30 outubro 2008

Silêncio

Naquele dia eles não esperavam o blá-blá-blá acerca das leis da vida e do conceito de ser vivo.
Naquele dia, os mesmos alunos que me tinham apoiado em provas físicas nas quais lhes revelei as minhas fraquezas, esperavam que eu não lhes ocultasse a verdade que tinha ganho ecos aterrorizadores para a dezena de primaveras que contam. Lia-o nos seus olhos, o pedido para que não os defraudasse.
Assim fiz. Entrei com eles na aula e comuniquei-lhes com as devidas cautelas mas com a exigida verdade que havíamos perdido um colega, um amigo, um aluno numa qualquer auto-estrada.
E depois ficámos num silêncio grande. E dele havemos de nos lembrar para o resto das nossas vidas.

Em perfeita segurança

- Boa noite. Tenho o prazer de estar a falar com a D. Oitoecoisa?

Normalmente impelida a responder que não me encontro em casa, não o fiz destas duas vezes.

- Sim...
- D. Oitoecoisa, o Círculo de Leitores tem o prazer de oferecer um novo produto aos seus sócios. Vou passar a chamada ao colega que lho vai apresentar. Para sua segurança, a conversa vai ser gravada. Posso?

Isto dito "à toute vitesse". E a história da minha segurança deixa-me sempre desconfiada. Foi então que a esperança que me propusessem mais uma enciclopédia do José Mattoso em 68 volumes se dissipou.

- Não, não pode. Não sem antes me dizer que tipo de produto é o que me quer propor.
- É da área de seguros.

Como? Terei ouvido bem? Curioso! Há mais de um ano que não faço uma única encomenda no Círculo de Leitores mas isso não parece incomodá-los.

Dois dias depois, foi a vez da Fotosport das Amoreiras, onde (curiosamente) não revelo uma única fotografia há anos.
Também eles tinham um seguro de saúde (saúde-fotografias-seguro-películas, tudo em perfeita dialéctica) para me propor em parceria com a AIG. (Ei! E não é que o nome até parece o daquela companhia de seguros que esteve à beira da falência? Ah!, mas essa é a americana porque a portuga está de boa saúde e a Fotosport recomenda-a)

Por este andar, um destes dias entro no meu restaurantezeco de bairro e o meu caríssimo sr. Lázaro vai oferecer-me um segurozito para o caso daqueles ossitos do frango se me entalarem no garganete. E é melhor subscrevê-lo antes de degustar a avesita...

Será que isto é o mercado à rasca ou é mesmo zelo pela saúde do patego?

29 outubro 2008

27 outubro 2008

dois em dois ou mais

um a um

do atlântico

plimplom senhores passageiros com destino à graciosa, vamos começar o embarque e pedimos mais uma vez desculpa pelo atraso
trrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr olha a hélice está a funcionar, menos mal
zzzzzzzzzzzzztrrrrrrrrrrrrrrrr que barulho é este, será que vai cair?
tchrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr clap clap clap senhores passageiros, bem vindos à graciosa
tchtzzzpch boa noite, tenho uma reserva em nome de oitoecoisa
clic tchhh ufffff finalmente no quarto
muuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu olha tenho uma vaca debaixo da janela

Escala

Parada no meio do atlântico, em trânsito entre ilhas açorianas. Na última hora e meia, uma voz metálica vem explicar que por motivos de ordem técnica o voo para a graciosa está atrasado. A voz regressou agora e avisou que daqui a quarenta e cinco minutos teremos mais informações. O cotonete com asas em que viajo está parado na pista, com a hélice esventrada e dois senhores de colete amarelo à sua volta. Não sei se hei-de ficar aterrorizada ou resignada à minha sorte. Pelo sim pelo não, vou ali fumar um cigarro e fazer contas à vida.

26 outubro 2008

Minossauro

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Auto Retrato

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Simple twist of fate

Andava eu a deambular por essa blogoesfera fora quando, de repente, reparei que ela voltou. Voltou há mais de um mês com tudo o que a caracteriza e que faz com seja o meu blogue de eleição.

Admirada, reparei que tinha postado uma imagem que acabei de conhecer hoje - há menos de 24 horas - e que não me cansei de elogiar. Vou-lha roubar e o resto logo se vê.


esta imagem e outras aqui


23 outubro 2008

Todos os dias ao jantar

Segura o garfo mais atrás, a comida sobe à boca não é a boca que desce ao prato, endireita-te, baixa os cotovelos, segura o garfo mais atrás, não se fala de boca cheia, fecha os talheres quando acabas de comer, ele olha para mim e suspira de enfado, sem dar por nada passaram nãoseiquantosanos e sou agora a minha mãe, segura o garfo mais atrás, quantas vezes tenho de dizer isto?, entre conversas e risos sou a chata de serviço que repete uma e outra vez as frases que me perseguiram há nãoseiquantos e me obrigaram a fechar a boca a endireitar-me a subir o garfo à boca e a ser a pessoa crescida que ainda não tenho a certeza de ser.

22 outubro 2008

Onde assino?


É uma das frases de Chandler mais citadas:
"Chess is as elaborate a waste of human intelligence as you can find outside an advertising agency."

Por experiência pessoal, de jogador de xadrez e animal de agência, posso confirmar a exactidão do apontamento. Todavia, tivéssemos o Raymond connosco e já teria adaptado a boquinha à blogosfera. Porque aqui o desperdício de inteligência é ainda mais torrencial, incomensurável e necessariamente catastrófico. Mas o caos é apenas um estado de organização; e particularmente fértil, como se deixou escrito faz tempo. Talvez desta reunião de intelectos e vontades nasça finalmente um movimento cuja ausência está a deixar os sociólogos impacientes: um partido político com inspiradores, dirigentes e base de apoio provenientes inicialmente das redes sociais da Internet.

Daí, estas ideias quentes e boas para a renovação da classe política:

Partido sem ideologia – Estado de permanente abertura à inteligência, sem qualquer pressuposto teórico, histórico ou axiológico. As propostas dos partidos concorrentes seriam copiadas à má-fila, no todo ou na parte, à esquerda e à direita, caso tivessem os mínimos, idealmente os máximos, de proveito.

Partido com maioria de mulheres – Adequação metodológica, nos instrumentos de decisão, à psicologia feminina; esta muito mais colaborativa, horizontal. Sendo o primeiro partido preparado para o feminino, teria crescimento fulminante nesse grupo demográfico. As mulheres são mais capazes do que os homens quando se trata de gerir, proteger, reforçar.

Partido da ontologia extremista – Culto do tempo vivido e por viver, da profundidade e da amplitude, da sabedoria e da brincadeira. O programa político teria como única meta levar os nossos velhos a passar tempo com as nossas crianças. Fosse nas famílias, escolas ou ruas. Todos os dias celebrando juntos o espanto de ser.

Partido que estaria sempre na oposição à estupidez – Fazer oposição ao Governo só porque não se faz parte do Governo é uma das mais espectaculares exibições de estupidez. Quem não está no Governo deveria honrar o seu compromisso patriótico ajudando quem governa, sugerindo melhores alternativas, aplaudindo a boa obra. Este partido, mesmo que fosse Governo, ou especialmente se o fosse, continuaria a ser o maior partido desta oposição por inventar.

Partido com castigos atrozes para os cínicos – Os cínicos são a pior espécie de imbecis, devendo ser perseguidos, sovados e sumariamente expulsos desta organização. À porta dos locais onde se reunissem elementos do partido, haveria aparelhos detectores de cinismo, os quais fariam muito barulho e acenderiam luzes no caso de apanharem algum rasto de cinismo escondido nos neurónios dos participantes.

Partido cuja liderança fosse alcançada através de provas de pentatlo cívico – Os candidatos seriam aconselhados a irem para o congresso com fato de treino e sapatilhas confortáveis. Provariam o seu valor em cinco provas:
- Discurso de improviso.
- Danças de salão.
- Venda de atoalhados aos congressistas.
- Explicação da Teoria da Relatividade e definição do Bóson de Higgs.
- Confecção de sopa de legumes.
A escolha seria por aclamação. Eventuais casos de empate seriam resolvidos por sucessivas provas de confecção de sopa de legumes, sempre diferentes. Em caso de urgência, moeda ao ar.
Sim, podes inscrever-te já."
O que seria de nós se um partido com estes traços de cor pudesse existir?

21 outubro 2008

Uma volta no parque

Uma hora na blogosfera e descubro que afinal não sou diferente das pessoas que páram na estrada para ver melhor o acidente que acabou de acontecer. Aterro num blogue e descubro que está em guerra. O drama divide-se entre postas e caixas de comentários. Alguém que não concorda com outro alguém e, de repente, o caos: dezenas de comentários inflamados, quase insultos, declarações de independência. Afinal não é um blogue, são dois. O que eu gosto de um bom dramalhão.

Comigo irmãos



(Do espectáculo Se piorar estraga, interpretado por Cris Nicolotti)

Ou a receita para retomar as rédeas da vida na minha mão. Afinal é simples.

18 outubro 2008

A preguiça dos dias de chuva

Acordei com o granizo a bater na minha janela e o cão do vizinho, o Nero, num ataque furioso à sua galinha de plástico, a Jurema. Já não me lembrava de dias intempestivos como este. Nestes dias, apodera-se de mim uma grande preguiça, uma ausência de vontade em fazer o que quer que seja que implique movimento ou esforço mental. Por isso deixei-me ficar deitada. De costas no colchão, pernas esticadas, o braço direito a apoiar a cabeça na almofada e a mão esquerda na barriga. Como quando era criança e me deixava preguiçar a contar os segundos até o meu pai vir ao meu quarto pela milésima vez, com a mesma ternura de sempre dizer “acorda princesa!”.
Às vezes tenho saudades de ser pequena.

17 outubro 2008

Amarelo

o sorriso com que fiquei quando a minha chefe me anunciou o aumento previsto para o meu ordenado.

Branco

Noto que o meu bolso está curto quando olho para o carrinho do supermercado e só vejo marcas brancas.

A minha Alexandria

Nunca fui muito exigente. Bastava-me a selecção das minhas irmãs para me dar por satisfeita. Elas, furiosas da vida, eu contente porque poupava a mesada para nova compra de livros.

As sucessivas mudanças de casa fizeram com que me desfizesse sempre do que considerava mais acessório: a roupa e respectiva purga. Era tão bonita de se ver, eu até tinha um certo gozo malvado nisso. Ia tudo: sapatos, calças, saias, camisas, t-shirts, os tailleurs empandeirados por uma das minhas executivas manas ... As malas, os cintos, tudo. A cada mudança ficava num estado minimal de roupa. Leve e feliz.

Houve um dia, no entanto, em que o destino me traíu: aquilo que eu mais amava acabou por ficar numa casa onde morei por muitos poucos, tão poucos, meses. Sem hipótese de resgatar o que lá ficou.

Metade de mim continua nesse sítio sem nome. A minha alma habita o que ali ficou e, desde então, nunca mais encontrei o que demorei uma vida de 38 anos a construir:

Os meus livros (há quem lhe chame biblioteca).

E isto vale bem mais do que mil roupeiros de roupa de 3,5x2.

14 outubro 2008

Eles também podem



video premiado da campanha "ellos también pueden" para incentivar os homens a assumir as tarefas domésticas.

13 outubro 2008

doclisboa 2008

So many movies, so little time...
A programação está aqui (e esta imagem também).

12 outubro 2008

há 516 anos


imagem aqui
e até hoje continuamos a falar dos descobrimentos...

11 outubro 2008

Fim

E agora era um homem, ainda procurando o amor que nunca encontrei nas namoradas com quem vivi, nas amigas a quem me dei, nas mulheres com quem dormi, e aparecias tu, abandonada pela vida, pelo desejo, pela esperança, e falavas-me da tua dor que nunca mais acabava, das feridas que não mais saravam, da vontade que tinhas em estar, em ser, em acontecer tudo aqui, agora, e depois sorririas, e eu sorriria também, sabendo que serias tu a última pessoa que veria quando as minhas mãos deixassem de tocar, o meu coração deixasse de bater e a minha alma deixasse de sentir.

Hoje encontrei-o nestas palavras

If you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you,
If you can trust yourself when all men doubt you
But make allowance for their doubting too,
If you can wait and not be tired by waiting,
Or being lied about, don't deal in lies,
Or being hated, don't give way to hating,
And yet don't look too good, nor talk too wise:

If you can dream--and not make dreams your master,
If you can think--and not make thoughts your aim;
If you can meet with Triumph and Disaster
And treat those two impostors just the same;
If you can bear to hear the truth you've spoken
Twisted by knaves to make a trap for fools,
Or watch the things you gave your life to, broken,
And stoop and build 'em up with worn-out tools:

If you can make one heap of all your winnings
And risk it all on one turn of pitch-and-toss,
And lose, and start again at your beginnings
And never breath a word about your loss;
If you can force your heart and nerve and sinew
To serve your turn long after they are gone,
And so hold on when there is nothing in you
Except the Will which says to them: "Hold on!"

If you can talk with crowds and keep your virtue,
Or walk with kings--nor lose the common touch,
If neither foes nor loving friends can hurt you;
If all men count with you, but none too much,
If you can fill the unforgiving minute
With sixty seconds' worth of distance run,
Yours is the Earth and everything that's in it,
And--which is more--you'll be a Man, my son.

If, Rudyard Kipling.

(ouvir aqui)

Magnífica

Esta flor que apareceu assim, hoje, no meu jardim.
Vão-se as tempestades, vêm as flores.
Assim o esperamos.

09 outubro 2008

Exordio

Cuenta mi padre que foi em 1640 que Portugal e Espanha passaram a ser dois países diferentes, e deixa transparecer um certo orgulho quando conta como os portugueses puseram os espanhóis daqui para fora ainda que logo depois acrescente, e foi o pior que nós fizemos, se fossemos parte de Espanha as coisas seriam muito diferentes, e descreva a lista das benesses jurídicas, geográficas, relacionais, cívicas e etcs de que dispõem nuestros hermanos y hermanas, obviamente contrastadas com as nossas. Eu, pela minha parte, nunca dediquei muito tempo a pensar se seria melhor ou pior que agora voltássemos a ser um só território. Não sinto Espanha como um país rival, considero que é um país interessante para viver, não me desagrada a ideia, e até acho que podia ser bom sermos um só país que pudesse fazer mais força nas decisões da união europeia, mas não dedico mais que uma breve conversa ao assunto.
Ainda que a palavra nem sempre tenha uma conotação muito positiva, acho que sou nacionalista no sentido em que identifico esse território a que chamamos Portugal como sendo o meu país, com uma série de características específicas, com pessoas que partilham espaços, língua, segundos sentidos, expressões, historia, músicas, enfim tudo aquilo que se partilha num país.
Tenho uma particular sensibilidade e carinho pelo meu país de nascimento e de 30 anos de vida, e este carinho parece acentuar-se quando vivo fora de Portugal, por exemplo, só passei a adorar Madredeus 3 anos depois de viver fora do país.
Mas precisamente por um país ser tudo isto, o meu nacionalismo tem mais quartos que uma casa de putas, pois fui e vou aprendendo a querer e a pertencer a outros países que escolhi para viver.
Actualmente vivo no país daqueles que, contrariados ou aliviados, fizeram o seu próprio país depois de 1640, e estou a aprender e a gostar de conhece-los, ainda que este seja um processo lento e com surpresas.
Assim, este exórdio (o dicionário tem umas palavras fantásticas!) ao assunto do post abaixo, é para que este não seja interpretado como uma simples ou leviana manifestação de nacionalismo da minha parte.

Carta a una organización

Hola,
Conoci vuestra reciente publicación “Guía escolar, el sistema educativo en España”, por la cual les doy mis sinceras felicitaciones, es buen instrumento para apoyar a quienes recien llegan a este país y necesitan conocer el sistema educativo para mejor integrarse en el. Sin embargo, en la página 17 de esta publicación, me encontré con una imagen que me impactó bastante: un mapa de España, haciendo alusión a las lenguas co-oficiales que se hablan en este país y donde aparece representado Portugal, y la lengua portuguesa como si fuera uno de los idiomas de España, pero sin ser una lengua co-oficial. Como no aparece Francia representada, descarté la hipótesis que Portugal apareciera representado por ser un país fronterizo. Resolvi entonces mostrar esta ilustración a varias colegas o amigos/as, naturales de España y de Cataluña, que también se indignaran pero me avisaron, aqui es muy normal aparecer España representada con Portugal al lado.

Como sé que la edición de una publicación pasa por varias manos y por muchos ojos, y como nadie se dió cuentra, me pregunto, ¿a qué se debe el lapso representado en el mapa de esta Guía y en los otros que habitualmente circulan delimitando España? Y ¿por qué parece natural a las personas que dos países, que desde 1640 se construyeron separadamente, sean representados como un solo sin que eso genere una pregunta o incomodidad?

En la imagén del mapa que seleccionaron, la representación que pretende ser geográfica termina siendo mental y simbólica: España es igual a la misma Península Ibérica, pues Portugal no está gráficamente reconocido como un país. Y además, se habla portugués pero ese idioma no está siquiera reconocido como un idioma oficial.

Ya me encontré varias veces con personas de muchas partes del mundo que pensaban que Portugal era parte de España, pero no puedo dejar de sentirme sorpresa al encontrarme con esta creencia (este “lapsus mapis”) arraigada en los imaginarios españoles.

Conociendo el muy importante trabajo que hace vuestra organización para defender la diversidad social y cultural, con igualdad de condiciones y de derechos para todos y todas, y sabiendo que el proceso de transformación de imaginarios sociales es lento y que nadie le está inmune, les pido que cambien ese mapa tan pronto cuanto posible y que se encuentran otros mapas similares, delimiten bien las fronteras entre los dos países. Ampliemos y fortalezcamos cada vez más nuestras relaciones afectivas, económicas, sociales y culturales, pero respetemos nuestras fronteras geográficas.

Un cordial saludo,

Oito e Coisa

IgNóbeis

Ao ver a lista deste ano, pensei: "é desta, é agora! vou mesmo fazer um doutoramento: o efeito que o descanso pode ter em mim!"

que estranha forma de fé tem esse teu coração

Insisto muitas vezes com o meu marido para que ele se relaxe quando fica com muito stress ou preocupado, digo-lhe para fazer meditação, respirar fundo, às vezes ponho-me a fazer ginástica ou uma mistura de tai chi com bollywood com ele, umas vezes ele alinha, outras nem por isso, mas aquilo que eu acho que tem um melhor efeito relaxante sobre ele, é, sem dúvida nenhuma, o Canal Parlamento, as sessões de debate dos deputados e deputadas da Assembleia da República, e não importa se é na Colômbia, em Portugal ou em Espanha, fica caaaalmooo, como se estivesse em estado zen, a pairar, elevado no ar, em comunhão com o Divino e o Absoluto. A política é sem dúvida um acto de fé.

Pão de Ló

O pão de ló é dos bolos mais simples de se fazer. O Pantagruel defende a versão dos '6': ovos, colheres de sopa de açúcar, de manteiga e de farinha. A Maria de Lourdes Modesto mantém os 6 ovos mas opta pelo método da balança no que diz respeito ao açúcar, 200g, à farinha, 350g, e à manteiga, 150g. O Peter Greenaway prefere uma abordagem com ingredientes mais, enfim, exóticos.

Eu cá confesso ter uma opinião diferente. Só para apreciadores, cá vai a minha receita:

1. Confiança Inexcedível nas Capacidades indivuduais para poder responder a todos os desafios, ultrapassar todos os obstáculos e alcançar todas as metas a que nos propomos;

2. Resiliência para enfrentar contrariedades, resistir aos embates e assimilar derrotas, para depois apanhar os pedaços, colá-los e voltar à luta, com renovada força e vontade de vencer;

3. Persistência nas ideias, pensamentos e acções;

4. Humildade para reconhecer erros, assumir lacunas, pedir desculpa. E mudar para melhor;

5. Certeza de que o dia de hoje é melhor que o de ontem e pior que o de amanhã;

6. Auto-estima porque não posso estar bem com os outros se não estou bem comigo própria;

7. Vontade para querer. Tudo, hoje, aqui, agora;

8. Maturidade para entender o que está ou não ao nosso alcance;

9. Inteligência para escolher;

10. Pessoas para nos rodear.

E pronto. Vai ao forno e felicidade garantida.

08 outubro 2008

Tal como uma das múltiplas sugeriu, enviei o mail aos diferentes grupos parlamentares. Até ao momento recebi duas respostas. Uma do CDS-PP:
Agradecemos o e-mail que nos enviou.

Cumpre-nos informar que o CDS/PP respeita as opções de vida de cada um, no entanto, declinamos uma alteração ao regime do casamento e à sua natureza jurídica. Apresento a V, Exa. os melhores cumprimentos.
Otra do PCP:

O PCP é favorável à alteração da lei com vista a permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Fazemo-lo visando a eliminação de uma injustiça que continua a existir na nossa legislação, em contraste com a proibição da discriminação em função da orientação sexual, que a Constituição estabelece no seu artigo 13º, em redacção proposta também pelo PCP. Esta posição do PCP terá contudo consequências distintas em relação aos dois projectos agendados – do BE e do PEV. Votaremos a favor do projecto do PEV. Quanto ao projecto do BE, estando o PCP de acordo com o objectivo de permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo, temos reservas em relação a duas questões concretas. Por um lado em relação à alteração do conceito de casamento proposta, e por outro lado a que, sem que isso signifique uma tomada de posição sobre a questão concreta, em relação à oportunidade da introdução neste momento da questão da adopção. No momento em que se agravam medidas anti-sociais e de limitação de direitos, sendo que a descriminação em função da orientação sexual corre a par e redobra os efeitos desta ofensiva, não temos dúvidas de que a introdução da possibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo, não esgota as situações discriminatórias. O PCP continuará por isso a lutar contra as injustiças e a defender uma ruptura com a política de direita em curso. Com os melhores cumprimentos,
Os momentos parlamentares talvez sejam diferentes dos momentos da vida de tantas e tantas pessoas nossas vizinhas, irmãs, desconhecidas que ainda são tratadas de forma diferente pela sociedade que se gaba de promover a igualdade e a justiça. Mas ainda que o sejam, uma vez que esta questão vai a debate, o melhor é que aprovem de uma vez por todas o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

07 outubro 2008

Amanhã, 2ª Flash Mob

O que é uma Flash Mob?

É uma multidão de pessoas, num sítio público, que realiza uma acção previamente combinada, e que deve dispersar por completo após a realização do proposto.

O que devemos fazer?

Levar uma folha em branco e uma caneta. Às 19h30, escrevemos na folha em branco "Acesso ao Casamento Civil", e de seguida, erguemos a folha para que todas e todos a possam ler.
Ao fim de um minuto, é urgente dispersar, como se nada tivesse acontecido.


Amanhã, quarta-feira, 8 de Out, às 19h30, 2ª Flash Mob, na Praça do Rossio, junto à estátua, onde foram muitos homossexuais castigados publicamente.

retirado daqui e de vários emails

A propósito de telefonemas

Conversa telefónica entre a apresentadora de um programa de rádio e a sua ouvinte, directamente de Espanha.

- Então a senhora já sabe dizer muitas coisas em Espanhol?
- Já, já vou aprendendo algumas coisitas.
- Depois tem de me ensinar a mim também (riso meio descontrolado).
- Ah, tá bem, quando eu já souber alguma coisa de jeito...
- Atão, diga lá umas palavrinhas que já saiba dizer, aqui para os nossos ouvintes...
- Não sei nada, não sei dizer nada.
- Ah não? Não me diga que nem sequer sabe dizer Hola?
- Ah, isso sei mas não vou tar para aqui a dizer isso....

06 outubro 2008

la senhora de la casa

Hoje, numa das inúmeras chamadas telefónicas que recebo por semana para me convencer a mudar de companhia de telefone, internet, televisão, luz, telemóvel, ou para fazer inquéritos ou qualquer outra coisa que lhes ocorre:

- Muy buenas tardes sería posible hablar con la señora de la casa?
- A senhora da casa? Qual delas?
- Pues... la señora de la casa..
- Pois sim, mas somos muitas, eu, a minha esposa, a nossa filha.
- Ahhh....pues... bien....ehhh... la principal...
- Pois, de novo temos uma dificuldade, principais somos todas, e já agora, antes de dizer-me o que quer vender, comprar, anunciar ou perguntar, agradeço-lhe imenso a sua chamada, mas não posso ajudá-la e não estou interessada, uma óptima noite.

Será que depois de 10 de Outubro, eu também poderei dizer isto em Portugal?

quem dá mais?

- Bom dia, eu queria rescindir o contrato de serviço de televisão convosco.
- Com certeza, podemos saber porquê?
- Porque a xpto me oferece o mesmo serviço mais barato: € 5 de diferença na factura mensal.
- Dona oitoecoisa, assim sendo nós temos para lhe oferecer uma promoção especial em que fica a pagar € 18 por mês, ou seja, o mesmo valor que a xpto lhe oferece.

03 outubro 2008

Amor assassino

Agarro na tua mão e digo-te toma é bom vais gostar. Sei que estás a minha mercê, como um barco abandonado à ondulação de um cais, dizes que sim e experimentas, primeiro a medo, depois entregas-te ao delírio que tantas vezes te descrevi. Vejo-te desfalecer nos meus braços, e não contenho um sorriso, feliz, porque superaste tudo aquilo que até a mim mesmo não exigi. Chamo uma ambulância e noto a coloração do sangue em que te esvais, não podia ser mais bonita, adoro tudo em ti, o teu amor, a tua lealdade, as tuas entranhas, esta cor que certamente não voltarei a ver porque me deste a prova de amor suprema: a tua vida, quando a mataste com o com que te acenei.

Uma outra colisão

Há muito que não me lembrava como era dormir no meu quarto. Aquele onde ainda estão as fotografias de há alguns anos. Aquele que se lembra ainda de uma pessoa na qual já não me reconheço. Ocupo esta cama por uma estadia temporária, como sempre desde que resolvi que esta não era mais a minha casa, desde que decidi que não mais teria casa, desde que decidi que seria mais fácil assim.
Esta noite dormi nesta casa, neste quarto, nesta cama. Os livros, os móveis e as fotografias mantêm a mesma disposição mas habitam agora um espaço desprovido de vida. A história que contam é ora obsoleta, fala de histórias e de pessoas que o esquecimento deixou escapar. Adormeci a pensar nessas pessoas e nessas histórias que se tornam cada vez mais difíceis de recordar.
Acordei afogueada, com as lágrimas nos olhos. Matei-te e nem sequer o sabes. Matei-te no meu sonho. Tiveste uma morte estúpida. Estavas a andar, sonhei-te com o mesmo andar de sempre, aquele que por o conhecer tão bem não consigo descrever. Depois, distraído enquanto pensavas deixaste cair o pé em falso. Caíste tu também. A tua cabeça bateu contra a calçada, um único embate, forte e impetuoso. Os teus olhos azuis inertes contemplavam o céu. Um estranho correu até ti na tentativa de socorrer alguma esperança contraditória da realidade cruel que estava perante ele. Ajoelhou-se, apoiou a tua cabeça e ouviu as tuas últimas palavras. Chamaste a tua mãe, a tua irmã e o teu pai. E antes de fechares os olhos chamaste o meu nome. De repente o plano alterou-se. Estava numa sala pequena, no teu velório. Chorava e ouvia a descrição sentida do jovem estranho que tentou salvar-te.
Incrédula, levantei-me, ainda com medo que este não tivesse sido só um sonho e que alguma coisa pudesse não estar bem contigo. Mas não te liguei, por orgulho ou por medo. Escolhe tu.
Tomei banho e pensei que o melhor era tentar esquecer este sonho e fazer aquilo que me tinha proposto a fazer esta manhã. Bebi um café, fumei um cigarro e fui até ao registo civil. Quando cheguei dirigi-me à máquina de tirar senhas. Tirei uma e ansiosa peguei no papel que ditaria quantas horas teria de ali estar. O meu número era o trinta. Olhei para uma parede repleta de avisos aos senhores utentes. Avisavam-me que cada atendimento demorava cerca de vinte minutos. Eram 9h30 e o balcão de atendimento que registaria a minha nova identidade estava paralisado na senha número três. Era uma conta fácil. Vinte minutos por cada atendimento vezes vinte e sete pessoas que tinha à minha frente. Mas os números entrelaçaram-se na minha cabeça e os minutos eram tu e as vinte e sete pessoas à minha frente eram todas tu.

Tarde

Sempre dissera que sim a quase tudo. Deve ter sido por isso que naquele dia o seguiu até ao résdochão onde uma senhora muito branca murmurou palavras incompreensíveis, deve ter sido por isso que sorriu aos sorrisos que a rodeavam, deve ter sido por isso que pegou na caneta e assinou o nome que era seu num papel cheio de palavras onde estava também o nome dele, deve ter sido por isso que continuou a sorrir nos dezanove anos seguintes até à tarde em deixou a chave no lado de dentro da porta e descobriu que não podia mais voltar atrás.

Memórias

O meu amigo Serginho era uma pessoa maravilhosa e enorme.

Enormes eram as suas paixões, as suas convicções, a amizade que singularmente cultivava, o seu coração. Enorme era a sua alegria como enorme era a sua tristeza.

E era imparável. Falava horas a fio e gesticulava como o fazem as crianças quando contam o que o Pai Natal lhes pôs no sapatinho. Para o Serginho era sempre Natal.
Naquele 3 de outubro acordei com a sensação de que o mundo, tal como o conhecia, tinha acabado. O Serginho tinha, de facto, pregado uma enorme partida a todos naquela madrugada fria.
Nunca mais lhe ouvi a voz do outro lado do fio que nos ía mantendo ligados mas ainda o ouço falar (alto, muito alto!) quando percorro algumas calçadas de Lisboa por onde passeámos juntos, ainda o ouço na mesa do café pedir o "sumás d'ananol" com que cortava a ressaca da noite, ainda consigo recuperar a gargalhada arrebatadora e inocente. E nas praias de Tavira, impossível será não escutar o trinado da sua flauta.
Neste 3 de outubro, quero mandar-lhe o Recado que ele próprio escreveu:

Quero mandar-te um recado
Na forma desta canção
Um recado engraçado
Direitinho ao coração.

Começando por dizer
Tudo o que te quero bem
Tenho a saudade a doer
E dói-me o peito também

O vento corre à vontade
Da lua cheia ao poente
Eu corro pela cidade
Louco de amor e doente

Venho por carta rogar-te
Dá-me um pouco de atenção
Deixa-me ao menos amar-te
Enquanto dura a canção

Sorri-me ao menos de frente
Sempre que por mim passares
Esse sorriso tão quente
De outras terras de outros mares

E que me alivia a espera
Pela volta do correio
Enquanto for primavera
E eu viver neste anseio.

Há pessoas assim, que têm a capacidade de viver quase para sempre.

dificuldade educacional vii

Fio dental por baixo de vestido de malha colante e transparente.
Distracção ou propósito?

02 outubro 2008

A socióloga que há em mim

Depois de ter lido o mosh, o tudo à molhada, o nos últimos dias todos os dias e o 10 de Outubro (e, last but not least, um comentário-apelo perdido algures numa dessas panelas de pipocas, perdão, caixa de comentários), veio à tona a socióloga que há em mim.

Por isso, está disponível a partir de hoje e até final de Outubro, na barra lateral, antes do nosso perfil, uma sondagem que me parece importante para as discussões que andam aqui a ser esgrimidas. Resolvi começar pela primeira - a do casamento entre pessoas do mesmo sexo. As questões relativas à dissolução do casamento serão matéria de discussão mais à frente. Reservo-me o direito de ter achado o debate da primeira mais premente e de considerar, por outro lado, que se deviam separar as questões: a saber, casamento, família e género.

A pergunta que se coloca aos leitores do 8 e Coisa 9 e Tal é muito simples, assim como a resposta à mesma: concorda com o casamento entre pessoas do mesmo sexo?. Esta pergunta só admite 3 respostas possíveis, o que a torna heuristicamente válida, por não admitir mais (do que as) respostas possíveis.

Refira-se que se transformou a habitual questão residual 'não sabe/não responde' em 'não tenho opinião formada sobre o assunto'.

Agora é que é: todos à molhada a responder! Queremos saber a vossa opinião sobre esta matéria. Os dados falarão por si, claro. Mas prometemos novo balanço no final da sondagem.

C'est à vous!

afinal quem é maricas?

eu bem vejo as pipocas a esalarem e eu aqui com tanto milho para dar e o raio do rabalho que não me deixa e ainda para mais o meu compuador parece que veio da segunda guerra e algumas eclas saltam. Mas a sem-se-ver veio em meu auxilio e informou-nos dese lin, que aé uma proxima posa, resume muio bem o que eu penso sobre o assuno:

Pelo Miguel Vale de Almeida: Afinal quem é maricas?

Moooooooooooooooooosh!

Três caixas de comentários abaixo, a tal que parece uma panela de pipocas, acusaram-me de ser intelectualmente desonesta. Achei uma maravilha! Palavra que me diverti! Especialmente porque sempre disse que casamento é “entre pipi e a pilinha - mai nada”. Da mesma maneira que, noutro plano, arrendamento não é leasing, contrato promessa não é contrato definitivo, acessão não é compra, lei não é regulamento, novação objectiva não é novação subjectiva, prescrição não é caducidade, and so on. Isto não são gavetas, são institutos jurídicos diferentes embora possam ter entre si pontos de contacto, maiores ou menores.

Confesso que achei particular graça ao pseudónimo, à referência a “dogma” e à preocupação do “criador”, sendo que eu – para além de também achar que uma das grandes obras do Criador é, justamente, as sinapses do beijo - estou a falar no plano da estrita técnica do direito, essa grande ciência!

deve ser hipoglicémia, uma colher de açúcar e isto passa

Estava praqui a pensar que a colisão já aqui canta há dois dias, que é preciso empurrá-la um bocadinho para baixo e dar o corpo ao manifesto de um blogue que se quer vivo e acordado e mostrar que não andamos para aqui a dormir porque não é para isso que nos pagam, está bem que ali em baixo temos uma caixa de comentários que parece uma panela de pipocas, não há como sermos muitas e muito diferentes entre si para encontrarmos discussões e desacordos, está bem que temos vidas trabalhos contas para pagar preocupações e alegrias filhos e filhas maridos e namorados, está bem que a vida custa a todos mas a verdade é que a colisão já está aqui há dois dias, somos tantas e ninguém atira a próxima pedra e por isso aqui venho eu encher mais um chouriço, por falar nisso estava a pensar fazer umas favas com entrecosto mas falta-me a paciência e por isso vou mas é fazer uma salada daquelas automáticas, abre-se o saco e junta-se azeite e vinagre a gosto, atiram-se mais umas coisinhas e está feita a festa, nada de panelas nem cebolas nem colheres de pau, viva a vida moderna e nós que vamos lá dentro.