10 abril 2008

Gloria

Saiu do seu país rumo a Benidorm, na esperança de um futuro melhor que se via difícil na terra que a viu nascer e onde a pobreza atinge a 2/3 da população. Queria conseguir um trabalho que lhe desse dignidade. Ao chegar foi assediada por todas as mafias que a queriam levar para a prostituição ou para ser “mula”, pois era branquinha e com olhos azuis, o que evita suspeitas numa colombiana. Começaram a ameaçá-la, a investigar sobre a sua família para a pressionar e só a deixaram em paz quando conseguiu um namorado, pois uma mulher que tem homem é outra coisa. Conseguiu trabalho como vendedora mas sempre em “negro”, sem direito a nada, trabalhava e aumentava a riqueza do país que a recebeu mas este só lhe dava um magro salário que mal lhe dava para pagar a casa que dividia com mais 4 famílias.
Disse para si mesma, como quem pela palavra faz realidade um sonho, em Barcelona vou conseguir! Chegou, calcorreou todas as ruas e deixou o seu cv em cada tenda com um anuncio Precisa-se Vendedora. Aos poucos dias foi chamada, aqui vamos dar-lhe um trabalho com tudo aquilo a que tem direito, vamos fazer-lhe um contrato. Trabalhava 11 horas por dia numa tenda de frutas, tinha que carregar os pesados caixotes das frutas, atender o público e marcar na caixa registadora os códigos numa língua desconhecida para si, fazer a limpeza da loja e tudo sobre as ordens da pessoa encarregada que dizia, mais rápido, isso não é assim, aqui só se faz como eu digo e mais nada. Ao quinto dia começou a sentir-se mal, sentiu a hérnia inflamada, queixou-se à colega de trabalho que só lhe deu como resposta, eu nunca fiquei doente, nunca pedi uma baixa, nunca. A febre aumentava. Foi ao centro de saúde, disse à médica que estava doente e que amanhã tinha que ir trabalhar, a médica receitou-lhe paracetamol mandou-a para casa e resmungou, eu também me sinto mal e amanhã também tenho que vir trabalhar. No dia seguinte ardia em febre, avisou que ia faltar ao trabalho nesse dia e foi ao hospital, diagnosticaram-lhe a hérnia inflamada, receitaram mais paracetamol e disseram-lhe para não fazer esforços. Nessa mesma tarde, recebeu em casa um telegrama da loja de frutas a dizer que estava despedida.
Gloria não perdeu o seu sorriso nem o brilho do seus olhos azuis. Continua a calcorrear as ruas, a deixar o seu cv em cada loja que apresenta uma promessa de trabalho, confia na sua boa estrela que diz sempre a ter ajudado em todas as dificuldades da vida. E sonha, um dia vou montar a minha própria loja e vou mostrar a toda a gente como se pode vender muito tratando bem a quem para nós trabalha.

4 comentários:

zamot disse...

Com este título, prevía um final glorioso, mas, no fim, de Glória só o nome e a esperança.

dizia ela baixinho disse...

Muita Glória para a Glória.

8 e coisa 9 e tal disse...

Zamotainav, apesar de tudo aquilo porque tem passado esta Gloria (sem acento porque é um nome espanhol/colombiano) está cheia de glória na vida, consegue ultrapassar tudo sem rancor e sem querer fazer a outros o que lhe têm feito a ela, acreditando que se pode fazer diferente e de uma forma mais justa. Existirá maior glória que esta?

zamot disse...

Claro que não, apoiado! sei que há muitas Glórias e ainda bem que leio desta. Há gente que mereceria toda a glória e que é um enorme exemplo de coragem.
O meu comentário foi mais sobre o título e a construção do texto. Ao ler, previa um final mais glorioso, à la Holywood.