15 janeiro 2007

Actualizações


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Eu ando invulgarmente silenciosa. Quem me conhece, sabe que eu alterno entre estados de frenética comunicação (e postagem) e o mais puro dos silêncios. Sou assim, nada a fazer. Adiante, que isto de interesse nada tem.


Hoje acordei cinzenta como o dia que se pôs. Decidi dedicar o dia - numa tentativa de combate ao spleen dominical - a pôr em dia a minha agenda de telefones e respectivos contactos. Como base, tinha duas agendas: uma relativamente recente mas incompleta, outra mais completa e com moradas, mas com já mais de 5 anos. Iniciei, então, a tarefa maçadora de actualização de contactos. Para quem tinha acordado cinzenta, saiu-me pior a emenda que o soneto: descobri que teria que riscar muitos contactos por motivos de ordem vária. O que mais me chocou foi ver a quantidade de pessoas que desapareceram (morreram) neste intervalo temporal. Passei uma tarde inteira a viajar nas memórias daqueles que me/nos deixaram e que fizeram - num ou noutro momento - parte da minha vida.


Fiquei obviamente mal (triste, para ser mais precisa). Riscá-las de vez do mapa da minha existência - da minha agenda, quero eu dizer - era a assunção pura e dura do seu desparecimento, assemelhava-se quase a uma traição. Elas continuam a existir todas dentro de mim. Porquê riscá-las? É certo que não estão à distância de um telefone, de um olhar, de uma mão. Mas continuam cá dentro, tão vivas como um amigo que não vejo há mais de 10 anos e cujo contacto decidi manter na nova agenda.


Não caminhamos para novos. E mais: caminhamos em linha recta para a morte. Porque nos esquecemos disto diariamente? Talvez sofressemos menos se vivessemos a morte de outra forma. Raio de cultura, esta. Venham de lá os antropólogos de serviço explicar como outros a vivem de forma mais 'sã' (será?). Ainda por cima tenho o grande handicap de não acreditar em vida(s) para além desta que vivemos, nem sequer em entidades divinas. Amanho-me como posso na minha dor e nas minhas crenças - sem intermediação, num processo que é de mim para mim - e é tudo o que tenho para dizer a este respeito.
A todos os que já partiram. É bem real a falta que me fazem e isso é impossível de riscar.

6 comentários:

D. Ester disse...

Lembro-me de ser muito pequena e do meu avô me dizer para escolher que objecto da sala de jantar queria eu herdar quando ele morresse. A minha resposta repetida várias vezes foi "só quero que o avô não morra". Ele ficou um bocado lisonjeado, mas o seu lado pragmático fez com que me respondesse "mas isso não vai acontecer, um dia eu vou morrer. Por isso quero que escolhas o que mais gostas agora, porque depois eu não vou cá estar para to dar"

Não há dia nenhum que não pense nele. Faz-me uma falta do caraças.

Mas eu sei que a morte faz parte da vida, e a única maneira de viver isso de forma sã é aceitar a sua inevitabilidade. Chorar na dor, sentir a saudade, lembrá-los sempre, em pensamento e palavras.

E não sou antropóloga, cruzes canhoto.

Ruiva disse...

Nestas alturas, lembro-me sempre de uma professora da faculdade que nos dizia bastas vezes: "- na Idade Média nem um cão morria sozinho!". Penso muitas vezes nisto...

Anónimo disse...

Eu não consigo tirar o número do meu Pai do telemóvel. Já tentei e não consigo. Vou tirar o meu Pai só porque ele já não atende do outro lado? E se ele está apenas numa zona sem rede? É melhor não arriscar e mantê-lo lá.

Anónimo disse...

Dizem que para os ateus a vida é mais difícil.
Para mim não tem sido. Mas tenho muitas saudades de algumas pessoas que já partiram.

o chofer a dançar com a criada disse...

agora comoveste-me manyfaces. pois, é isso mesmo.

sem-se-ver disse...

um beijo, manyfaces