25 abril 2008

9 de agosto de 2000

Jesus Abad Colorado, fotógrafo colombiano

PUFFF ­ E mudou novamente o cenário. Ficaram para trás as férias em Portugal, o lindo sol de Lisboa e as conversas com os amigos, o que vi e o que ficou por ver. Ficou a sensação de felicidade das férias apesar de me sentir um pouco marciana ao inicio. Senhores visitantes, a vida vai continuar. Passageiro Ete, passageiro Ete, Sete. O avião, por sorte diga-se, ainda está à minha espera, apesar de ter chegado com bastante atraso ao aeroporto. Não adianta perdê-lo, pois nada pára e já se sabe (sabe?) que não se pode estar em dois lados ao mesmo tempo. Se eu fico aqui não vou lá, se vou lá não fico aqui.

PUFFF. Vruuumm. Aterrizagem em Bogotá. Agora já conheço os truques todos do aeroporto, já sei que táxis devo apanhar, apenas os que se pedem no aeroporto, não vá o diabo tecê-las, pois o gajo aqui é um tecelão de primeira.

PUFF PUFF.

Apartadó, começa o trabalho que isto um mês de ausência aqui é equivalente a três décadas da mais intensa história, há que actualizar. O nó na garganta começa a crescer. Os confrontos agudizam-se, mais e mais. Destruem casas, pontes, igrejas, estradas, torres eléctricas, vidas. Começam, para mim claro, porque aqui a história há muito tempo que já começou, a surgir grupos que se dizem apoiantes de uma ou outra guerrilha, mas que ninguém sabe ao certo se o são. Um deles, Exército de Libertação Guevarista (deste nunca tinha ouvido falar) raptou um francês dos Médicos Sem Fronteiras, pois como a Franca está na Presidência da União Europeia dizem que é uma forma de pressionar a Europa para que esta assuma uma posição mais forte sobre os atentados aos Direitos Humanos. É paradoxal, no mínimo!.

Continuamos com o circo: um comerciante foi raptado duas vezes: tinha sido raptado pelas FARC e, precisamente no dia acordado para a sua libertação, zucas, veio outro grupo, ELN, e rapta-o outra vez. Pobre senhor, confirma-se o ditado que até ao lavar dos cestos ainda é vindima.

Conta-se a boca solta que San Vicente de Caiguán, a chamada zona de distensão, onde Governo e FARC seguem com as negociações do processo de Paz, e que por mútuo acordo não está militarizada, se tornou não só um quartel general do dito grupo subversivo, onde se combinam ataques e estratégias, como também um poiso seguro para manter os sequestrados. E na vida do dia a dia, continuamos a ver os pacotes de leite, os álbuns de foto que nos dão quando vamos revelar fotografias, jornais e outros objectos da vida quotidiana, com fotografias, avisos e conselhos úteis para prevenir o sequestro.

Mas do outro lado continua a resistência em todas as suas frentes. Os lideres activistas do Direitos Humanos seguem com o seu trabalho apesar das imensas baixas (são um dos grupos mais visados, junto com os jornalistas), as ONG´s continuam com o seu apoio de assistência humanitária e de restabelecimento económico. E as comunidades de desplazados enterram os seus mortos e seguem o seu caminho que não se sabe onde vai dar. Outro dia vi um cartaz de um grupo de crianças desplazadas que dizia ”Esta guerra não é nossa e estamos a perde-la”. Também estas crianças já estão a aprender a organizar-se para poderem ter mais força na sua luta pela paz, que apesar de não saberem o que é pois ainda não a conheceram neste país em guerra há mais de 40 anos, sabem pelo menos que é a antítese da guerra, ou seja, o perder o medo a que venham de noite e que lhes levem os pais, ou que as obriguem a mudar mais uma vez de sitio de vida, ou que as recrutem para uma guerra que não querem. FONEX. Jacpot neurótico toda esta cena.
Puf puf puf puf puf.
Uffff.

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