30 outubro 2006

Gostava de ser islandesa

Uma amiga escreveu um mail a manifestar-se contra a nova lei que permite caça às baleias na Islândia, e não só teve uma pronta resposta do embaixador como uma enorme explicação sobre a política de pescas, conservação do ambiente e links uteis para melhor perceber a situação e seu enquadramento geo-político. Podem lê-lo aqui.

À janela

Os velhotes a andar na rua parecem carrinhos de supermercado. Quando já estão trôpegos inclinam sempre para o mesmo lado.

Dicionário

- Sabe o que quer dizer perro?
- Sim, quer dizer cão em espanhol.
- Não, é também português. E mento, sabe o que é?
- Não.
- É queixo em português. E aljube?
- Também não sei.
- Aljube é prisão em português.
- E esculápio, sabe o quer dizer? Esculápio é médico.

Fernando é um homem cigano de quarenta anos. Vive num acampamento na zona centro do país, numa pobreza difícil de imaginar. No meio dos cobertores e da lama, Fernando devora palavras escritas. Ofereceram-lhe um dicionário de bolso. Uma semana mais tarde, Fernando pediu um dicionário mais completo. Um que tivesse mais palavras.

Requiem para um animal

Até ontem tinha um gato. O bicho era chato, estúpido, mimado, mas eu gostava dele. Tinha 18 anos e no ultimo mês começou a decair: glaucomas, problemas nos rins, deixou de comer e passava os dias a dormitar e a tropecar nos móveis, numa fragilidade desoladora.
Demorei muito tempo a tomar a decisão da eutanásia, pensei que ele se estivesse a deixar ir e quisesse ficar em casa até ao fim e queria respeitar a sua vontade. Depois percebi que estava a projectar nele o meu avô e achei que era mais altruista fazê-lo que deixá-lo morrer aos bocadinhos, numa degradação de leproso interno.
Quando cheguei ao consultório comecei logo a chorar quando a veterinária me disse olá. Ela quis-me dar alternativas mas eu sabia que não havia. Peguei nele ao colo enquanto lhe davam a anestesia, fiquei a dar-lhe festinhas e a falar com ele enquanto adormecia embalado pelos fármacos, ao som das minhas declarações de amor, debaixo do aguaceiro gordo que me escorria pela cara.
Deram-lhe a dose forte e ele parou de respirar nos meus braços. Fiquei agarrada a ele muito tempo, continuava a falar-lhe e a fazer festas quando a médica me disse para o deixar ir; quando pegou nele disse-lhe para ter cuidado com a cabeça para não o magoar. Ela foi muito atenciosa e levou-o como se ainda estivesse só a dormir.
A casa ficou vazia de repente. Já não me zango com ele por estar sempre atrás de mim, não me vem buscar à porta quando chego, não o encontro à minha espera no tapete da casa de banho quando saio do duche. Mas de vez em quando parece que o oiço saltar do sofá para vir ter comigo.

Uma flor

Fui ver o "Dália negra" - achei uma bela porcaria, desde o argumento à direcção de actores. Safou-se o actor principal que é uma obra de arte da natureza e ainda para mais tem talento. Thank heavens for little boys.

28 outubro 2006

Infantilidades

Estávamos a jantar num restaurante cheio de gente - eu, a minha irmã, o meu cunhado e o meu sobrinho de 3 anos. De repente o miúdo ficou com uma cara muito triste, perguntámos-lhe o que se passava. "Não quero estar sozinho" "Mas estamos aqui todos contigo, tu não estás sozinho" "Vocês também estão sozinhos, estamos todos sozinhos".

can´t remember the words



27 outubro 2006

O penico também é arte

Haciendo una breve historia diremos que el orinal ha ido variando con los tiempos, pues en la antigüedad fue oblongo, más tarde escafoide (tipo barca), pero terminó siendo redondo. Es una pieza que se ha utilizado durante milenios, ya que se tienen noticias desde la Sesóstris de los egipcios en la XIX dinastía y también en los hombres de Xian, en China y en la misma dinastía, o sea 1.950 años A.C. y que ha desaparecido por completo debido al progreso, estando relegados al uso de los hospitales y enfermos encamados, pero hechos de ese material que lo inunda todo, llamado plástico. Los griegos lo llamaron "amigo" y los romanos "matula" o "metella" y formaba parte del mobiliario siendo generalmente de bronce. Petronio y Juvenal dan noticia de ello y San Clemente, en el siglo I D.C. clamó contra los "refinados", que los utilazaban de plata. El emperador Heliogábalo superó a todos en el lujo, se sentaba entre flores frescas de su jardín y con vasija de oro puro. Las letrinas en Roma se usan a partir del siglo III con Diocleciano. Más tarde en los castillos y monasterios se disponían en los recodos de las escaleras, con un canal que caía al foso. Carlos V de Francia, advierte en París en 1374, "que las casas tienen que tener suficientes letrinas". En el siglo XVII, se fabrican de gres y porcelana a gran escala y en el XVIII en todos los materiales.

Hay muchas cosas que se podrían comentar sobre esta parte de la historia, y que los escritores de todos los tiempos, casi nunca nos han hablado de ella, pero que ha existido y ahí está. El primer inodoro con agua corriente, lo inventa Sir John Harrington en 1.596 para su prima la reina Elizabeth I de Inglaterra, pero que no llegó a prosperar. Luis XIV el Rey Sol, que gobernó Francia entre 1643 y 1715, tenia en palacio dos "limpiadores oficiales", puesto muy bien remunerado. Sobre 1.700 el sitio ideal para los orinales era el comedor, escondidos en aparadores, sillas y sillones. En 1.775 Alexander Cummings inventa la válvula para el inodoro El primer inodoro con agua corriente casi perfecto aparece en 1.850 y el primer papel higiénico en 1.857, vendiéndose detrás de los mostradores y en cajas planas, el rollo aparece en 1.928 y el papel blando en 1.932 que no fue muy bien aceptado, y só1o en 1,957 el papel de color.

Estamos en el momento justo de enseñarlos, pues todos nuestro mayores los han utilizado hasta hace poco tiempo y la juventud, juntamente con ellos, podría ver estas joyas que estuvieron en casi todas las casas del mundo y como siempre, todo dependía del poder adquisitivo de cada uno. Primorosos artesanos mundiales plasmaron todo su saber y pericia para realizar estas joyas siendo algunos de ellos verdaderas obras de arte.


Para quem quiser meter-se à estrada este fim de semana, encontra-se na Diocesis de Ciudad Rodrigo, Espanha, uma exposição de mais de 1000 orinóis de 27 países, propriedade de um senhor chamado Pesetos que dedicou grande parte da sua vida a colecionar estes objectos.

Património cultural do Iraque

A propósito do "caso das bibliotecas trocadas", encontrei um relato muito interessante sobre o ataque de 2003 ao Iraque e ao seu património cultural. Ler aqui.

Palavras para quê...Tiny "Closer"

25 outubro 2006

Serviço informativo

"Não façam só alguma coisa, fiquem parados", é o titulo de um texto de Rui Tavares, do blog Pobre e Mal Agradecido, e apresenta uma visão interessante da nossa forma colectiva, enquanto "portugueses/as", de pensarmos as mudanças e as consolidações das nossas estruturas sociais e democráticas. Recomenda-se.

24 outubro 2006

A guerra do Iraque em (des)construção


Para além das mortes e destruição de vidas e bens (alguns destes património da humanidade, como a biblioteca nacional de Bagdad) que provoca a guerra do Iraque, há também quem aproveite e transforme a morte em ouro.

As 10 empresas que mais lucraram com esta guerra têm vindo a ser desmascaradas, muito vezes graças a iniciativas individuais ou da sociedade civil organizada estado-unidense.

A ler em inglês ou português.

Delirium menstrualis

No estertor do meu sofrimento mensal, enquanto esperava a salvação pelo efeito do paracetamol, descobri que as dores menstruais são uma prova da existência de Deus: se Ele não existisse e Eva não tivesse cometido o pecado original, não existiria nenhuma razão que justificasse a tão desigual distribuição do padecimento entre os sexos. Eva existiu e fez asneira da grossa; Deus, enquanto firme educador, aplicou o castigo necessário. Infelizmente, a percepção divina e humana do tempo são incomparáveis, e o castigo de Eva estendeu-se por inúmeras gerações até chegar a este corpo que todos os meses tropeça e lateja de dor.
Mesmo assim, fiquei aliviada com a escolha da maçã. Acaso o castigo divino fosse proporcional ao peso do fruto proibido, estávamos bem tramadas se a Eva tivesse sido tentada por uma melancia.

Existencialismo

Consegui ganhar a luta aos bichos de prata, que afinal eram baratas alemãs. Depois de ter engrossado os cofres de várias marcas de insecticida, comprando casinhas com veneno, sprays, espumas e ventiladores, chamei uma empresa de desinfestacção à séria e deram cabo do assunto. Durante 1 semana encontrei cadáveres espalhados pela cozinha, de barriga para o ar, que fariam seguramente a apoplexia do budista mais convicto, mas que a mim me deram apenas a satisfação de mais um drama resolvido.
No entanto, a dita operação teve um efeito colateral estranho. As moscas que conseguem entrar cá em casa deixaram de voar e correm alegres pelo chão e nas paredes. Será a prova definitiva da reencarnação?

Dos animais

De vez em quando, divirto-me a ver o que traz as pessoas ao 8 e coisa 9 e tal. Hoje descobri duas entradas singulares: "aves ratitas e catitas" e "direitos dos animais é risível". Não acredito que tenham saído daqui muito esclarecidos .

Palavras sábias muito utilizadas pelo meu amigo Luisca

Este mundo es tan duro y nosotros tan blanditos...

23 outubro 2006

Lar, doce lar

A criança berra desesperadamente, como se o mundo inteiro a estivesse a engolir. Corre de um pai para outro e cada um destes só pode fazer aquilo que lhe sai, acreditando ser o melhor, já seja mantendo-se firme nos limites ou afrouxando-os. A criança acordou mal disposta da sesta, está doente, está em casa há uma semana, quer mimos, quer colo quer o mundo centrado nela, agora, JÁÁÁ!

Os pais sentem que passam a vida centrados na criança, na casa, na vida doméstica. A criança continua a berrar, passando de uns motivos para outros, sucessivamente, todos e quaisquer motivos. A mãe tenta escrever no computador e não ceder às birras da criança, não lhe dando atenção enquanto ela estiver a gritar; o pai quer ver se a criança fica mais bem disposta e deixa de lavar a louça na cozinha e põe-se a fazer de macaco, salta para cima dos móveis. A criança adorou a ideia, salta também para cima do móvel, a mãe por um lado acha graça, por outro imagina a criança já caída na chão, com a boca a deitar sangue ou com um horrível galo na testa, a chorar desalmadamente . A mãe desespera da vida doméstica, apetece-lhe outra vez ser livre, livre, solteira, sem filhos, dançar como se não houvesse amanhã e uma criança que acorda enérgica ainda antes do galo.
A mãe suspira, volta à realidade, volta para o computador, clika de novo o oito e coisa antes de recomeçar o trabalho que inúmeras vezes já interrompeu.

Dias

Há dias maus. Dias em que me anda a martelar na cabeça o "quero desnascer, ir-me embora, sem ter que me ir embora" do FMI. Só essa frase, em repeat. Quero desnascer, quero-me ir embora, sem ter que me ir embora. Acordo com ela e persegue-me o dia todo. Ir-me embora, mas sem ter que me ir embora. Desnascer. Não estar com ninguém, que ninguém se atreva a lembrar-me da minha existência. Fingir que me fui embora.
Depois há os dias bons. Em que estou com os outros, que se deixam enganar pelo meu sorriso infantil e nem sonham que eu quero desnascer. Ir-me embora sem ter que me ir embora. Porquê mãe?

A boa educação

Fui educada em cânones seguramente em desuso.
O respeito pelos mais velhos, que se traduzia em levantar para os cumprimentar, deixar lugar para sentar, ser servido depois deles à mesa, esperar a minha vez para falar.
Os lugares para grávidas, deficientes e portadores de crianças de colo eram deixados livres para essas pessoas, e mesmo assim estando sentado noutro lugar prontamente se deixava o sítio mais cómodo, num sentido de civismo profundo de aumentar (ou pelo menos não diminuir) a qualidade de vida dos outros.
Também os sinais de cavalheirismo eram observados, não vendo nisso qualquer sinal de machismo mas sim de simpatia. Cada menina ou senhora era tratada como uma princesa: deixava-se passar à frente, abria-se primeiro a porta do carro, ajudava-se a pôr o casaco, levantar quando uma senhora entra e não se senta enquanto houver uma de pé, não começar a comer enquanto toda a gente não for servida.
A dona de uma casa ao receber convidados não fechava os seus talheres enquanto houvesse mais alguém a comer, para que todos pudessem comer ao seu ritmo sem serem pressionados. E evidentemente não se levantava qualquer prato enquanto alguém ainda estivesse no seu repasto.
Hoje sinto-me como se fosse o Buck Rogers, e tivesse aterrado de repente vinda de um passado longínquo. Quase ninguém segue ou parece conhecer as regras que me foram incutidas desde criança, tratam-me como se eu fosse um bicho raro quando não começo logo a comer mal tenho comida no prato e pensam que eu quero comer mais se não fecho os meus talheres. Acham que eu sou uma tansa por deixar o melhor lugar aos mais velhos ou às grávidas, porque a regra parece ser a do salve-se quem puder. E os empregados de mesa odeiam-me porque não os deixo despachar serviço enquanto há gente a comer na minha mesa.
Não tenciono abdicar da minha educação, incutida com tanto suor pela minha mãe. Tenho dificuldade em entender o mecanismo das pessoas que não fazem o mesmo aos seus filhos - o respeito pelos outros é tão importante como reciclar vidro o papel, mas estes é que estão na moda. Vá-se lá perceber porquê.

22 outubro 2006

Broadcasting life

imagem aqui
Onda Curta, com a emissão de hoje espero que alcances e conquistes a tua plateia.
Arrasa aí com a tua frequência!

Timing

Vieram profetas
vieram Doutores
santos milagreiros, poetas, cantores
cada qual com um discurso diferente
p'ra curar a vida da gente
e a gente parada
fez orelhas moucas
que com falas dessas
as esperanças são poucas
mas quando o Barnabé cá chegou
toda a gente arribou.
Que é que tem o Barnabé que é diferente dos outros?

21 outubro 2006

Hoje o galo cocoricou



Lembro-me de ver a minha avó Lucinda sempre com uma agulha de crochet nas mãos, bordou até que a artrite lhe disse que era altura de deixar. A prenda de boas vindas ao mundo para cada um dos netos e netas foi um lindo e completo enxoval com colchas, toalhas de mesa, lençóis, sacos de pão, guardanapos, naperons, tudo bordado por ela. Contava-nos que uma vez estava ela aflita a bordar com certo frenesim numa sala de espera de um consultório médico e um senhor pergunta-lhe:
- Está a bordar uma toalha?
- É para o enxoval da minha neta.
- Vai casar em breve?
- Não, está prestes a nascer.

Sempre gostei de ir a casa da minha avó, ela gostava de flores, em especial amores-perfeitos e de combinar cor de laranja roxo e verde nas almofadas e nos seus vestidos. Tinha a lágrima fácil e também o riso lhe saía com ligeireza. Lembro-me de uma vez que deslizou num tapete, deu com o rabo no chão e ficou a chorar de riso durante meia hora. A minha avó gostava de animais, de gatos, de coelhos, de galos e galinhas, do cão da sua vizinha (tinha sempre um biscoito para ele guardado no bolso do avental). As galinhas e os coelhos eram criados para se transformarem em banquetes deliciosos. Era ela quem os matava, arranjava e cozinhava, mas como quando o fazia ficava sempre abalada e a chorar, só os podíamos comer no dia seguinte. Todas as semanas tinha uma taça de cristal cheia com sortidos, uns biscoitos com forma de Ss e 8s que ela fazia. Tinha também uma maneira especial de fritar o ovo estrelado para que ficasse com uma pelezinha por cima de um cor de rosa como não vi em mais parte nenhuma e de espalhar a manteiga nas torradas de papo seco, que foram as melhores torradas de toda a minha vida.

Já passaram muitos anos desde a sua morte, mas ainda às vezes volto a casa da minha avó, adormeço lá, e ouço o galo Tedyboy a despertar-me quando chega a madrugada.

19 outubro 2006

Yin Yang




Para a minha querida amiga que hoje não quer ser mulher...

Hoje apetecia-me não ser mulher

homem

não tenho inveja da maternidade
nem da lactação
não tenho inveja da adiposidade
nem da menstruação

só tenho inveja da longevidade
e dos orgasmos múltiplos
e dos orgasmos múltiplos
e dos orgasmos múltiplos
e dos orgasmos múltiplos
eu sou homem
pele solta sobre o músculo
eu sou homem
pêlo grosso no nariz

(...)


Caetano Veloso

Sabedoria popular remix

Equídeo objecto de dádiva, não é passível de observação odontológica.

(A cavalo dado não se olha o dente)

Hoje

Busque Amor novas artes, novo engenho,
Para matar-me, e novas esquivanças;
Que não pode tirar-me as esperanças,
Que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
Andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
Onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê;

Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei porquê.

Camões (pois claro)

18 outubro 2006

Tapa na Pantera (a pedido de várias famílias)

Para ti

Queria lembrar-me de ti e começo pelas tuas mãos, pelo tamanho, pela cor, pelo peso da tua mão quando me tocava. Às vezes ando na rua e descubro-te onde não estás, onde não podes estar, o mesmo andar decidido e leve, uma cor de cabelo ao longe, o som dos passos. Outras vezes caminho e sinto que me dás a mão e tudo está bem outra vez, já não estou sozinha, vais finalmente conhecer tudo o que se passou em mim entretanto, como se não se tivessem passado todos estes anos.

Mas nada pode acontecer, porque houve o dia em que morreste.

Há dias apareceste-me à noite. Estavas feliz, sabias que tinhas estado morta durante anos, ias montar uma casa para viver. Eu disse-te a falta que me fazes, as saudades tantas que tenho. Tu abraçaste-me. E eu acordei com a sensação de que alguma coisa deixou de estar partida.

TOQUE-ME

Serei a única pessoa que se lembra da Samantha Fox de cada vez que compra bilhetes nas máquinas automáticas do Metro?

17 outubro 2006

Every time we say goodbye I die a little...


foto cedida por Câmara Clara

Ficariam indiferentes ao apelo do Boboleta? Eu não!

One more for the road

Ao passar pelo jardineiro da Câmara no seu merecido descanso, sinto o olhar fixo seguido da verbalização "bonita e com charme".
Viver e trabalhar num bairro de reformados faz milagres à auto-estima.

Aromaterapia

Ter uma planta de cannabis no quarto.

Breves do Mundo Animal


Ontem fui visitar O Monte Selvagem, uma reserva animal no Lavre, Alentejo, um programa fantástico para quem tem criancinhas que adoram animais e para quem não gosta de ver os animais em jaulas.
As avestruzes chamaram-me particularmente a atenção, pois adoro encontrar na natureza exemplos que contrariem a ideia generalizada de que a reprodução é tarefa exclusiva das fêmeas, e nos meus parcos conhecimentos de biologia ainda só tinha na minha lista o cavalo marinho. Aprendi então que as avestruzes apesar de serem aves não voam, sendo por isso chamadas ratitas, podem correr a velocidades de 60 km por hora, têm cérebros pequeninos e grande longevidade. E que nem todas as que parecem ser o são, pois existem Avestruzes, Emas e Nandus, aparentemente semelhantes mas diferentes na sua origem, morfologia e modos de reprodução.

As Avestruzes, originárias de África, são animais gregários e no grupo distingue-se um macho e uma fêmea dominante que cuidam os ovos das várias fêmeas. A nidificação, que dura entre 35 e 45 dias, é feita de maneira repartida; a fêmea, que tem a penugem castanha choca os ovos durante o dia e o macho, de penugem preta, durante a noite, pois assim ambos se camuflam protegendo melhor a descendência. Quando nascem os filhotes (entre 15 a 60 por grupo), são cuidados por ambos, sendo o macho particularmente agressivo com quem se arriscar a penetrar no seu território (quando virem uma avestruz com as patas com uma risca vermelho vivo, o melhor é sair de perto bem depressa, pois esta ave com duas garras tem como arma principal o pontapé e força para matar uma pessoa).

As Emas vêm da Austrália, são animais em geral solitários, e aqui é o macho que choca os 5 a 25 ovos das várias fêmeas que copulou (linda palavra). Durante os cerca de 55 dias da gestação não come, não bebe, não urina, não defeca, não nada, e quando nascem os filhos é ele quem os acompanha. O mesmo se passa com o Nandu, originário da América do Sul. Os machos que em geral vivem solitários, quando chega a época da reprodução cortejam várias fêmeas e sozinhos cuidam os 10 a 60 ovos postos por elas, constróem o ninho, incubam os ovos e acompanham os pequenotes nos seus primeiros passos.

Como diziam os grandes Irmãos Catitas, “a natureza é uma beleza e as criaturas são todas puras”.

16 outubro 2006

Palavras sábias do meu irmão

E não vamos para novos

Resposta ao post "Porque não?"

Verdade ou consequência

Na contra capa de uma revista que me chega semanalmente à caixa do correio vem um anuncio aos relógios Patek Philippe. Como eu não tenho nenhum, presumo que sou uma potencial compradora. Será que isto quer dizer que sou mais rica do que suponho ou que assino as revistas erradas?

Janela para o Iraque

Foto Kael Alford

Foto Ghaith Abdul-Ahad

Foto Rita Leistner


Unembedded: Four Independent Photojournalists on the War on Iraq é o título de um projecto que juntou quatro fotográfos e dois cineastas num trabalho feito muito para além das linhas de segurança no Iraque.


We crossed the lines because we believe it is more important to humanize a conflict than it is to trade in rhetorical truths, or to reinforce easy notions of enemy and friend, which are mere propaganda. Instead, we wanted to document honestly what we witnessed in the war because this is the sole duty of journalists, regardless of their nationality and religion. We were able to do this precisely because we did not carry weapons or claim allegiance to one of the warring parties.

Unembedded está disponível em livro e sob a forma de exposição. Será que algum dia chegará a Portugal?

13 outubro 2006

Cavalo de Tróia

Vi-o da ameia mais alta. Achei que era demasiado bonito, e por isso tentei ignorar - quem é que o havia de ter deixado ali mesmo à mão de semear? Uma escultura assim tão especial havia de ter dono, não podia ser para mim.
Fiz de tudo para não olhar, porque sabia que ia querer ficar com ele. Mas continuava ali, em frente à muralha.
Um dia passei o portão e fui ver melhor. De perto era ainda mais bonito. Pensei que se olhar só mais um bocadinho não faz mal. Olhei de lado, de frente e de trás e voltei para dentro.
No dia seguinte espreitei lá para fora e ainda lá estava. Se calhar o dono já não o quer, se calhar é mesmo para mim. Se calhar posso trazê-lo para dentro, afinal está aqui mesmo à minha porta. Deve ser o destino, um presente dos deuses.
Não há de ser perigoso, afinal tenho muralhas altas e sólidas, se alguém o vier reclamar tenho modo de me proteger, pensei.
Não sei como foi possível que me esquecesse que os maiores perigos vêem de dentro.

12 outubro 2006

Da nossa janela

Recebeu aquela cartinha do marido no dia em que fez 80 anos. Dizia assim :

Já somos velhinhos mas ainda me lembro quando me dizias adeus da tua antiga janela e me fazias pensar..mas não tive que pensar muito e agora que já estamos casados há 60 anos ainda gosto muito quando me ficas a dizer adeus da nossa janela.

Ele esquecera-se de assinar por isso ela escreveu no cabeçalho da carta : Diz o rapaz dos olhos grandes e meigos...

E a guerra aqui tão perto

Se tivesse sido Portugal o país invadido, muitos dos nossos filhos, amigos, irmãos, companheiros ou colegas poderiam estar agora a engrossar estas estatísticas.

11 outubro 2006

O homem do sandman

Quando era pequena as viagens de carro eram intermináveis. Primeiro porque os meus pais tinham um mini e depois porque as estradas eram uma desgraça. Ir de Lisboa a Sintra demorava 1h, até Albufeira umas 4h.

Mal passávamos a ponte 25 de Abril eu e a minha irmã dizíamos a primeira de muitas repetições "falta muito?". Os meus pais lá nos iam pondo a cantar, a fazer o concurso das matrículas, a jogar ao sisudo uma com a outra. Mas sabíamos que quando vissemos o homem do sandman no alto da serra era porque estávamos mesmo a chegar, seguido do painel de azulejos da schweppes com a chaminé algarvia.

Acho que é por isso que gosto tanto daquela imagem do homem grande de capa preta a quem não se vê a cara. Quer dizer que estamos mesmo mesmo a chegar, seja lá onde for.

contando contos, ponto por ponto...

"Anda, vem-me, sê cabra cabrês, salta-me em cima e faz-me em três; trepa, joão, o meu pé-de-feijão; chega-te à janela, queres casar comigo? e eu mergulho contigo no caldeirão. Lambo-te as botas, gato emproado, amo-te para onde quer que me leves: eu, bela curiosa, formosa e segura, no castelo do monstro, no chão da casa feita de massapão, no emaranho do bosque, ou pelos céus de Londres a caminho do nunca (e não digas que não queres, que se te cresce o nariz). Escondo-me o cio por detrás do capuz e finjo ignorar-te, lobo esfaimado, ao cruzar a floresta, ao cruzar-me contigo..."

Mais em Um amor atrevido

09 outubro 2006

De mim para mim

Querida múltipla, não posso estar de acordo contigo, eu sou uma institucionalista nata. Acredito que é bom que existam comissões de defesa de direitos sejam eles das mulheres, dos homens ou dos animais abandonados; acredito que o Estado tem (e deve ter) um poder regulador da sociedade e além disso, acredito também no nosso poder enquanto consumidores/as. Para mim, o nosso maior papel enquanto cidadãs/ãos é fazer com que as instâncias políticas públicas e privadas funcionem como devem e enquanto consumidores talvez seja travar os abusos das empresas económicas. E com isso não excluo o poder individual que cada uma e cada um de nós tem para mudar, ou para contribuir para a mudança do mundo e das mentalidades. Mas esse poder individual não tem necessariamente que se circunscrever aos grupos da família, amigos, etc, também necessita passar para o Estado, para as empresas.

Os hipermercados aproveitam-se de uma série de preconceitos existentes e reproduzem-nos, muitas vezes contra os consumidores e contra si próprios. Ninguém retira benefícios das desigualdades existentes entre homens e mulheres. Por que não hão os homens poder usar a esfregona e o balde e usarem cabelos compridos e gostarem de dançar e de se arranjar e de não ser violentos? E por que é que as mulheres têm de assumir perante a sociedade o cuidado dos filhos/as e da casa e trabalhar fora de casa com sentimento de culpa?

Provavelmente a directora da campanha, ou o director, ou mesmo toda a equipa não se aperceberam da importância que tem para a nossa sociedade continuar a reproduzir estereótipos(ou idealtipos) que já não nos servem e que não queremos, pois não contribuem para a nossa felicidade (seja lá esta aquilo que for). Não me custa acreditar que as pessoas da campanha do Feira Nova, achem que sempre foi assim e que assim é que está bem, esta questão de repensar as nossas formas de ser homens e ser mulheres é um processo que leva muito tempo e não é preto no branco, mexe com muitas coisas estruturais em nós. Por isso tanto mulheres como homens terminamos reproduzindo aquilo que não queremos, tanto por acção como por omissão. (os homens também têm um papel na educação dos filhos, já seja activo ou ausente)

De qualquer forma, às vezes apetece-me gritar O REI VAI NU, pois de facto vai!

com os melhores cumprimentos

Festival T 99 no estádio Nacional num verão qualquer que já passou. Os Black Crowes, banda Norte-americana, rock revivalista dos anos 70 entra em palco abrindo a noite para os Aerosmith que são os cabeça de cartaz. Toda a gente pagou para ver os Aerosmith e poucos conhecem a banda de suporte. O vocalista de Black Crowes é Chris Robinson e para além da sua voz rouca, muito soul sabe também dançar, sabe dançar e soltar o corpo como poucos, livremente e de forma sexy, é magro e esguio tem o cabelo pelos ombros. Estou louca em êxtase para ver a banda de que sou fã mas aquilo a que assisto faz-me corar de vergonha. É a comédia nacional, é a polaroid medíocre que eu quero deitar fora ou esconder no fundo da arca das recordações. O concerto dos Black Crowes acaba a meio porque o grande senhor Chris Robinson que também sabe dançar não consegue cantar. À sua frente estão milhares de pessoas homens e mulheres que o atacam ferozmente com garrafas de plástico cheias de terra que apanham do chão e o chamam de paneleiro, rabiló, panasca e outros sinónimos. Os Black Crowes nunca mais consideraram Portugal na lista das suas tounées.

O Feira Nova é um Hipermercado dirigido a um target específico, com produtos muito baratos e as pessoas que fazem parte do target do Feira Nova são pessoas de muito poucos recursos financeiros, de escassa formação literária e cultural, Existe ali um contexto de enquadramento quando se resolve colocar um cartaz de promoção desse tipo. Não é um ataque. É um aproveitamento duma situação social existente, real. Não permitir tal coisa não extingue a situação mas tapa somente o sol com a peneira.
Em conversa ouvida na rua corei com o discurso duma senhora que dizia para amiga, já viu? agora a minha nora resolveu trabalhar de sol a sol e agora nem tempo tem pra fazer nada em casa e anda o meu filho todo amarrotado, e ainda lhe responde torto, agora era o meu filho é que ia passar a ferro as camisas! Olhe é assim a vida, no fim tanto fazia aquela como outra que as mulheres hoje em dia não prestam pra nada...

Mas porque raio haveria eu de ir fazer queixa à comissão para os direitos das mulheres quando estes homens que nos cercam foram educados desta forma por mulheres? E já agora pergunto eu, não querendo deixar passar o preconceito que por vezes nos corre naturalmente nas veias, como sei eu que a direcção da campanha de Marketing do Feira Nova que lançou essa promoção não está a cargo duma mulher? Porque hei-de partir do princípio de que foi um homem a delinear aquela estratégia publicitária?

Excepções à parte, as primeiras pessoa a tratarem os homens como seres frouxos são as mães com medo de serem maltratadas na rua pelas vizinhas.
Sim porque os homens não têm só o direito de participarem nas tarefas domésticas sem serem apedrejados, também têm o direito de saber dançar e de usar o cabelo pela cintura. Um amigo de longa data contou-me tinha que suportar passar na rua pela sua mãe e vê-la atravessar a estrada para o outro lado com vergonha de falar a um filho de cabelo comprido e por isso afeminado. Nunca foi o pai dele a ter este tipo de reacção.

Mais uma vez digo, tratemos de mandar as comissões às urtigas e de fazermos o nosso esforço individual para que as próximas gerações sejam educadas de outras formas.

08 outubro 2006

Exmos/as Senhores/as

FEIRA NOVA, HIPERMERCADOS

“A mamã compra e nós oferecemos à filha” é o titulo de uma promoção do Feira Nova que fica ali perto de Xabregas, Lisboa. A mamã compra o balde e a esfregona e o generoso supermercado oferece à filha um balde e uma esfregona pequeninos, para ela se deleitar a imitar a mamã nas lides da casa...
Pergunto eu, os papás não limpam a casa, os meninos homens não brincam com baldes e esfregonas? E senão o fazem, deverá este comportamento ser incentivado e normalizado nas campanhas de promoção dos supermercados? Não existem outras maneiras de promover produtos que sejam mais inteligentes e propositivas para a nossa vida em sociedade?

Aguardo a vossa resposta.
Com os meus melhores cumprimentos

No baile da dona ester, ou
O chofer a dançar com a criada, ou
Dizia ela baixinho, ou
Na prise és bestial, ou
Sete e Picos, ou
Oito e Coisa, ou
Nove e Tal

Com cópia a:

DECO,
Plataforma Portuguesa de ONGS para os Direitos das Mulheres(PPDM),
Comissão para a Igualdade dos Direitos das Mulheres(CIDM),
Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego(CITE),
Futura Organização para os Direitos dos Homens de participarem nas tarefas domésticas sem serem considerados aves raras, frouxos, efeminados e para o Direito das Mulheres se libertarem de todo o peso da gestão de uma casa e poderem ter tempo para dedicar-se a outras coisas que gostam (trabalho, estudo, política, dolce fare lo que quiera).

Pinga amor

I fall in love too easily, I fall in love too fast
I fall in love too terribly hard for love to ever last

My heart should be well-schooled 'causeI've been fooled in the past
And still I fall in love too easily, I fall in love too fast

Chet Baker

07 outubro 2006

Anúncio de emprego

Esta semana no expresso emprego descobri um intrigante anúncio:
"RESPONSÁVEL DE UNIVERSO".
Perfil: "Preferencialmente com formação superior; 23-32 anos; enérgico, sorridente, dinâmico e concreto; Capacidade de liderança e iniciativa; Capacidade em [sic] tomar decisões com grande autonomia; Forte espírito de persistência; Excelente comerciante e homem ou mulher de terreno; Gosto pelo contacto cliente; Desportista praticante."
Procurarão Deus pelos classificados?

ULTIMATUM FUTURISTA

ÀS GERAÇÕES PORTUGUESAS DO SÉC. XXI

Acabemos com este maelstrom de chá morno!
Mandem descascar batatas simbólicas a quem disser que não há tempo para a criação!
Transformem em bonecos de palha todos os pessimistas e desiludidos!
Despejem caixotes de lixo à porta dos que sofrem da impotência de criar!
Rejeitem o sentimento de insuficiência da nossa época!
Cultivem o amor do perigo, o hábito da energia e da ousadia!
Virem contra a parede todos os alcoviteiros e invejosos do dinamismo!
Declarem guerra aos rotineiros e aos cultores do hipnotismo!
Livrem-se da choldra provinciana e da safardanagem intelectual!
Defendam a fé da profissão contra atmosferas de tédio ou qualquer resignação!
Façam com que educar não signifique burocratizar!
Sujeitem a operação cirúrgica todos os reumatismos espirituais!
Mandem para a sucata todas as ideias e opiniões fixas!
Mostrem que a geração portuguesa do século XXI dispõe de toda a força criadora e construtiva! Atirem-se independentes prá sublime brutalidade da vida!
Dispensem todas as teorias passadistas!
Criem o espírito de aventura e matem todos os sentimentos passivos!
Desencadeiem uma guerra sem tréguas contra todos os "botas de elástico"!
Coloquem as vossas vidas sob a influência de astros divertidos!
Desafiem e desrespeitem todos os astros sérios deste mundo!
Incendeiem os vossos cérebros com um projecto futurista!
Criem a vossa experiência e sereis os maiores!
Morram todos os derrotismos!
Morram!
PIM!

José de Almada Negreiros (1917)

06 outubro 2006

O sol aos quadradinhos


Dizia Eduardo Galeano que a sociedade fecha o perigo público nas prisões e manda fora a chave.

Nesta prisão, aqui bem perto, está fechado o produto de um sistema que cada vez mais acentua as desigualdades, que redistribui mal a riqueza gerada, e que tem uma muito deficiente politica social e económica.

E ainda que um abraço seja fundamental, há muito por fazer ainda neste país à beira da globalização plantado.

05 outubro 2006

Mentira a mentira

Mother Jones é uma organização sem fins lucrativos que tem como missão contribuir para a justiça social através do jornalismo de investigação. No final de Agosto, Mother Jones publicou Lie by Lie, a cronologia da guerra do Iraque, desde os primórdios da Operação Tempestade no Deserto até à cimeira de emergência nos Açores em 2003. In this timeline, we’ve assembled the history of the Iraq War to create a resource we hope will help resolve open questions of the Bush era. What did our leaders know and when did they know it? And, perhaps just as important, what red flags did we miss, and how could we have missed them?

Uma semana

Desculpe, não é para pedir tabaco, eu tenho cigarros, mas queria saber se as senhoras me podem dar aquele selo do maço, eu junto-os e entrego-os no quartel dos bombeiros, diz que é para arranjar uma cadeira de rodas, eu não sei se é verdade ou não. Cheguei há uma semana, andei quase quarenta anos a descontar para aqui, é muito difícil entrar neste lar, estas casinhas baixas, estes jardins, é uma categoria, quase parece o Algarve. Andei quase quarenta anos a descontar para aqui, mas quando me ligaram a dizer que tinha vaga chorei como uma criança, dei os meus periquitos à vizinha, o que eu adorava os periquitos e as duas gaiolas novinhas em folha, a casa ficou com tudo no lugar, a minha filha comprou-me um enxoval, roupão de seda, roupão turco, pijamas, gastou um dinheirão com aquele enxoval, que até para vir para aqui uma pessoa tem de vir bem vestido. A minha casa ficou com tudo no sítio, a minha filha diz que não quer nem um copo da minha casa, mas daqui as uns tempos vão lá aquelas camionetes dos drogados ou lá o que é, e levam tudo sem lhes pagarmos nada, é assim a vida. Eu cheguei há uma semana e já aumentei dois furos do cinto das calças, a comida aqui é uma maravilha, de manhã duas almoçadeiras e dois papos-secos, a sopa é uma categoria, a minha filha quando cá veio no domingo disse logo o pai está mais gordinho, está muito bom. Eu gosto de estar aqui, já fiz amigos, digo bom dia a toda a gente, alguns não me respondem mas acho que é porque são surdos, no fim-de-semana se a minha filha me vier buscar é só para almoçar porque ela já me disse pai não pode ser mais gastei um dinheirão com o enxoval, e é verdade, até um roupão de seda novo ela me comprou. Eu gosto de estar aqui, subi dois furos no cinto das calças, a comida é como num hotel, o quarto só tem mais três pessoas, fiz muitos amigos, a minha filha já não precisa de se preocupar comigo, mas às vezes ponho-me a pensar na minha vizinha, sempre a correr da repartição para o jantar dos miúdos em casa, que isto a vida é mesmo assim, coitada se calhar não se lembra de alimentar os meus periquitos, e dá-me um aperto no peito que as senhoras não imaginam.

04 outubro 2006

Esperteza saloia

"Temos confecções para PESSOAS FORTES"

(assim mesmo, tudo em maiúsculas) numa loja da baixa.
Deve ser onde o Tarzan Taborda se vai abastecer.

03 outubro 2006

Itinerário Principal



Once I went to the woods and I took the road less travelled by.

Ainda sobre o Islão

"O Islão e a sua cultura faz parte de nós próprios e do nosso passado. Pertence à nossa genética cultural. Desta forma, o Islão e as suas marcas civilizacionais não podem ser expulsos da nossa cultura, de nós próprios.
Nós não podemos extirpar a matriz da nossa própria identidade, a lógica do nosso passado, e principalmente as raízes dessa simbiose fantástica que é a cultura mediterrânica.
Conhecimentos médicos e matemáticos, saberes da terra e da água, formas e técnicas de construir, sabores das coisas e acordes musicais, são marcas solidamente ancoradas num passado que é também presente. Sinais identificadores de uma certa maneira de amanhar a terra, de gerir a água e as coisas da vida, de saber esperar pelo tempo.
Todo esse mundo não só é indissociável do nosso passado, como, certamente, continuará a desempenhar no futuro um papel importante na identificação e salvaguarda da nossa cultura e identidades, na possibilidade de resistir melhor a uma inevitável desumanização imposta por uma globalização selvagem.
Estas são, a meu ver, considerações que não podemos deixar de lembrar quando tentamos abordar as consequências da invasão do Iraque. As consequências da nossa cumplicidade neste acto de agressão." ver texto completo
Cláudio Torres, Arqueólogo

02 outubro 2006

Amor destilado

Sei que te envergonho com os meus passos incertos e a minha voz lenta, sei que não compreendes por que me afundo e me transformo neste outro homem que tu não amas, que tu não queres, que tu odeias. Mas o que não sabes, porque nunca to disse, é que todos os dias sigo com escrúpulo de farmacêutico a receita para sobreviver ao meu amor por ti. Com o primeiro copo vai desaparecendo a tua vida no mundo, com o segundo dissolvo todo o cortejo do passado que me assalta desde que te conheci, até te descobrir no torpor destilado onde és só minha.

O que nunca te direi

E se eu agora te dissesse que sim? E se eu agora esquecesse tudo, o meu nome e o teu nome, as vidas que trazemos agarradas a nós e te roubasse até ao fim do mundo?

01 outubro 2006

Os homens também ficam grávidos

Os homens também ficam grávidos, não têm a criança dentro do seu corpo por 9 meses, mas está na sua cabeça e na relação com a mãe dela. Enquanto uma criança cresce num ventre que decidiu acompanhá-la a ser gente, vai nascendo primeiro na cabeça do seu pai e da sua mãe, como dizia Eduardo de Sá, por outras palavras.

Um menino em construção

Há 12 anos atrás, quando o meu irmão soube que o seu primero rebento seria uma menina, respirou de alívio e disse: "ainda bem, se fosse um rapaz eu não saberia como ensiná-lo a lutar".

Só mais tarde é que o meu irmão se começou a aperceber que não temos de ensinar os meninos a lutarem porque, apesar das formas tradicionais de construção de identidade masculina estarem associadas à violência, à competição, ao poder sobre o outro, essa não é a ideologia que muitos de nós, homens e mulheres, desejamos para a "construção" de seres humanos, no actual mundo em que vivemos, mundo cansado de tantas guerras, mortes, violência, chacinas, refugiados, deslocados, pobres. A relação com o outro/a, seja a nível individual ou colectivo, não pode ter como código principal a agressão física, psicológica, económica e social desse outro/a.

E isso, tanto homens como mulheres temos de ir (re)aprendendo, poquito a poquito.