20 junho 2006

A casa

O que se faz quando a própria casa nos quer expulsar?

Primeiro atacou-me fisicamente.

Começou com uma queimadura de 3º grau nos nós dos dedos da mão direita. Era o meu primeiro jantar de família na casa nova, fiz bacalhau no forno. Para ver se já estava pronto enfiei a mão mal protegida por uma pega, toquei com os dedos na grelha e por uma qualquer força misteriosa não os tirei durante uns belos segundos. Ainda tenho as marcas.

Depois, foi com sangue. Estava a lavar um pirex; bem sei, já tinha uma racha, mas eu tenho muita dificuldade em deitar coisas fora, achei que ainda podia servir para qualquer coisinha. A esfregar com mais intenção um bocado de esturricado, a coisa partiu-se enfiando-se pela base do meu polegar adentro. Não doeu muito, mas fiquei fascinada por ter sido apresentada ao interior da minha carne, não sabia que tinha tanta até chegar ao osso.

Como tenho uma veia de rambo, decidi cozer-me eu mesma em casa. Rambo sim, mas pós-moderna, usei daqueles pontos da farmácia. Andei assim durante duas semanas, e ainda tenho a cicatriz a quem quiser desafiar a veracidade da história.

Verificando a casa que eu sou resiliente, apesar de tudo comprei a casa, pago o condomínio e os impostos, não é uma queimadura ou um naco de carne a menos que me vão fazer desistir, atacou com animais.

Timidamente umas formigas apareceram. Eliminando fontes de alimentação exteriores, e à conta de muita sapatada, lá se foram embora.

Chegaram então os pombos, que encontraram maneira de se infiltrarem no meu sótão, onde creio abriram um bordel para aves. Um dia acordei com um barulho semelhante a um insuficiente respiratório em clímax contínuo e desesperado. Depois de perceber que não era nenhum vizinho à beira da morte tentei voltar a dormir.

Vendo que tão pouco esta estratégia resultava, vieram os ratos que devem ter comido os pombos (ou então os ditos perderam as asas, à conta de tanta actividade reprodutora). Em vez de sentir um esvoaçar ocasional por cima da minha cabeça, tenho agora corridas a passinhos pequenos e rápidos. Ao menos são mais silenciosos nos seus momentos de amor.

Se tal não bastasse, a casa enviou-me bichos de prata. No início pensei que fossem pequenas baratas, que se iriam embora com a sapatada ocasional (se funcionou com as formigas, que são mais inteligentes, também havia de funcionar com estes). Mas os brutos não se moveram. Usei umas casinhas de insecticida, que me diziam ser ideais para o efeito, mas eles gostaram tanto delas que constituíram família lá dentro e tudo; pensariam eles que era o seu Versalhes pessoal?

Ataquei com uma coisa chamada biokill, mas parece que eles gostam tanto daquilo como a minha irmã de sumol de ananás.

Ainda andamos em luta. Qualquer dia começam eles a escrever no blogue.

5 comentários:

Anónimo disse...

olha antes esses animais que outros. Como aquele crocodilo ali em baixo. Mas ainda há outros piores: aqueles que pensam. Espero que não te caia nenhum na rifa. Esses, regra geral, são maiores, fazem mais barulho, ocupam mais espaço e até à data as armadilhas são pouco eficazes. Boa sorte oitecoisa!

8 e coisa 9 e tal disse...

nove e tal, os que pensam precisam da chave de casa para entrar. E essa só a tem a minha Rosário, que anda quase tão empenhada na matança quanto eu.

Sr. pirata, tudo água. último andar, bem no centro da cidade.

Anónimo disse...

Uma vez ouvi dizer que quando a casa anda de pernas para o ar é porque alguma coisa na vida ou na relação não anda bem... Se não for isso há que ter muita paciencia e um plano estratégico para fazer frente a estas contigências urbanas e, se não resultar, as casas são como os chapéus, há muitos...

Nomyia disse...

Bem... é tão trágico que até dá vontade de rir? Com coragem e tempo acho que o dono consegue prevalecer à casa! *****

Anónimo disse...

Lol, Não te preocupes, no Julio de Matos tb têm lá muitos que ouvem passinhos no sotão.

he he he