes desde que a minha mãe mo deu na 1ª classe.

- Simposium Terapêutico, de 1996 - nada melhor para uma hipocondríaca como eu [e com uma vocação perdida para a medicina], este livro à cabeceira. Pela primeira razão evocada, mas também pelo efeito hipnótico que tinha, outras vezes pelo figuraço que fazia a discutir princípios activos com o farmacêutico do bairro.

- Todos os do Sam Shepard, pela visão cinematográfica.

[consenso geral com Eça de Queiroz e Garcia Márquez. Tudo o resto deu batatada e acesas discussões]

LIVROS QUE NOS PASSARAM AO LADO

- O Evangelho segundo Jesus Cristo, José Saramago - porque as 5 primeiras páginas me aborreceram de morte e não li mais. Não consegui.

- Todos os livros do clube de 'Os 7' e todos os manuais do curso de direito de Lisboa - pela presunção dos primeiros e pela altura da vida em que tive de ler os segundos.

- Qualquer coisa da Isabel Allende, nem me lembro do nome.

- Nem me lembro, passou-me mesmo ao lado.

- Os Filhos da Meia Noite, Salman Rushdie - porque fui capaz de o largar a 50 páginas do fim.

- Eurico, o Presbítero, Alexandre Herculano - muito melhor que um xanax para adormecer. Tive que o ler mas não retenho nada.

- Todos os de Harry Potter e todos os do Paulo Coelho.

LIVROS QUE NOS CHATEARAM DE MORTE

- Memorial do Convento, José Saramago, ainda mais do que os três volumes da História do Direito, Ruy de Alburquerque.

- Um artigo sobre bioética que tive de traduzir e que era uma chacha tão grande, tão grande...

- Viagens na Minha Terra, Almeida Garrett - de cada vez que começava a ler adormecia.
- Ensaio sobre a Cegueira, José Saramago - porque me obriguei a lê-lo até a fim para perceber porque é que lhe deram o prémio Nobel. Não percebi.

[a esta altura instalou-se uma acalorada discussão sobre as qualidades literárias deste escritor, dividindo-se as opiniões]
- Frei Luís de Sousa, Almeida Garrett.

- Fonética e Fonologia, da Universidade Aberta. Porque tive mesmo de estudar.

- Todos aqueles que deixei a meio, quebrando o meu compromisso de ler qualquer livro do princípio ao fim. Foram alguns e nem me lembro deles.
- Não me consigo lembrar de nada mais angustiante que Eurico, o Presbítero, Alexandre Herculano (saiu repetido, mas nós somos muitas, dá nisto. Além de que o livro é mesmo chato que se farta).

LIVROS QUE NOS FIZERAM SENTIR BURRAS

- Os Passos em Volta, Herberto Hélder.

- O Pêndulo de Foucalt, Umberto Eco, que comprei com o meu dinheiro na feira do livro, e me esforcei meses a fio para ler e não consegui, sempre a tentar a tentar, e a sentir-me burra por não conseguir entrar.

- Quase tudo o que é poesia, tirando Fernando Pessoa, aqueles mais evidentes.

- Livros ‘inteligentes’ sobre história contemporânea.

- O suplemento de economia de qualquer jornal, incluindo todo o Diário Económico e o Jornal de Negócios.

- Finnegans Wake e Ulisses, ambos de James Joyce.

- Qualquer manual de matemática e os manuais de instruções do Ikea.

Agora temos de marcar outro jantar para decidir a quem mandamos seguir a marinha da corrente (ou talvez não).

Last but not least, por causa deste post reavivámos as memórias de infância da nossa insular múltipla, a quem os livros chegavam num barco com nome de parteira new age. As suas palavras transmitem bem o seu (e o nosso) amor pelos livros:

Em sítios onde a oferta de livros era pouca, a chegada do Doulos era um maná de programa - ir à doca, subir a prancha de embarque, sobreviver a tanta gente que lá estava (ainda me lembro do calor e de querer tirar o meu casaco de lã azul escuro com pompons, e não me deixarem porque se podia perder na confusão) e depois aquele fantástico gelado com xarope de morango - e de livros, livros em estantes, livros em caixas, livros em sacos, o espreitar e ver o que havia, cheios de cor, cheios de capas, letras, desenhos, o tocá-los e eles mesmo ali ao lado....

O meu último tributo

Abri o álbum das fotografias. Há-as em que estamos felizes, aquelas em que choramos e outras em que, perante o teu olhar sempre terno e apaixonado, já não consigo esconder que o amor acabou.
O filme da nossa vida passa lentamente... O que fizemos e vivemos juntos - a fome que partilhámos e que te levava à casa de família para angariar umas latas de conservas, os momentos de calma ao pôr do sol na Praia da Areia Branca, as noitadas sem fim no teatro, a constante falta de dinheiro que nos fez solidários mas que provocou também muitas cisões, as borgas cheias de amigos e boa disposição em que eras sempre o maior contador de anedotas, as férias em Sesimbra, no Farol, na Luz, as discussões em que revelavas de forma inesperada a tua faceta obstinada... E o filme pára abruptamente, talvez no momento em que tive de dizer-te que chegara o fim.
Não te tratei bem, como não tratei bem os meus amores quando chegou o fim. Mas lembro-me de te amar. De me comover com todas as personagens às quais tu deste corpo de forma tão sábia e verdadeira. Lembro-me de te incitar, de te picar para te fazeres à vida, para não teres medo. Lembro-me do teu sorriso franco, do teu carinho imenso.
Por tudo isto e muito mais que as palavras não podem traduzir, obrigada, Pedro Alpiarça, por teres feito parte da minha vida.
Descansa em paz...

21 setembro 2007

Serviço ao cliente

"Como se insinuar eroticamente com elegância"?, pergunta um leitor que chegou aqui hoje à tarde.
Se alguém tiver sugestões, faça o favor de as deixar na caixa de comentários.

Saddam mata Mandela!!!

Ou "Como foi possivel um morto bem morto ter matado um vivo bem vivo", a master piece by G. W. Bush, disponível aqui.

20 setembro 2007

Conversa no portão da escola

Saída de mais um dia de aulas. Depois de ouvir as novidades (mãe, hoje tenho de descobrir o que quer dizer a palavra nómada, mãe hoje marquei dois golos) decido-me a contar a novidade ao meu filho de sete anos.
- Sabes quem é que está grávida? A minha amiga Mé.
- Ah é?
- Sim.
- Ela fez sexo com quem?

Trintas e vintes

Caminhar para a idade deve ser isto: ser mulher de trinta e picos que repara em rapazes de vinte e tal.

Requiem pelo Bartis

Não me conformo.
Soube aqui que o meu tasco de eleição fechou.

[E agora onde é que levo o meu irmão quando ele vier a Lisboa?]

Vou ouvir um requiem qualquer e selar o baú das minhas muitas memórias ali construídas. E, sim, também são feitas com o mau feitio da minha amiga Paula e com o sabor e cheiro inconfundíveis das tostas de frango com oregãos. Entre muitas, muitas outras.

O BA está, definitivamente, mais pobre desde 5ª feira passada.

Ora que porra...

19 setembro 2007

Mais uma corrida, mais uma viagem

Se no final deste ano eu não for viver para um sítio ermo, sem vizinhos nem gente que me chateie a mona, então é a prova da minha resiliência à prova de bomba atómica.

Começámos a ter uma infestação de baratas no prédio; quase de certeza que vinha de casa da D. Madalena, mas de qualquer modo já estavam a alastrar por mais duas casas. Como eu, boa alma com lugar cativo à esquerda do senhor (seja lá ele quem for) sou a administradora voluntária deste ano, calhou-me em rifa chamar a empresa para eliminar toda a bicharada, de todas as casas, esgotos, partes comuns, e, já que estávamos nisso, os ratos que me atormentam a existência.


O meu dia começou às 8h50 com o senhor a tocar-me à porta enquanto ainda punha cremes na fronha, sem pequeno almoço. Engulo um café e mãos à obra.

Vamos de casa em casa a exterminar tudo aquilo, e eu procuro como uma louca a chave para levantar as caixas dos esgotos. Como não se encontra em lado nenhum, desato a tocar às portas de todos os prédios, a ver se alguém me pode emprestar a sua, mas claro, ninguém tem, sabe ou está. Cada vizinho a quem peço notícias do paradeiro da mesma tem uma brilhante ideia para eu executar; um que ligue à câmara, outros às chaves do areeiro, melhor ainda aos bombeiros. Que vá à casa de ferragens ao fundo da rua. Eu ia sempre perguntando “e um pé de cabra não tem?”. Estranhamente ninguém tinha, mais valia ser vizinha de ladrões de carros, esses ser-me-iam decerto mais úteis que estas abéculas. Depois de percorridos os contactos sugeridos e em nada terem resultado, decido cravar o jardineiro da câmara para me ajudar a levantar as tampas com uma picareta e uma enxada. Dêem-me uma alavanca e eu levanto o mundo; não estava errada. Eu sabia que tinha uma razão para gostar de cavadores de batatas, este também não me deixou mal: prova superada, contra todos os vaticínios.

A velha do r/c esq da janela só repetia “isso não vai dar, assim não vão conseguir”. A múmia do 2º, “ai que partem um pé”, o do 1º “já lhe disse que chamasse os bombeiros, era uma limpeza”. Eu e o cavador é que lhes mostrámos o que era, Arquimedes rules.


No meio disto, a D. Madalena não abria a porta nem por mais uma, apesar dos murros na porta e toques insistentes. Já pensávamos mandar vir a polícia, sabe-se lá o que o Jorge lhe teria feito, quando ela nos aparece sorridente com um ramo de malmequeres e violetas colhidos durante o seu bucólico passeio pelos jardins da vizinhança. Entretanto, a pespineta dos caniches era a única que não aparecia para que lá fossem a casa. Quando entra finalmente pelo prédio adentro, a rugazinha no canto da boca deixou-me logo o alarme: vem chatice. Começou com o seu tomzinho irritante de voz a dizer que na casa dela só depois das 14h30, que não podia ser, que não queria. Respiro fundo, não há de ser nada. Eles voltam na sexta, logo se vê então.

Venho para casa, sento-me no sofá estafada, depois de ter subido e descido dúzias de vezes as escadas do prédio e andado por todas as ruas do quarteirão à procura de uma abertura para os esgotos, quando recebo telefonema da vizinha do r/c: as baratas estão-se a atirar pela janela da D. Madalena abaixo, uma espécie de 11/9 da entomologia. Preferem arriscar a morte por esmagamento que a tortura do veneno. "e agora o que é que eu faço?", pergunta-me. Deixe-as cair. O que é que ela queria que eu respondesse?

Acendo um cigarro e o computador. De repente, começo a sentir a língua encortiçar e os braços dormentes. Ai que estou envenenada, ai minha mãezinha o que é eu faço. Ligo ao homem da desinfestação, explico os sintomas e pergunto-lhe se devo chamar uma ambulância.

"Minha senhora, deve ser fraqueza. Esteve o dia todo a correr de um lado para outro só com um café, que tomou À minha frente. Apanhe um bocado de ar e coma, vai ver que se sente melhor".

Era verdade. Fiquei comovida. Quero ir viver para um prédio onde tenha por vizinhos o jardineiro e o homem da desinfestação.

(continua, como sempre)

V-Day

"O cómico italiano Beppe Grilo surpreendeu tudo e todos, quando conseguiu recolher num único dia quase cem mil assinaturas, exigindo a criação de um "Parlamento Decente"", "purging Italy of its corrupt political class, which in Grillo's view includes political parties, most government institutions and the media. "

O que é verdadeiramente desconcertante é que os "principais partidos políticos italianos - tanto de direita, como de esquerda - passaram, de facto, a ter razões para estarem preocupados com Beppe Grillo, que tem vindo a organizar com grande sucesso o "V-Day" (de "Vaffacullo Day")".
"The idea of V-day was to give a voice to those who don't have a voice," said Grillo, who has denied plans to start his own political party. "

Diz que isto de vaffacullo quer dizer : "vai levar no c*"....

Sim, porquê??

"Porque é que os maços de tabaco não dizem isto?
“Fumar reduz a permanência em lar de 3a idade”
“Fumar elimina a necessidade de fazer um PPR”
“Fumar reduz a preocupação com a reforma aos 65″"

Aqui.

Pena de morte

Aqui, ficamos a saber que "Os ministros da Justiça da União Europeia (UE), reunidos hoje em Bruxelas, sob presidência portuguesa, foram incapazes de chegar a um consenso sobre a instituição de um Dia Europeu contra a pena de morte, inviabilizado pela Polónia".
Aqui, ficamos a saber que a Polónia (...) "recentemente fez saber que se opunha à iniciativa - alegando que a UE deve abrir antes um debate mais amplo sobre o direito à vida, que incluiria o aborto e a eutanásia -," tendo-se mostrado "hoje intransigente, inviabilizando assim a instituição de um Dia Europeu."
Pois é...

18 setembro 2007

Os crocs

Em todo o lado os vejo, de todas as cores, em pessoas pequenas e grandes e novas e velhas. Hoje descobri aqui uma notícia que espantou: nos últimos tempos têm surgido notícias que associam os crocs a riscos para a saúde. Há quem fale dos perigos da electricidade estática (um hospital sueco proibiu o uso de crocs devido à avaria de equipamento médico quando utilizado por quem os calça) ou do fraco apoio que dão aos pés para quem passa muitas horas em pé. Há mesmo um blogue que denuncia os acidentes que algumas crianças tiveram devido aos crocs.
No últimos doze meses, venderam-se mais de 20 milhões de crocs. Existirão 20 milhões de pessoas assustadas com estas notícias?

17 setembro 2007

Se eu falhar


foto aqui, daqui.

... não me deixes só.

Conversa numa porta qualquer

Lá fora vozes de pessoas que dormem na rua. Passei por eles há pouco, sentados com uma garrafa de vinho numa porta qualquer, o intervalo de quem passa o dia a arrumar carros (mais para a esquerda, torça, está bom) e descansa com garrafas vazias e conversas desarrumadas. Eu sou feito de água e qualquer dia rebento, disse enquanto entornava o resto do vinho. É por isso que bebo isto, para não rebentar.

Terrorismo

"Novo vídeo da Al-Qaida apela para «extermínio colectivo» no Ocidente
2007-09-17, 11h16
Dubai, 17 Set (Lusa) - Um "site" islâmico radical divulgou hoje um vídeo atribuído à Al-Qaida que apela para acções de "extermínio colectivo" destinadas a aterrorizar o Ocidente.
"É preciso elevar o terrorismo islâmico nos países do Ocidente e transformá-lo num fenómeno semelhante ao das catástrofes naturais", afirma uma voz, anónima, no vídeo divulgado no 'site' ekhlaas, que anunciava desde 12 de Setembro a divulgação de mais um vídeo - o terceiro - a propósito do sexto aniversário dos atentados de 11 de Setembro nos Estados Unidos.
"Assim, devem perpetrar-se actos de extermínio colectivo (no Ocidente), para que as pessoas sintam que o seu bem-estar também lhes traz a morte (...) e para criar, dessa forma, um equilíbrio dissuasor entre nós e eles", prossegue.
Intitulado "A conquista de Nova Iorque e de Washington: razões e motivações", o vídeo termina com a assinatura "Al-Tanzim", nome supostamente derivado do nome da organização terrorista em árabe: "Tanzim al-Qaida".
O vídeo apresenta uma "colagem" de imagens das torres gémeas do World Trade center em chamas, após os atentados, e de campos de treino.
Além da mensagem referida, o vídeo incluiu excertos de anteriores mensagens do líder da rede, Usama bin Laden, e do seu "número dois", o médico egípcio Ayman al-Zawahiri.
MDR.
Fonte: Agência LUSA"

Lamento

Se a minha vida não me tivesse desaparecido, iria a todos os jantares. Prometo que quando a recuperar me lembro do prazer de estar. Só estar. É que agora, neste instante, eu só quero não estar.

Palavras sábias da Enilda

Pôr limites aos filhos/as é pôr limites a nós próprias/os

16 setembro 2007

Quem dá mais?

Quem dá mais?

Consulta no centro de saúde

- Sr. doutor venho cá porque apareceram ao meu filho uns altos muito estranhos e que lhe doem imenso, especialmente quando apertados.

- Vamos já ver isso. Onde é que eles estão?

- Ó Sr. Dr, mesmo abaixo da pilinha, uma coisa estranhíssima.; eu já lá toquei e toda a gente lá de casa também, e dói-lhe mesmo muito, veja lá isso que estou mesmo preocupada com o rapaz.

(o médico começa a coçar a cabeça, manda a criança despir-se. Pede-lhe que lhe mostre o sítio exacto)

- É aqui doutor, dói muito quando aperto.

(o médico passa-se)

- Minha senhora, nunca viu o seu marido nu? Ele também tem dois iguais a estes, um pouco maiores suponho.

(juro que não inventei)

14 setembro 2007

Palavras sábias da Dona Capitolina

A manha de Portugal é comer bem e dizer mal.

13 setembro 2007

do lado de fora da porta

Ela estava à porta sem coragem para bater. Não sabia há quanto tempo ali estava, cinco minutos ou cinco horas. De vez em quando ouvia um barulho do lado de lá, água a sair de uma torneira, passos, o som de objectos pousados, vagas vozes incompreensíveis. Bateu. Ouviu os passos que chegavam, tocavam na fechadura, a madeira quase a ranger, a certeza de que o sorriso que a receberia não tinha ainda reparado que ela não estava lá dentro mas sim sozinha calada quieta do lado de fora da porta.

Agradeço, bato ou atiro-me da janela?

Chego a casa no fim do dia e a minha filha, de dois anos, pergunta:
- "Quem és tu?"
- "Quem és tu?!?!"
- "Ah, és tu! Não parecias tu... tás gira."

12 setembro 2007

Quem nunca se viu assim, levante a mão

Não suportavas que te tocassem. Para que me amasses, cortei os braços. Mas depois chegou um homem com braços musculados. A tua fobia desapareceu. Gostaste dele. Eu era apenas um amputado que tu conhecias.
Aqui.

Zimbro, o lobo


15:30. O odor intenso dos pinheiros invade-me as narinas e sabe-me bem. No meio da área florestal montanhosa, no interior da Malveira estendem-se cercados em rede de aço até perder de vista e em todas as direcções.

No interior destes cercados, os terrenos que prefazem quase 20 hectares acolhem Lobos de toda a península Ibérica, animais resgatados , por denúncia das autoridades e amiúde por um ou outro civil com alma. Foram lobos que mataram vezes sem conta as ovelhas dos pastores, uma vez que desapareceram as espécies que lhes serviam naturalmente de alimento, como o javali ou o veado. Foram lobos que, por terem fome, foram mortos pelos pastores que não são indemnizados a tempo e horas pelo Estado pelas baixas sofridas nos rebanhos.

Mas o lobo caça com respeito, mata com respeito, da mesma forma que a história nos conta, matavam os índios e os esquimós, com respeito e deferência para com a peça caçada.

O homem que se diz “civilizado” não. O pastor analfabeto e mal formado não. Mata com a revolta e a raiva no corpo, com a maldade e a estupidez natural a descoberto, a prepotência e o excesso de ego a atrofiarem os seus sentidos, a obrigatoriedade de se ser humilde e de sentir em pé de igualdade com todos os outros seres vivos.

Minho é um dos lobitos trazido ainda pequeno para este centro de recuperação do lobo ibérico, único em toda a península. A mãe deste animal morta numa armadilha e o seu filho roubado para ficar preso a uma casota de cão a ser apedrejado diariamente por adultos e crianças que por ali passavam até que a situação ser denunciada e os voluntários do centro o poderem ir buscar. Hoje em dia, Minho, já recuperado das mazelas, é um lobo que não pode nunca vir a ser socializado. Não quer nada com humanos e no dia em que for libertado no cercado que lhe está destinado com cerca de 11 hectares, vai desaparecer para não mais ser visto.

É o que acontece neste centro. Quem está à espera de o visitar esperando ver ali os lobos à sua espera, como se num jardim zoológico estivesse, sai desiludido com a visita. O respeito pela privacidade e pela tranquilidade dos rituais de vida deste animal é seguido à risca por estas pessoas que dão o seu coração para a recuperação destes magníficos animais, o que faz com que seja muito díficil e uma questão de sorte conseguir avistá-los no meio da folhagem.

Para além do Minho, outro caso grave neste centro foi a denúncia de um lobo que foi resgatado pelos voluntários duma situação de extrema malícia e ignorância. Este animal, depois de apanhado pelos pastores numa das armadilhas, perdendo uma das patas, foi entretanto amarrado por uma corda a um carro e puxado a alta velocidade pela terra fora para gáudio dos habitantes da aldeia. Ainda com vida e neste momento em recuperação na unidade hospitalar do centro, é mais um caso de um animal que nunca mais poderá ser socializado. A maior parte dos lobos aqui presentes nestas soberbas instalações , são animais que por uma razão ou outra são já incapazes de sobreviverem sozinhos no no seu habitat natural.
Numa sociedade de hierarquia vincada, o lobo pode ou não desafiar o macho alfa de determinada alcateia. Se o fizer e vencer, passa obviamente a ocupar o seu lugar sendo que o seu antecessor abandonará a alcateia. Se escolher não o fazer, então será ele que a abandonará. Foi o caso de Zimbro, o único lobo que consegui ver de perto num dos cercados e fotografei. Os lobos não conseguem sobreviver sozinhos e são normalmente estes exemplares que atacam as quintas e os rebanhos sendo que mesmo esta alternativa de conseguir alimento mais facilmente se está a tornar cada vez mais infrutífera graças à concorrência das matilhas de cães, tornados selvagens por abandono dos seus donos e que cada vez mais ocupam também eles o espaço natural do lobo.

A majestosidade, a imponência, a dignidade no olhar de Zimbro fazem-me quebrar e cair do cimo do meu pedestal humano e prometer não o esquecer.

Mamas: toda a verdade

- Estás com um olho negro! O teu marido bateu-te?
- Não, estive a saltar à corda sem soutien

Maude, série americana dos anos 80

Há coisas que os homens nunca poderão entender. Bom, algumas mulheres também não, mas isso é outra história. A questão é que alguns tipos de desporto são desagradáveis quando se tem um peito avantajado, o peso, volume e a força da gravidade não ajudam aos pulos, corridas e saltos.

Joanna Scurr, uma investigadora da Universidade de Portsmouth, dedicou-se a estudar o tema de um ponto de vista científico. Mediu a amplitude do balançar das mamas durante a prática desportiva; não sabemos o tamanho das copas nem a modalidade em causa, mas não podemos de deixar de ficar abismadas com as suas conclusões: "as mamas modernas podem balançar uns assustadores 21 centímetros aquando a prática de desporto. Ou seja, mais do que as antigas, que não ultrapassavam uns moderados 16 centímetros, segundo pesquisas anteriores."

Será que a mulher moderna tem mamas maiores que a antiga? Ou será uma questão de aumento de flexibilidade? Ou o efeito de estufa influenciou os clássicos 9.8 m/s2?

Também me intrigam as partes práticas do estudo: como terão feito as medições? Imagino um senhor de bata branca e régua na mão a correr ou a saltar ao lado do objecto em estudo, presumivelmente em topless.

Questões perturbantes, sem dúvida.

Gostava de ter posto o vídeo do final do Meaning of life, com um homem a ser perseguido por uma horda de mulheres em topless e capacetes, mas não o encontro. Se alguém fizer o obséquio de arranjar o link ficava a coisa mais compreensível.
Eu não sei como é que se chegaram aos números que suportam estas decisões. Apesar de tudo, quero crer que alguém, algures, ainda quer o bem do país e, de boa fé, presumo que as decisões sejam tão próximas quanto possível das que são precisas, mas fico sempre com a sensação de que se está a esvaziar o resto do país de bens essenciais como a saúde, a educação e serviços. Li no outro dia que, algures, uma criança chorava por ter perdido a escola da sua aldeia. Fiquei triste por ela....
A ideia de um país moderno, alfabetizado, desenvolvido, onde cada um tenha o seu lugar e seja feliz a fazer o que faz, é uma ideia que me persegue há anos e tento dar a minha quota parte para que se realize. O que nunca percebi é porque é que existe a ideia generalizada que, para isso, só há uns quantos - poucos - trabalhos dignos e que todos os outros resultam de falta absoluta de informação/formação e são quase degradantes da condição de homem moderno. Será que os meninos pastores, por também serem pastores, não podem ser felizes e não podem tomar a decisão de quererem continuar a ser pastores quando crescerem? Ou isso só é legítimo e de aplaudir para os urbano-desiludidos?

11 setembro 2007

Under pressure*

Como é adequada esta música ao meu momento... Not complaining!

*The Queen e David Bowie (1982)

Palavras sábias do meu irmão

Cada dia é um comboio que parte.

Conversa de balcão

- Ó senhor jacinto, sabe dizer-me quanto tempo demoro a chegar de carro a Benavente?
- Isso depende do pezinho da menina.

09 setembro 2007

Passeio náufrago

Incomodam-nos

Uma iniciativa do après midi d'un faune, a que se associaram os blogues câmara clara, respirar o mesmo ar, saisdeprata-e-pixels, sem-se-ver e nosotras.


O desafio era encontrar uma imagem que nos incomodasse, que nos trouxesse sentimentos desagradáveis fosse por que motivo fosse. As múltiplas pensaram, pensaram, reflectiram, discutiram, e chegaram a um consenso.




RATAZANAS!!! Incomodam-nos imenso, não apenas cruzarmo-nos com elas mas pensar na sua mera existência. É obvio que os seus congéneres alados, por inúmeras razões, estão no topo da nossa lista de imagens a abater.




Também nos incomodam muitas outras coisas, por exemplo, a maldade, a estupidez. Estes dois 'incómodos' são mais difíceis de fixar em imagens.

08 setembro 2007

Quem à janela

De cada vez que alguém morre num filme, numa canção, numa notícia, és tu que morres. Quando choro, e ainda acontece sempre, és tu. Agora que é a primeira vez que oiço aquele fado do Camané depois de o termos ouvido todos na Estrela e de ter tentado sem sucesso ouvi-lo sozinha, penso se algum dia terei esta saudade sem desesperar nela. Toda a gente prometeu que ia ser mais fácil e nada. Não é mais fácil. Nada na ideia da tua ausência é mais fácil. Tu morreste. E de cada vez que me lembro disto só piora.

07 setembro 2007

06 setembro 2007

Nessun Dorma


É impossível ficar indiferente a esta notícia. Hoje calou-se uma das vozes mais poderosas do bel-canto. Luciano Pavarotti popularizou um género musical considerado elitista e espalhou a sua voz pelos quatro cantos do mundo, cantando com tantos outros cantores, aproximando gerações e estilos musicais.

Em baixo, a sua interpretação da área Nessun Dorma (Turandot, Puccini).


Gäldenär, det kommer alltid tillbaka*

Este post é dedicado ao nosso leitor sueco, que nos tem sido diariamente fiel. Graças a ele/a descobri várias coisas interessantes sobre a Suécia: é o terceiro país com mais nóbeis da literatura, a última guerra em que se meteram foi a Campanha contra a Noruega em 1814, é o país da OCDE em que mais se registam faltas ao trabalho por licenças médicas (1/5 da população), os finlandeses são a maior das minorias e não têm língua oficial.

Gostava de pensar que é o pai natal, a controlar-nos da Lapónia, para nos mandar grandes presentes em Dezembro (se és tu, não te assustes com os pombos nem te acanhes com o exaustor, atira pela janela que eu não me importo). Ou então o cozinheiro dos marretas, a verificar que a minha relação com a gastronomia é semelhante à sua com a linguística. Desde que não seja o Bengt Ekerot à nossa espera lá do outro lado, está tudo bem.


* pedimos desculpa pelos erros na tradução, imputáveis à única página online disponível para a conversão português/sueco que encontrámos

Fatalidade faducha sobre o destino da Nação

"Pátria
Até onde estamos dispostos a ir como Nação em relação a esta tendência de calçar chinelos em todo o lado? " In Voz do Deserto


Se a Nação só quer mesmo ir à praia ou andar por casa, é trágico. Se a Nação crê mesmo que pode ir a mais algum lado de chinelas, mais trágico é.

05 setembro 2007

analogias de feira



Descobri que a vida não é muito diferente dos carros de choque. Às vezes não tenho ficha e fico só a olhar os carros que passam, os gritos e sustos e caras dos que vão lá dentro, a invejar secretamente a velocidade e o medo e o riso, quase feliz na segurança de quem está só a ver só a olhar só a assistir, de quem sabe que não vai acelerar não vai bater não se vai magoar. Outras vezes, dou por mim lá dentro, o medo nas mãos e nos olhos e no sorriso com que disfarço o precipício de estar ali, a incerteza do que poderá acontecer na próxima curva que acabou de chegar.

04 setembro 2007

Despertares

Acordo e deixo-me ficar esparramada na cama, com o lençol para trás e com a pouca roupa com que durmo. Ainda estou a decidir se me apetece estar hoje no mundo quando me batem à porta, quase levemente, sem usar a campaínha. Ignoro, insistem. Lembro-me que sou administradora do condominio, pode ser alguma coisa importante, vou ver quem é. Espreito e vejo duas raparigas orientais, que não são minhas vizinhas. Arrisco perguntar quem é. "Abra a porta". Perante tal quase ordem hesito, quererão vender-me máquinas de costura a 5€ ou três camisolas por 10€? Quem é? Queremos falar consigo. Irritam-me pessoas que me batem à porta e querem falar comigo, digo-lhes que não estou vestida mas isso parece acender-lhes uma qualquer gana lá dentro "Somos coreanas. Acredita em Deus?"

Coreanas missionárias, não me faltava mais nada. Repito, não estou arranjada e não o vou fazer para falar de Deus convosco, bom dia. Não sei o que lhes terá provocado a ira, se a falta de roupa ou o ateísmo, mas desataram-me às batidelas à porta como umas loucas. Se fosse há uns meses atrás ter-me-iam causado uma apoplexia.

03 setembro 2007

Just like a rolling stone

Cate Blanchett, Heath Ledger, Christian Bale, Richard Gere, Ben Whishah e Marcus Carl Franklin. O que têm em comum estes seis actores norte-americanos? Somente o mais recente filme do realizador Todd Haynes, onde se juntam para interpretarem seis fases distintas da vida do lendário cantor e compositor Bob Dylan.
"I'm not there", foi o título escolhido, uma referência a um tema que faria parte do album, "The basement tapes (sessions)" mas que acabou por ficar de fora das gravações de estúdio podendo ser apenas encontrado agora nas versões bootleg.
A saída do filme está prevista para Novembro deste ano e o trailer já está disponível. Ainda por definir se "I'm not there", vem acrescentar algo de novo a uma biografia já usada e abusada do ícone Dylan, este novo trabalho de Haynes parece ir mais de encontro a uma representação artística e despretensiosa de pequenos momentos cruciais, na vida do herói que ofereceu, sobretudo, as palavras necessárias a uma geração envolvida seriamente na revolução das mentalidades.
Um trailer que revela uma fotografia de intenção quase documental que permite que nos envolvamos sem dificuldade e a caracterização exímia dos actores, principalmente da assombrosa e versátil Cate Blanchett, são os primeiros doces a sair do saco. O resto também parece prometer.

O nosso preço humano em euros

Um site, pelos vistos a fazer furor na Europa e nos Estados Unidos, onde através de um inquérito, é possível calcularem o nosso preço. Os critérios de avaliação escolhidos não têm, por exemplo a ver com o nosso grau de frescura ou prazo de validade como acontece num mercado mas de qualquer maneira, fiquei a saber que se não me ponho a pau, qualquer dia faço parte do caixote dos legumes que vão alimentar as pocilgas pelo país fora, em Português vulgar, "Daqui a nada tou a ir com os porcos."
Assim, fiquei a saber que valeria muito mais em euros se fosse, loira, de olhos verdes, alta, magra, atlética, homem alto, ganhasse um grande ordenadão, não fumasse e tivesse menos de 30 anos.
Fiquei também a saber que muitas pessoas se entregaram a este hobby de corpo e alma e que a todo o custo tentam melhorar certas facetas da sua vida para poderem concorrer com melhores valores monetários contra amigos e colegas de trabalho. Só não faço ainda ideia é se já andam todos com a sua etiqueta de preço ao pescoço. Se assim for, como é que será nos meses de saldo?

Apanharam-Nos

Que as oitoecoisa são muito boas já tínhamos assumido. Agora vem a revelação bombástica do século: meninas, somos umas deusas. E nem sequer é uma auto-proclamação, há uma entidade que faz publicidade no gmail que nos trata assim: "Preparamos-Te para trabalhar em creches e infantários".


(pronto, já arranjei a imagem)

viva a vida alegre e divertida

e quando tudo se compõe num crescendo de pequenas e grandes dificuldades (a máquina que avariou, a cabeça que voa supersónica sem conseguir aterrar) descubro mais uma alegria: uma multa de € 60 por ter circulado a 57 km/hora (cinquenta e sete cinquenta e sete) no túnel do marquês.
bem vinda à vida, alegre e divertida.

De volta ao trabalho

E assim acabaram as maratonas diárias do acorda, dá um biberon, tira a fralda e põe no bacio, dá biberon à outra, veste um fato de banho e põe protector, muda mais uma fralda, volta a pôr no bacio, muda uma t-shirt bolsada, arruma o saco da praia, acaba de vestir uma e dá colo à outra porque os décibeis são demasiado altos, põe o Zig Zag na RTP 2, toma café, faz sandwiches, põe a arrotar mais uma vez, lava dentes de leite, faz a cama, arruma as roupas espalhadas pelo quarto, ferve biberons, lembra da garrafa de água fresca, faz outra cama, come um bocado de pão, dá umas bolachas do Noddy, faz ainda outra cama, tenta ir à casa de banho sem interrupções, explica que o Mundo de Todd não passa na TV quando se quer, lava dentes definitivos, tenta arranjar-se com alguém ao colo, pensa se falta alguma coisa no saco, tenta acalmar a fera antes de sair, diz que não pode ter duas ao colo, põe gel nas gengivas a rasgar, tira roupa com chichi, põe no bacio e fica à espera para ver se sai cocó, embala e consola, veste outra vez, esquece de pentear, dá água, desiste de calar a mais nova e deixa-a a berrar, acarta tudo para o carro e finalmente fuma descansadamente um cigarro naquele breve intervalo até chegar à praia....
Ai, como é bom o meu cubículo no sótão do edifício onde trabalho, mais a minha mini-janela virada para uma empena cega, mais a luz fluroscente de casa de banho e as toneladas de papel em cima da mesa. As férias começaram!!!

oferece-se

dois braços funcionais, duas pernas capazes, uma cabeça que já viu melhores dias mas que cumpre os mínimos,
versátil no desempenho de tarefas (desde que afastada de uma tábua de engomar ou do atendimento ao público)
para trabalhos diversos
aceitam-se propostas

Andor de surf

procissão de nossa senhora da praia, hoje à tarde.

02 setembro 2007

Cenas da vida conjugal (iv)

[mais um jogo de futebol, deixa lá ser simpática desta vez]
- Querido, o que é que estás a ver na televisão?
- Estou a ver se o Belenenses ganha ao Sporting...
[Grrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr! não há condições para ser simpática. Vivo com um benfiquista. É um karma, é uma sina, é uma maldição que carrego!]

Lições do abismo*


Por vezes é preciso tê-las, de modo a não esquecer a atracção pelo vazio, à espreita, lá em baixo.

[* de uma frase de Jules Verne 'parfois il faut prendre des lessons d'abîme'.]

01 setembro 2007

O defeito

A Júlia inventou o Artur. O Artur é o homem perfeito, ela já lhe fez a história de vida antes e depois de a conhecer. É divorciado, tem três filhos, é arquitecto. Os filhos são amorosos e dão-se muito bem com ela. O Artur tem imensas qualidades - é generoso, companheiro, amigo, bom ouvinte, bom pai, sensível, diz a coisa certa na altura certa, tem um sentido de humor genial, adora rir, sabe quando deve calar-se, gosta de coisas bonitas, é um amante dedicado e criativo e doce e gentil, adora andar descalço na praia. O Artur dá os melhores abraços do mundo. O Artur não gosta de futebol. O Artur é um excelente cozinheiro. Ele respeita quando ela gosta de estar sozinha. O Artur tem uma voz...

Só há um pequeno problema: não conseguiu decidir quais são os defeitos dele. Ainda não chegou a um consenso sobre quais os defeitos com os quais ela conseguiria viver feliz para sempre.

Olha que coisa mais linda!


Está uma rapariga muito descansada no areal da praia, quando começa a reparar num alvoroço crescente entre os veraneantes: levantam-se, apontam com o dedo, tapam o sol que lhes bate no rosto com a mão e põe-se tudo a olhar para cima. Faço o mesmo e eis senão quando o vejo a espalhar charme e graça em pleno céu quase-de-Lisboa.
Aaaaaaaaaaah, a beleza existe!