E tenho que ser uma velha - ai não que horror, não há velhos! - cidadã sénior independente, saudável, activa e a aproveitar a vida. Quer dizer, nessa altura ainda vou estar trabalhar todo o dia, todos os dias, para me sustentar porque só vou ter reforma aos oitenta e cinco. O problema é que como já não tenho alunos, vou para o desemprego. Não há tecido social, não há tecido económico, não há desenvolvimento. Os empregos são todos públicos e os salários estão todos tabelados pela justa medida da necessidade individual - quer dizer os que fizeram as tabelas estão isentos... . Os impostos estão a 90% para sermos todos iguais e podermos todos contribuir para o bem comum, que nunca explicaram bem qual era. Dos 10% que restam, 8% são a comparticipação obrigatória dos medicamentos, não vá eu ficar doente um dia. Entretanto, querem que vá fazer uma formação em novas tecnologias, daquelas em que nem há computador, são só umas coisas pequeninas encaixadas nos pulsos, mas como tenho taquicardia faz tilt. Vou passar o Natal sozinha porque, afinal, são só mais uns dias de férias que o Estado concedeu e a minha criança vai estar nas Maldivas com o Mauro, o afecto do momento, depois de ter repudiado a Maura. Já não dava, disseram. Ah, e não tenho netos. Davam muito trabalho, eram permanentes, era uma responsabilidade. Podiam comprometer os voucher de viagens da agência nacional do lazer, dados lá no emprego. Foi assim que elas foram para as Maldivas. E a Maura, na altura, não queria usar o voucher saúde para fazer inseminação com os genes do Bruno, preferiu fazer o implante da copa D. Com o aborto livre deixou de haver crianças para a adoptar. Bem, dizem que agora vão abrir umas casas para onde os miúdos vão e quem quiser pode ficar com eles durante uns tempos, para permitir que todos os cidadãos possam, em condições de verdadeira igualdade, experimentar a "parentalidade".
Ridículo? Talvez. Mas se dissesse à minha Avó, quando ela tinha 30 e tal anos, que eu ia escrever num sítio imaterial, acedido por satélite, ou que tinha "amigos do facebook" ela diria exactamente o mesmo.
4 comentários:
Peço desculpa mas não consigo entender onde está a parte francamente assustadora. Ter a reforma aos 85? Não ter reforma? Os filhos basarem de férias para as Maldivas? Os impostos a 90%? Não ter netos? O aborto ser livre e não haver mais crianças para adoptar? Passar o natal sozinha? Morrermos sozinhos? Chegar aos 85?
não, querida chofer. vê o link no fim.
qd tiveres 70 anos, vão haver mais velhor que crianças no mundo.
excelente descrição... ainda que altamente aterrorizadora!!
Obrigada, senhora cdgabinete.
Como dizia num seu post, o mundo está aqui ao lado desta torre de marfim...
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