28 fevereiro 2007

Crónicas desta vida mundana

I
Ela uniu-se a uma amiga para atormentar a vida à mulher do amante. As duas entraram no ritual diário de telefonarem à pobre senhora, dia ou noite, a ofendê-la com todos os nomes pomposos que se lhes ocorriam na altura. A dita senhora chorava de aflição e desconfiava de quem fosse, por isso confrontou o marido. O marido confrontou a amante. A amante uniu-se à amiga e arranjou um esquema para se conseguir ilibar. No dia em que sabia que ia estar num jantar com o amante presente, mandou a amiga ligar à mulher dele a ofendê-la. A mulher ligou ao marido a queixar-se em pleno jantar. E ali estava a amante, sorridente, alheia a tudo e sem culpas no cartório aos olhos do seu querido.
II
Ela sabia que ele andava metido num desses portais de amigos na Internet. Onde se fazem novos conhecimentos e se reatam outros mais antigos. Ela desconfiava que ele andava de novo a contactar com a sua ex-namorada. Mas ele rapidamente enchia-a com a culpa da paranóia e ela calava-se. Um dia ela resolveu-se. Mandou um mail ao namorado usando o endereço da sua ex-namorada. E ele caiu na ratoeira. Respondeu-lhe imediatamente.
III
Ela sabia que ele tinha uma amante. Confiscava-lhe o telemóvel sempre que podia e espiava os números todos. Ele deixava-a fazer isto. Porque o número dela estava camuflado sob o nome dum amigo. Para completar a jogada utilizava sempre um terceiro amigo que servia de intermediário para combinar os encontros com a amante.
IV
Ele sabia que já era. Que já tinha sido. Que ela agora sonhava com outro. Ela tinha a opcção no messenger seleccionada para não gravar as conversas. Ele durante a tarde mudou-lhe os parâmetros à socapa e mais tarde conseguiu apanhar-lhe uma conversa suspeita com o dito. Ela negou sempre tudo e ele nunca conseguiu fugir da ideia de que era obrigado a dar-lhe o benefício da dúvida. Porque não queria chamar-lhe mentirosa. Porque doía muito. Mas ele via na mesma. Via tudo mesmo que ela achasse que não. Via o telemóvel dela em cima da mesa à frente dele, sempre silencioso, parecendo provar a inexistência de outra vida fora dali. Mas ela tinha tudo seguro. Um segundo telemóvel andava sempre enfiado dentro das botas de cano por baixo das calças dela. Em modo vibração, claro. Ele nunca a apanhou.

13 comentários:

Anónimo disse...

A traição mais dolorosa é a que aparece de vez em quando dentro desta história virtual que corre na minha cabeça. A história que construi depois da nossa história ter acabado. Porque há ainda uma vida contigo dentro da minha cabeça. Essa vida tem 10 anos. E tu não sabes dela. Tu já não és por certo aquela que eu fui contruindo durante este tempo. Tens uma vida dupla e nem sabes. Tens uma segunda vida. Uma é tua e a outra é minha. Dei-me ao trabalho de a construir para que fiques sempre comigo. Para sempre. Só me falta dar um toque ao programa para que não me traias nesta vida virtual. Porra, nem nesta vida consigo desprogramar a traição.

nove e tal disse...

hummm...

estas histórias são reais ou ficcionadas? parecem-se com tantas que já ouvi... DIO!

manyfaces, 10 anos é muito tempo. tinhas algum contrato de fidelização a esse amor? caramba, com tanto mulherio (e sushi e sashimi aí à solta) e sois que se põem... cá p mim esse programa vai dar sempre um ou outro 'bug'.

8 e coisa 9 e tal disse...

uma querida amiga múltipla ensinou-me esta do lord byron há muitos anos atrás. e eu nunca mais me esqueci dela.
"it´s strange but true. for truth is always strange, stranger than fiction."

na prise és bestial disse...

no tempo em que os animais ainda falavam, querida oito e coisa. Um abraço

mac disse...

Traições...é caso para dizer que a tecnologia é o melhor amigo do traidor.

Anónimo disse...

caro manyfaces,

como o entendo, creia-me. o comentário de nove e tal reforça a ideia que mais vale manter uma verdade ficcionada do que embarcar numa realidade que se rapidamente se torna ficção.

o que vale é que esse comentário dura menos que uma hora... e dez anos valem bem a pena.

creia-me na mais elevada consideração,

Anónimo disse...

I. A mulher recebia telefonemas de duas, mas ele só confrontou uma.

II. O endereço e a password já agora...

III. Espiava tanto que nem via que ele telefonava tanto para um e não para uma.

IV. Vibração para quê ? Para ter a certeza que teria que se descalçar ?

"People, Process, Technology in this order if you please"

Filipe M. Reis disse...

Que lindas sinopses p´ra folhetins em 3001 episódios a emitir na TVI em horário nobre. Brilhante!

sete e pico disse...

1. que pachorra a delas para andar a chatear a vida aos outros e a inventar esquemas malucos para se ilibarem, há mesmo gente com pouco que fazer.

2.3 e 4. oxalá nunca tenha que engolir as minhas próprias palavras mas manter relações duplas durante algum tempo é demasiada mão de obra, não dá saúde a ninguém, só o amor vale a pena... e quando este acaba continua a vida para a frente que para trás mija a burra, por isso manyfaces, lembre-se que esta vida é só uma.

pelo sim pelo não, deus nosso senhor me livre e guarde, o melhor é aprender algo das novas tecnologias para não ser a ultima a saber, fiodass carialho...

sem-se-ver disse...

não concebo a traição. muito menos com estes requintes de malvadez - que, a bem dizer, me parecem produto de gente desiquilibrada e definitivamente poucochinha.
mas isso devo ser eu que pratico o meu lado careta com muito afinco.

Anónimo disse...

"manyfaces, lembre-se que esta vida é só uma."

Tenho problemas com isso. O meu nickname ilustra bem o dilema...

Estou a lembrar-me daquele 007:

"The World is Not Enough
But it is such a perfect place to start my love"

Anónimo disse...

acho piada a conselhos de "vá para a frente"

acho ainda mais piada a quem acha que dez anos é um contrato de fidelização, nem vale a pena falar do que para aqui transpirou e transpira ainda a casos mal acabados.

haja sobretudo honestidade e chega de tentar passar uma imagem que não corresponde à realidade, fica muito mal.


sério

D. Ester disse...

casos mal acabados quem os não tem. o mesmo vale para os amores platónicos.

Cada um faz o melhor que pode com o que tem, mesmo quando se sabe que aquilo que se quer não é o melhor nem o mais correcto.

Não me parece que por aqui se façam juízos de valor. Mal seria.

Quanto às histórias de tração com a ajuda das novas tecnologias, é o pão nosso de cada dia. Com os sms, mails, messengers e quejandos a possibilidade de vidas e amores paralelos aumentou exponencialmente, porque permite a sedução em segurança dos olhares alheios. Até ao momento em que o conjuge consegue quebrar o segredo.

As pessoas que são apanhadas é porque o querem, de forma inconsciente a maioria das vezes. Querem ser descobertos para que a mentira acabe, para que se possa ser confrontado com a verdade e obrigar a uma decisao sem se ter de dar o número do "temos de falar". Até mesmo p usar a sempre eterna desculpa do "não significou nada, por isso nada te disse"