Se deixar de fumar tem qualquer coisa de religioso, temo bem estar a caminhar para o inferno.
31 outubro 2007
Revisitando Sartre
Se deixar de fumar tem qualquer coisa de religioso, temo bem estar a caminhar para o inferno.
30 outubro 2007
O cliente tem sempre razão
Resolução de Outubro
28 outubro 2007
Anti-emético
26 outubro 2007
Pá, e agora?...
Acho porreiro que o novo tratado seja assinado nos Jerónimos, que tenha o nome de Lisboa, que tenha sido negociado pela presidência portuguesa enquanto o presidente da comissão é um português e que tenha sido que tenha sido anunciado ao mundo em português. E sim, isto é mesmo “porreiro pá.” Numa vitória portuguesa querem expressão que nos traduza melhor? Somos mesmo porreiros!
Agora, o problema do nacional porreirismo é este:
i) poucos gostam de trabalhar e acreditam naquilo que fazem;
ii) poucos acreditam que os outros acreditam naquilo que eles fazem;
iv) muito poucos planeiam e coordenam;
v) quase todos fazem as coisas à ultima hora;
vi) todos aproveitam a oportunidade para brilhar.
O problema que o nacional porreirismo agora tem para resolver é este:
Como as últimas eleições foram uma coisa assim à pressa, de surpresa, ninguém esteve para perder tempo a estudar, pensar e explicar o que seria, ou não, aceitável para Portugal nas grandes questões institucionais europeias e, ao invés, os quatro grandes partidos políticos apenas escreveram nos respectivos programas eleitorais que defendiam a realização de um referendo (ver aqui as transcrições do PS, PSD e CDS ), esperando usar a questão europeia como cravo no espinho da governação do próximo – sim, porque acho que ninguém queria mesmo ganhar aquilo….
A m*** foi que as negociações correram bem e o tratado foi mesmo concluído pela presidência portuguesa e até vai chamar-se “de Lisboa”. Agora, ninguém quer estragar a fotografia de família, que até está porreira.
Eu não gosto muito da União Europeia, não sou a favor do referendo e até me irritei quando uma jornalista portuguesa, ao entrevistar o Presidente do Conselho, dirigiu uma pergunta ao Primeiro Ministro português. No entanto, confesso que aguardo, expectante, a maneira bonita como (todos) me vão dizer que não disseram o que escreveram, porque o que queriam dizer era outra coisa e que não, ninguém mentiu nem ninguém está a enganar ninguém e que, quando for oportuno, até vão poder explicar a posição de Portugal no novo xadrez e no novo conceito de soberania nacional…. Sim, porque não acredito que eles vão manter a promessa. E isto é que é triste. E é isto que já nem deixa perguntar "antão pá?...".
Ele há tanta maneira de compôr uma estante
nem a crítica de arte nem a câmara escura.
Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio.
Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante.
Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício
Não é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola.
Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come.
Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!
Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo
No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra.
Mário Cesariny, Pastelaria
25 outubro 2007
A estrada para Damasco
‘Quem és Tu, Senhor?’.
‘Eu sou Jesus Nazareno, a quem tu persegues’.
‘Que hei-de fazer, Senhor?’.
‘Levanta-te e vai a Damasco; lá te dirão tudo o que deves fazer’.
de Actos dos apóstolos, Capítulo 9
Persisti. Chegaram os dias duros, o stress, os problemas a resolver, os capítulos para acabar, os artigos a escrever, as cartas para mandar, telefonemas, dramas irresolúveis por mim. Estoica, continuei pela minha estrada de Damasco.
Um dia não resisti, permiti-me cair. No dia seguinte mantive-me firme e hirta no posto.
Passaram mais uns dias, encontrei um amigo e contei-lhe que estava a conseguir. Confessei-lhe que tinha prevaricado a meio, mas que me sentia no bom caminho. Ele disse-me que não me podia permitir isso, que se me deixasse cair em tentação o demónio vilão fumador dentro de mim começaria a perseguir-me, a repetir-me que não fazia mal deixar-me ir de vez em quando, que era humano, a arranjar-me todas as desculpas, e que me cabia a mim e a mim somente impedir que ele me ganhasse nesta luta.
Resistir às tentações, não deixar o diabo vencer-me, encontrar as minhas forças, preserverar na minha decisão.
Não sabia que deixar de fumar tinha tanto de religioso.
Amanhã será o meu segundo dia 1.
24 outubro 2007
Dino quê?
Quem conhece o caminho pela auto-estrada da Crel em direcção a Loures, sabe que passa por um túnel onde foi construída, a delinear o seu arco de abertura para a passagem dos veículos, uma figura em ferro que representa a cabeça de um dinossauro. Isto acontece porque este túnel passa exactamente por baixo dos terrenos onde em, 1993, foi descoberto um trilho de pegadas com 140 metros de extensão, deixadas por um dinossauro herbírovo e outro carnívoro, que datam do período Cretássio, e que é não só a maior pista encontrada em solo europeu mas também uma das maiores do mundo.
Ora estes dinossauros que na altura não faziam ideia que estavam a pisar a futura freguesia de Carenque e muito menos o território Português, foram muitíssimo infelizes com o sítio que escolheram para passear com toda a razão, claro, visto que também era impossível para eles saberem a quantidade de palermas que 95 milhões de anos
Foi com alguma excitação que num fim de semana destes, eu e o meu mais que tudo resolvemos ir matar tempo até ao almoço com um passeio para ir visitar as tão faladas pegadas de dinossauros em Carenque. Chegar a Carenque já foi díficil, parece que ninguém está muito preocupado em querer mostrar onde fica o raio da freguesia com placas de sinalização. Sempre em andamento, sem sabermos muito bem para onde ir, aparece de repente mesmo à nossa frente um pequeno barracão de 10m2 , não mais que isto, construído em alumínio, vejam só, pintado de azul, com umas letras amarela pintadas por cima da porta trancada a cadeado, que diziam “A toca dos dinossauros”. Em frente ao fabuloso edíficio um pequeno jardim todo cercado de rede, com pelo menos 20 estátuas de dinossauros de algumas espécies que nunca vi em livros e que na realidade se assemelhavam mais a crocodilos bípedes, todos pintados em verde alface, todos com as bocas abertas e as línguas vermelhas e uns cotos em vez de garras, que não tive dúvidas tinham sido obra de algum projecto de estudo de uma escola primária das redondezas. Depois de muitas voltas dadas, lá encontrámos, finalmente, alguns prédios de habitaçao e um senhor que nos explicou qual era a entrada certa onde virar o carro até ao terreno. O diálogo que se seguiu com este senhor foi hilariante, no mínimo.
-Mas as pegadas depois estão assinaladas lá?, perguntámos nós.
-Não, disse o senhor, aquilo não se vê nada.
-ah não?
-Não, atão aquilo depois com as obras do túnel, eles tiveram que tapar aquilo tudo para não se estragar, atão aquilo agora tá tudo debaixo da terra.
-Atão mas não voltaram a destapar?
-Não. Nunca mais encontraram aquilo outra vez, eu vivo aqui há uma quantidade de anos e eles nunca mais mexeram ali.
Cada vez mais entusiasmados por descobrir que este país não era de todo imprevísivel, quisemos na mesma ir lá testemunhar a desgraça com os nossos próprios olhos. Depois de estacionar o carro, andámos cerca de 500 metros em várias direcções, perdidos em busca de qualquer sinal, de qualquer vestígio mas ao invés disso o que encontrámos foi terreno baldio e variadíssimos montes dispersos de entulho das obras e outros, como cartuchos de espingarda vazios, por exemplo, deixados no chão por alguém que talvez se tivesse entusiasmado demais com o “Jurassic Park” do Spielberg e que julgou que as pegadas ainda tivessem dono.
Escusado será dizer que a hora de almoço já tinha passado largamente quando chegámos a casa mas que nos sentimos culturalmente muio mais ricos, lá isso sentimos e em júbilo por saber que foram só precisos uns míseros 13 anos para finalmente ter sido aprovada a obra para a construção de um museu que vai finalmente permitir a preservação e a abertura ao público deste achado magnífico.
Em nenhures ninguém quer construir estradas
Um dia construíram uma estrada que passava por cima do sítio onde tinha nascido. Começaram a tomar a outra estrada. Deixaram de lá aparecer. Deixaram de lá passar. Deixaram de a admirar. Deixaram de a regar. Ela deixou de florir. Então, o fenómeno deu-se: transformou-se num cacto.
Agora mora no deserto vermelho. Tem por amigos uma joshua tree e um escorpião. De quando em vez também aparece uma rattlesnake muito venenosa. Falam pouco e vivem em harmonia no meio da imensidão. Em nenhures ninguém quer construir estradas.
23 outubro 2007
Something more
Amanhã, 24 de Outubro, às 22h em ponto (mesmo) no MusicBox.
Mark Thompkins é um americano em Paris, bailarino e coreógrafo de dança contemporânea. Há já uns anos que se mexe ao som e arranjos do nosso Nuno Rebelo.
Um dia Mark mostrou ao Nuno as letras que fazia quando não estava a dançar. O Nuno fez a música. Apareceu Mark na versão Lewis, a mostrar que sabe cantar.
Juntaram-se o Vítor Rua (ex-GNR), Alexandre Cortez (Rádio Macau) e Samuel Palitos (Rádio Macau) e em vez de música conceptual nasce uma banda rock. A ver e a ouvir.
Também aqui e aqui.
22 outubro 2007
A promessa
Diga lá Excelência
a) Também poder fazer chichi de pé, sem a preocupação de ficar com o rabo de fora e com salpicos nas bainhas das calças ou nos tornozelos ou mesmo sem aquele número de evitar que as bainhas se afundem nas poças do chão/agarrar as saias e, ao mesmo tempo, segurar a mala, o casaco (mais o kispo às vezes), os sacos e/ou os papéis que não cabem em mais sítio nenhum, tudo com os 40.º ou 15.º cuspidos pelo ar condicionado e dentro de um cubículo de 1,5 m2 onde não conseguimos entrar sem encostar as pernas à retrete e as costas à parede (aliás, a última parte é a prova irrefutável que os arquitectos dos espaços públicos são, em 98% dos casos, homens - isso ou são umas grandes cabras que não têm de lá ir!);
Não me consigo decidir….
21 outubro 2007
PUBLISH POST
De regresso a casa. Abro o computador e conecto-me à chafarica. A mesma posta desde 6ª feira. Na barra de lado, o nº de postas publicadas no mês de Outubro: 39. Olho para o calendário que me relembra o dia do mês: 21. Com a boa vontade de todas as múltiplas, chegaremos às 50 postas até ao fim do mês. Resultado muito fraquinho, comparado com os meses anteriores de postagem eufórica.
Entro no sitemeter e um dos gráficos não deixa margem para dúvidas. Este blogue precisa de uma manobra qualquer: de cosmética, de reanimação, de ressuscitação.
(aviso à navegação: quem continua a entrar aqui para saber de 'celebridades apanhadas em cuecas' vá a outra freguesia que, so far so good, ainda não temos nada disso. mas podemos vir a ter, nunca se sabe)
Vou à pasta dos drafts e sou tomada por uma ideia maquiavélica:
E se eu publicar todos os rascunhos que lá estão?
(não digam que não avisei)
19 outubro 2007
Direitos contínuos para profissões intermitentes
Sabia que não há enquadramento jurídico que se adeque a estas profissões? Sabia que estes profissionais não podem estar doentes, grávidos, lesionados ou desempregados? Hoje é o nosso dia nacional de sensibilização para a intermitência. Dizemos que somos intermitentes porque o nosso trabalho é sempre descontínuo e temporário.
Essa é a natureza das nossas profissões!
Trabalhamos sucessivamente de projecto em projecto, com pessoas diferentes e isso implica a mobilidade dos profissionais e permite a diversidade das produções. Queremos ter acesso aos mesmos direitos e às condições básicas de qualquer trabalhador por conta de outrem.
Como estes, somos profissionais especializados, cumprimos horários, num local de trabalho específico, sob a direcção duma entidade.
Por todas estas razões, precisamos de uma definição legal de intermitência, que nos permita pagar a segurança social de acordo com o salário que recebemos e que nos proteja de situações de carência. Precisamos de um contrato de trabalho adequado à nossa realidade.
No último ano, representantes das áreas da dança, do teatro, da música, do circo, do cinema e do audiovisual têm vindo a apresentar e a defender propostas concretas sobre esta questão. Esperamos que este esforço resulte numa lei que nos sirva a todos.
Lembrem-se que apagadas as luzes da ribalta existe uma realidade que não pode continuar a ser ignorada.
Muito Obrigada e Bom Espectáculo! "
18 outubro 2007
Ad nauseum
Há dias em que acordo com uma música a martelar-me o juízo (normalmente a pior possível), ouvida sabe-se lá onde, trauteando-a desde que acordo até que me deito.
Outros dias são frases, outros dias são poemas que me perseguem.
Hoje, não me saíu da cabeça este fragmento de um poema de O. Wilde. A ver se o afugento, partilhando a parte que me acompanhou all day long:
By each let this be heard,
Some do it with a bitter look,
Some with a flattering word,
The coward does it with a kiss,
The brave man with a sword!
Some kill their love when they are young,
And some when they are old;
Some strangle with the hands of Lust,
Some with the hands of Gold:
The kindest use a knife, because
The dead so soon grow cold.
Some love too little, some too long,
Some sell, and others buy;
Some do the deed with many tears,
And some without a sigh:
For each man kills the thing he loves,
Yet each man does not die.
The Ballad of the
Laços de família
- Estás esquisita... Aconteceu-te alguma coisa?
- (Esboçando um sorriso, nervosamente rasgado) Chumbei!
- Chumbaste?! Hum... e tem muita graça, teres chumbado!
Felizmente o meu pai, confirmando ser um homem de palavras sábias:
- Então, já sei...uma "raposa".
- Pois...
- Deixa lá, filha. O chumbo não é um metal nobre, mas quase. Para ser prata só lhe falta 1 neutrão, 1 protão e um electrão.
Mais que um pai
Onde é que assino os papéis para a adopção?
Religiões
Um dia destes deixo-me ir, a ver a quanto sai a desobediência ao Bill todo poderoso.
16 outubro 2007
O segredo
É que as mulheres padecem, verdadeiramente, de personalidade múltipla. Tem dias, meses ou mesmo anos em que se é mais disto, outros mais daquilo, mas a fórmula é uma imensa mistura entre sentimentos contrários e por vezes até contraditórios, de paixões, interesses, desejos, deveres, forças e fraquezas. Por isso o nosso universo é complexo, misterioso, insondável, às vezes indecifrável até para as próprias. E por isso é que nunca ninguém pode saber o que vai na cabeça de uma mulher e o Freud era um idiota.
Talvez os homens também sofram deste bem-mal. Alguns, pelo menos. Os bons, aqueles que são completos, preocupados, que se dão por inteiro.
Esta constatação não será, com certeza, uma novidade para o mundo mas foi para mim. Só a percebi quando duas das pessoas que mais amo me contaram um segredo, cada qual o seu. Pensei neles durante muito tempo, interiorizei-os, assumi-os, comparei-os. De maneiras diferentes, sofri com eles e por eles.
Percebi que há coisas que ninguém diz, que ninguém confessa, que são segredo e um segredo não se conta. Afinal, não sou assim tão maluca ou desajustada. Sou apenas uma mulher que, sem segredos para si própria, sabe o que pensa e se atreve a pensar no que sente. Sou uma mulher que gostava de viver sempre a verdade. As outras também são assim. Só que eu não sei o que elas sentem. Só que elas não dizem o que pensam. É que elas também têm segredos e os segredos não se contam. São secretos. E a verdade também é um segredo. Um dia contaram-me um segredo. Salvaram-me da loucura.
15 outubro 2007
Comboios
Hoje voltei do Porto a Lisboa no alfa pendular, cheia de ideias e trabalho a acabar. Abro o computador, começo a corrigir documentos, a encontrar soluções para problemas, a escrever, decidir, quando de repente puf, fica sem bateria, bloqueia-me todos os documentos word abertos e avisa-me da urgência de uma tomada de electricidade.
Tinham-me dito que uma das vantagens dos novos comboios era as fontes de electricidade pelas carruagens, levanto-me e começo a procurar no meu lugar, no chão, no lugar dos vizinhos. Vejo um tipo cheio de gadgets electrónicos e penso que me possa ajudar - diz-me que acha que é só na primeira classe. Não me dou por vencida, pego nas minhas coisas e rumo ao bar, aí de certeza que me vão encontrar solução.
Passo as várias carruagens, balanço-me entre as cadeiras com a mochila do computador e a carteira a tiracolo. O homem do bar tem um ar aborrecido, ofereço-lhe o meu melhor sorriso, pode ser que ajude - mas não. Tomadas só mesmo na primeira classe, se precisar muito há uma ao fim daquela carruagem, ao lado da casa de banho, mas não tem condições para trabalhar. E fumar um cigarro, será que posso? Na última carruagem, diz-me. Ah, naquela direcção? Não menina, responde com ar enfadado, se o comboio vai naquela direcção a última é no sentido oposto. Desolada, em vez de um copinho de vinho branco peço uma garrafa de água e uma barra de chocolate e regresso ao meu lugar.
Olho bem para o papel dos horários da cp e descubro uma coisa espantosa:
Depois do frissom do vácuo, penso nas pessoas de mobilidade limitada. Se eu andar de cadeira de rodas, não posso ir em Conforto?
14 outubro 2007
Milagres
Vem-me à memória o pároco que segui no meu período beato; repetia todos os domingos, na sua homília que durava não menos de 50 minutos, que a televisão era o diabo, fonte de inúmeros pecados e incitador de tudo o que era indigno. Estranhamente exortou os seus fieis a contribuirem para a compra de acções da TVI quando esta apareceu, dizendo que se tivessemos dinheiro suficiente poderíamos eventualmente ter uma voz activa na programação. Era ver a fila de crentes a assinar cheques na sacristia, enquanto devolvia o meu dossier dos cânticos do coro dessa semana.
Eu deixei de ir à Igreja, o meu pároco morreu, mas parece que no Vaticano a insatisfação com a televisão ainda dura.
Francamente, estou-me a marimbar para os pastorinhos e não acredito que tenham visto Maria. No entanto, não posso deixar de ter uma réstia de inveja para com os que acreditam em Deus e numa força maior, que nos pode curar, salvar, redimir e acompanhar. Seria tudo tão mais fácil. E no entanto é-me intrinsecamente impossível.
Além do mais, não consigo entender porque raio a mãe de Deus desceria à terra para falar com 3 putos, subnutridos e aborrecidos nos montes, sobre os perigos dos infiéis europeus e do atentado ao papa, se só se podia dar a conhecer ao mundo os factos depois de eles terem acontecido. Diziam-me sempre que os desígnios do Senhor são insondáveis, e fez assim porque sim. De cada vez que não havia resposta para alguma coisa, e descobri serem várias, a resposta que me era dada era sempre essa, porque sim.
"Não olheis aos nossos pecados mas à fé da vossa igreja" sempre foi a frase que mais me impressionou. Basicamente, hordas de fiéis são exortados a confessar o que de mal fazem e a pedir a respectiva redenção, mas depois tentam lavar as mãos rezando para que o senhor olhe só para a fé e não para os pecados. Olhava à minha volta e não via pessoas a acreditar, via gente que seguia as marcações à risca (senta, levanta, ajoelha, agora diz isto, agora canta aquilo) e a voltarem para casa com a satisfação do dever cumprido. Não podia ir de saias curtas, nem pôr os óculos no alto da cabeça, nem cruzar a perna, nem pensar na lista das compras enquanto estivesse na igreja. Mas se lhe pedia que olhasse à minha fé e não aos meus pecados, parecia-me tudo incongruente.
"A Igreja é feita de homens, e os homens são pecadores. Não olhes para os exemplos terrenos mas sim para o divino", era outra das respostas que me davam às dúvidas. Se os outros, os que andavam por ali há anos tinham aquelas faltas todas, o que me dizia isso dos meus companheiros cristãos?
Depois havia as velhotas, que adoravam passar o dia na igreja, a mudar as flores e a conhecer os cantos à casa, como se fosse a delas. Não gostavam de mim e de uma amiga minha, porque éramos "demasiado bonitas" e alsaricávamos as hormonas aos rapazes - e já se sabe, hormonas alsaricadas, almas perdidas. Éramos quase piores que a televisão, porque estávamos ali.
O tal pároco, conservador, antipático, irracional, bruto e mal educado, gostava de mim. E eu gostava muito dele, por um qualquer desígnio que nenhum de nós entendia. Eu era a única que o punha em causa, que não lhe aceitava os porque sim, ditos com olhar duro e distante, tentando afastar as minhas dúvidas com as suas certezas. Em vez de se irritar comigo gostava de me ter por perto, e incentivava a minha presença assídua nos vários grupos. Por ele, fiquei mais tempo do que durou a minha fé. Apesar dele vim-me embora.
Ia apenas escrever uma graçola sobre o milagre pela televisão, e de repente a igreja veio-me com força aos dedos e à memória. O meu real problema é que queria mesmo acreditar e não consigo. Depois de ler que a Madre Teresa também não conseguiu durante décadas, fica-me a pergunta. O que é ser de Igreja? O que significa ter fé? Não preciso disso para ser uma boa pessoa, nem para ser forte, nem para enfrentar as adversidades. E no entanto sinto a falta de uma coisa que nunca tive.
13 outubro 2007
A Trilogia dos Dragões
Voltei para casa em silêncio, muda, queda, vazia.
Pensei: ‘e agora o que é que eu faço? Posto ou não posto? O que é que eu vou dizer se não me chegam as palavras? Se só tenho dentro de mim imagens e emoções?’ Invadida por aquela mesma sensação quando se acaba um livro extraordinário e se pensa: 'este livro nunca deveria ter acabado, esta última página é um acto de traição'. Uma traição do escritor para com o leitor, que nos deixa, depois, à nossa mercê, abandonados à nossa sorte. Orfãos. Literalmente orfãos.
Hoje, Robert Lepage e a sua companhia Ex-Machina deixaram-me assim: das 16h às 22h (intervalada 3 vezes) assisti àquela que considero A experiência de teatro da minha vida. Trata-se da sua peça seminal, La Trilogie des Dragons. Em cena, pela ÚLTIMA vez, aqui, em Portugal.
No CCB, amanhã, dias 16 e 17 ainda é possível ver este colosso.
Depois não digam que não avisei.
(agora vou digerir o resto)
12 outubro 2007
Hoje gostava de me sentir assim (de novo)
¡ Ay que trabajo me cuesta
quererte como te quiero!
Por tu amor me duele el aire,
el corazón
y el sombrero.
Quien me compraria a mí,
este cintillo que tengo
y esta tristeza de hilo
blanco, para hacer pañuelos?
¡ Ay que trabajo me cuesta
quererte como te quiero!
Federico García Lorca
Hoje sinto-me assim
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mão à força de as apertarmos,
gastámos o relógio
e as pedras das esquinas em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias:
os teus olhos são peixes verdes!
e eu acreditava.
Acreditava, porque ao teu lado todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os meus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar.
Dentro de ti não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus.
Eugénio de Andrade
10 outubro 2007
Qualidade de vida (II)
Os cuidados paliativos, que respondem às necessidades das pessoas com doença prolongada, incurável e progressiva e suas famílias, ainda não estão acessíveis aos milhares de pessoas que deles necessitam em Portugal. Porque são cuidados específicos, rigorosos e científicos, todos os profissionais que prestam cuidados paliativos precisam de formação qualificada.
Dia 6 de Outubro celebra-se o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos e inicia-se a 3ª Semana Nacional dos Cuidados Paliativos.
Apoie a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos - www.apcp.com.pt.
Para tal, clique na imagem, envie a sua mensagem durante a Semana Nacional dos Cuidados Paliativos (6 a 13 de Outubro) e ajude a criar uma onda de 100 mil mensagens.
A sua qualidade de vida agradece-lhe.
A maldição
Ando a cortar os dias num calendário na parede do escritório, já falta pouco e vejo-me livre dos vizinhos, vou deixar de ter relações estreitas com ele, estou feliz, está quase está quase.
Arranjo-me, saio de casa, vou dar a segunda aula do semestre. Aparecem algumas caras novas que devem ter fugido à confusão da primeira semana. Páro a meio de uma frase, perco a linha que estava a seguir, nem quero acreditar. Olho de novo, olho melhor. Tenho a certeza. Uma das minhas alunas é a vizinha do andar de baixo, a que dorme no quarto por baixo do meu.
Devo ter comprado uma maldição qualquer com o contrato de compra e venda.
Madalena
andava eu deambulando por aqui
Integração cultural à luz do apagón
Alguém acuda ao Salão Nobre do Conservatório Nacional
09 outubro 2007
CEE, CE, UE, "??"
Valores da União
A União funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de Direito e do respeito dos direitos do Homem, [por uma questão de estilo, preferia dizer esta coisa mais simples de "Os valores da União são (...)", até porque nunca tenho a certeza se são os valores que fundam alguma coisa ou são os Estados/pessoas que fundam alguma coisa para ajudar a concretizar um valor/valores que até já existia/m],
08 outubro 2007
Solidariedade
hijueputa, malparida, gonorreica y giripollas do raça da vida. (às vezes, claro....)
Irritações
Dos 7 aos 77
(também é um espécie de desabafo)
Parabéns mãezinha!
07 outubro 2007
Palavras sábias do meu Pai
Obrigada por saberes aliviar estes estranhos momentos em que não me reconheço a mim própria.
O teu cheiro
O amor em visita
06 outubro 2007
Passos em Volta
Numa altura em que me faltam as palavras não é má ideia recorrer a quem as usa com mestria e que tão bem conta histórias que,afinal, são nossas.
E porque o som é mau...
Quando o sol chegou
aos subúrbios da cidade
anunciando mais um dia
igual aos outros
ele acordou e pressentiu
que hoje o seu dia ía ser
diferente
sentiu nos lábios o sabor
dum sorriso
finalmente triunfante
escorregou da cama
e contemplou
o espelho sorridente.
Acabou-se a incerteza
dos seus passos em volta
dum sentido que ele nunca
encontrou
pela primeira vez
tinha o destino nas mãos
desta vez ele não duvidou.
Sentiu-se invadir
pela estranha lucidez
que o conduzia pelas calhas
do passado
serenamente descobriu
que afinal tudo tinha o seu
sentido
levou o olhar à janela
lá em baixo
a rua estava abandonada
levantou o fecho
e de repente
alcançou a liberdade.
Acabou-se a angústia
dos seus passos em volta
dum amor com que ele apenas
sonhou
pela primeira vez
tinha o futuro nas mãos
abriu a janela e voou.
Jorge Palma
05 outubro 2007
A torneira
Era uma vez uma rapariga que vivia numa casa muito velha. Uma noite acordou com a torneira a pingar. O barulho foi crescendo crescendo e invadiu-lhe os sonhos e o corpo. Sentia os pingos a correrem-lhe no peito ping, no lavatório ping, no carro encarnado onde viajava com o avô ping, nas pernas ping, no campo de girassóis que se transformavam em girafas ping, nas mãos que agarravam a almofada ping, na senhora velha com uma capeline azul que lhes ofereceu azeitonas ping.
Levantou-se e flutuou pela casa à procura de um sítio onde o ping não ping entrasse nos seus sonhos ping e no seu corpo ping. Pela janela ping viu a árvore grande ping do jardim ping. Ali ping estaria ping a salvo ping.
Levou a almofada consigo e trepou até ao ramo maior. Antes de adormecer reparou numa falha da madeira ao lado da sua mão esquerda. Lá dentro havia qualquer coisa que brilhava, talvez um garfo esquecido ou um diamante escondido, os tesouros guardam-se sempre em sítios improváveis.
Regressou ao campo de girafas que entretanto tomavam chá com o avô, enquanto a senhora de capeline azul regava um jarro com girassóis e sorria muito. A girafa mais alta largou a chávena e pôs-lhe na mão um diamante enorme e transparente. O frio fê-la acordar. Não era um diamante nem um garfo que estava na sua mão esquerda. Era uma torneira que tinha nascido no ramo da árvore onde dormia.
Fado Português
Lembrei-me, então, de Michel Giacometti, nascido na Córsega, o etnomusicólogo que fez o mais notável trabalho de recolha, registo, tratamento e preservação do património musical tradicional português, em estreita colaboração com Fernando Lopes-Graça.
‘Fados', Carlos Saura, 2007.
'Cancioneiro Popular Português', Michel Giacometti, 1981.
Que Fado é (o) nosso?
04 outubro 2007
Fim do dia
03 outubro 2007
Não é notícia mas devia ser
Táime quê?
Propostas para o 10 de Junho - 1
Manuel Acácio, jornalista, 7 anos a deixar falar os portugueses no fórum TSF.
02 outubro 2007
Setembro
E sim, inevitavelmente, em Setembro começavam as aulas. Nos primeiros dias, gostava sempre de passar por uma parede do jardim do meu liceu onde estavam estes versos do Antero de Quental:
“As fadas...eu creio nelas!
Umas são moças e belas,
Outras, velhas de pasmar...
Umas vivem nos rochedos,
Outras, à beira do mar...
(….)
Quantas vezes, já deitado,
Mas sem sono, inda acordado,
Me ponho a considerar,
Que condão eu pediria,
Se uma fada, um belo dia,
Me quisesse a mim fadar... (...)”
01 outubro 2007
Música bonitinha
É por causa deste refrão, que oiço quarenta e três a quarenta e sete vezes por dia, que vou ficar sem capacidade auditiva que permita distinguir a sirene dos bombeiros do toque do meu telemóvel. É tão bonitinho, o refrão.
Previsões
Vou ler o horóscopo da semana, pode ser que me anime:
Ao menos fez-me sorrir.