16 outubro 2007

O segredo

Tinha esboçado um post que começava assim:”Queria ser outra, queria ser uma delas, daquelas que são felizes. Gostava de saber que há dias em que elas se sentem, pelo menos, como eu.” Retomando-o, achei que hoje já não fazia sentido porque todas as mulheres são como eu ou eu sou como todas elas.

É que as mulheres padecem, verdadeiramente, de personalidade múltipla. Tem dias, meses ou mesmo anos em que se é mais disto, outros mais daquilo, mas a fórmula é uma imensa mistura entre sentimentos contrários e por vezes até contraditórios, de paixões, interesses, desejos, deveres, forças e fraquezas. Por isso o nosso universo é complexo, misterioso, insondável, às vezes indecifrável até para as próprias. E por isso é que nunca ninguém pode saber o que vai na cabeça de uma mulher e o Freud era um idiota.

Talvez os homens também sofram deste bem-mal. Alguns, pelo menos. Os bons, aqueles que são completos, preocupados, que se dão por inteiro.

Esta constatação não será, com certeza, uma novidade para o mundo mas foi para mim. Só a percebi quando duas das pessoas que mais amo me contaram um segredo, cada qual o seu. Pensei neles durante muito tempo, interiorizei-os, assumi-os, comparei-os. De maneiras diferentes, sofri com eles e por eles.

Percebi que há coisas que ninguém diz, que ninguém confessa, que são segredo e um segredo não se conta. Afinal, não sou assim tão maluca ou desajustada. Sou apenas uma mulher que, sem segredos para si própria, sabe o que pensa e se atreve a pensar no que sente. Sou uma mulher que gostava de viver sempre a verdade. As outras também são assim. Só que eu não sei o que elas sentem. Só que elas não dizem o que pensam. É que elas também têm segredos e os segredos não se contam. São secretos. E a verdade também é um segredo. Um dia contaram-me um segredo. Salvaram-me da loucura.

11 comentários:

sete e pico disse...

terei sido eu a escrever isto?

aflito co'as mãos nos bolsos disse...

eu também fiquei na dúvida se fui eu...

JPN disse...

tem graça que eu de há uns tempos para cá também tenho aqui descoberto uma voz nova. e essa voz que é nova, que é novidade, que eu desconheço, de uma das poucas múltiplas que não devo conhecer ( e as quais massacrei tanto tempo com tentativas de adivinhação), tem-me operado um saboroso efeito de reconhecimento. é este efeito de relação com algo que desconheço mas me ajuda a reconhecer mundos exteriores ao meu pensamento, que ainda me prende aos blogues. obrigado

-pirata-vermelho- disse...

Forte reflexão, grande lição - os meus cumprimentos, bela múltipla

D. Ester disse...

sete e aflito, eu também estou um pouco confusa...

d. inês sequiosa disse...

Bendita personalidade múltiplica.
Foste tu quem escreveu este belo texto e somos já algumas a pensar que o poderíamos ter feito.

D. Ester disse...

há mulheres que sincronizam mentruações, nós as palavras.

Anónimo disse...

Ñão conhecia este blog, mas adorei. Escreves muito bem, com ideias arejadas - mas complexas...
Assim merece a pena "perder" tempo na NET. Gosto de textos com qualidade. É o teu caso. Vou continuar a vir aqui, se me permites. E, já agora, visita-me tu no Sarrabal.blogs.sapo.pt. Fico à espera!

PS. Se não apareceres, paciência. Não deixarei de vir aqui lá por isso...

Parabéns, beijoca!

8 e coisa 9 e tal disse...

ainda bem que sincronizamos as nossas múltiplas palavras numa personalidade múltipla! (vamos deixar a sincronização de outras coisas só com a lua, ok?)

jpn, se me conhece ou não é segredo... mas obrigada pelo reconhecimento!!

pirata e sol, obrigada e lá irei fazer uma visita.

AJO disse...

Acabo de ler o texto que só porque ainda me lembro do que escrevo tenho a certeza que não fui eu quem o escrevi, apenas pensei no assunto abordado da mesma forma que stá escrito.
Texto perfeito.

Chloé disse...

Sim, precisamos de reconhecer que ser um pouco louco é sinal de sanidade mental...e disso não tenho dúvidas!...ou estarei assim tão louca :-)
Vou voltando para ler...