06 maio 2008

janeiro 2002 (parte 2)

Estes dias têm sido de fecho de ciclo, de despedidas de todas as pessoas que me marcaram a alma e a vida, de lágrimas e abraços pela separação que deixa tristeza por todas as alegrias e os bons momentos partilhados. Deixei, ou melhor trago comigo, muitos afectos de Urabá, muitas histórias e o mais importante, amigos e amigas. E como em todas as despedidas há sempre entrega de heranças ou recuerdos, fiz uma festa e distribui uma parte das minhas coisas pelos amigos. Ao Adolfo, o meu amigo motorista, ofereci o meu rádio gravador para que ele ouça música, que tanto gosta. Adolfo sempre vem a cantar vallenatos e canta tão bem, é uma alegria ouvi-lo e às vezes cantamos os dois.
(...)
Estes são dias muitos agitados, ando com uma adrenalina estranha, misturada com cansaço. Numa semana desmontámos a casa, fomos numa missão às comunidades de paz, por causa da morte de dois lideres muito importantes, um homem e uma mulher, chegámos, num recorde de 6 horas pusemos tudo num camião de bananas, ou não me fosse eu de Urabá, terra do monocultivo da banana e de Apartadó, que na língua indígena significa rio de plátano, empacamos as nossas malas e rumo a Bogotá, onde há que tratar do visto para o R. ir conhecer Portugal, e de todas as formalidades de terminar o emprego, de ficar emigrante em Colômbia, de estar no desemprego. Ontem fomos jantar e comemorar o nosso desemprego, para ambos o segundo. Hoje, 5 de janeiro, dia em que formalmente termino o meu contrato como voluntária do acnur, fomos ver, apaixonámo-nos e alugámos uma casa pequenina mas muito simpática, que fica em frente a um parque com árvores muito bonitas, perto da oficina do acnur em Bogotá, isso já não quer dizer nada mas é uma referência simbólica no meio de tanta incerteza. Amanhã vamos fazer a mudança de tudo o que trouxemos de Apartadó e depois outra vez fazer as malas e cruzar de avião o oceano, rumo a Portugal, depois de todas as vezes que já o cruzamos nas palavras e nas conversas. E sabemos que quando voltarmos vamos começar a cruzada de procurar emprego, e agora quero trabalhar no outro lado, já conheço as Nações Unidas, e gostei muito desta experiência, mas agora quero trabalhar no lado das ONGs, quero conhecer os vários lados de um mesmo trabalho. A vida não pára e eu sim quero parar agora, necessito descansar, é muito ritmo, passemos antes aos blues e ao new age.

E como o caminho se faz caminhando, uma redundância muito bem apanhada para nos lembrar que cada dia é um dia por si mesmo, agora o coração já está em Portugal, contente por poder rever e conhecer de novo todos os afectos que estão em Portugal, a família, os amigos, as ruas, as conversas, tudo o que estava quando estive e o que agora já não conheço e que perdi por não estar aí, é sempre inevitável a sensação de perda na vida de quem parte.
Por aqui me fico, que a ribeira vai cheia e o barco parado e eu quero ir já para esse lado.
Até muito breve o abraço.

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