08 abril 2008

Ainda a brincar

E agora eu era freira e abandonava a vida terrena e as suas pequenas agitações diárias. Largava o despertador e a casa de banho onde reconstruo todas as manhãs em frente ao espelho os cacos que a noite espalhou por mim, largava o trânsito e os programas de rádio sorridentes que me acompanham no caminho para o inferno diário de nove horas de secretária, largava os almoços engolidos num balcão qualquer ou em cantinas feitas de filas de gente como eu, largava os fins de tarde de rotina e de pressa ou de vontade de fingir que sou outra coisa que não isto que aqui está. Agora eu era freira e acordava todas as manhãs para um dia de recolhimento e oração, quando olhasse não via cacos mas uma monja que acorda para mais um instante de eternidade, agora eu era freira e tudo se arrumava dentro de mim em avémarias e paisnossos feitos de fé e da certeza de que tudo está no seu lugar.

3 comentários:

JPN disse...

ainda a sério: estou a gostar do teu escrevrincar...

-pirata-vermelho- disse...

Você não está a brincar.

Se não fosse alienante esse sorriso místico...
até eu me deixava ir no seu olhar.

-pirata-vermelho- disse...

E
se não fosse brutal o seu descrever o típico...
até eu sonhava com uma vida normal.