10 novembro 2007

A voz

A auto-estima parece que anda na boca de toda a gente, como a pasta medicinal couto de há uns anos. Ainda não entendi é se o segredo é olharmos mais ou menos para nós.

Nunca vemos a nossa cara, o espelho dá-nos o seu inverso. Aquela que vemos lavar os dentes e a pôr hidratante na cara não é a mesma que atraiu o Manuel do 2ºC.

Não sentimos o nosso cheiro, quanto muito o do perfume que escolhemos, e mesmo esse desaparece por hábito ao fim de umas horas.

Não reconhecemos o nosso sabor nem o tacto, não perdemos tempo com o auto reconhecimento sensível.

Mas o sentido que mais nos incomoda sempre é a audição. Apesar de sermos as únicas pessoas no mundo que ouvimos tudo o que dizemos, ficamos sempre horrorizados quando se nos devolvem o som da nossa voz.


A minha única esperança é que o essencial seja invisível aos olhos, inaudível aos ouvidos, inodoro ao olfacto, insípido ao sabor e imponderável ao tacto.

9 comentários:

joão belo disse...

o nossa matéria é uma máscara. brilhante, o post!

foi dançar a bossa nova disse...

Muito bom, sim sr.ª!!!

António Pires disse...

Daqui, só reconheço a frase «o essencial é invisível aos olhos» («O Principezinho», de Antoine de Saint-Exupéry) e o resto parece-me redundante... embora inteligentemente redundante com essa frase...

(é estranho: identifico-me tanto com este teu blog...)

8 e coisa 9 e tal disse...

a redundância é propositada, claro.

identificar com este blog é quase fácil: somos 7 e pico, 8 e coisa, 9 e tal mulheres, ou uma só com personalidade múltipla. com alguma hás-de acertar... ou mesmo com várias... ou com uns bocados de umas e outros de outras.

dizia ela baixinho disse...

o essencial, assim como o fundamental, são (quase sempre invisíveis) aos olhos.

pelo contrário, as minudências são as que iludem. mas, justamente, as que não interessam para nada.

"I will not cease from mental fight,
nor shall my sword sleep in my hand" (W. Blake)

dizia ela baixinho disse...

o essencial, assim como o fundamental, são (quase sempre) invisíveis aos olhos.

assim é que é.

a citação do Blake está ali a fazer qq coisa q me pareceu essencial no momento. agora parece-me uma minudência.

Hèlas.

António Pires disse...

Uiii... Pois, se calhar a minha identificação é mesmo com uma manta de retalhos, um puzzle, um monstrinho feminino do Dr.Frankenstein... E eu até sei lidar com bipolares, embora com multipolares seja mais difícil...

E gostei da citação do Blake (disto e do que vem com isto: «Bring me my bow of burning gold, Bring me my arrows of desire...»), mesmo que seja uma minudência «real»...

aflito co'as mãos nos bolsos disse...

e se o essencial é invisível e imperceptível aos sentidos, então como poderemos percebê-lo?

8 e coisa 9 e tal disse...

oh cara aflito, estava a ver que ninguém fazia essa pergunta!

Temos de encontrar novas formas de sentir o essencial, já que as tradicionais não funcionam.

Eu proponho uma: a de sentir na barriga, algures por detrás do umbigo, se alguém me tocou especialmente.

Outra: sei que estou bonita quando me sinto bonita, que se traduz numa postura ligeiramente diferente de ombros - que nada tem a ver com o que o espelho me devolve.