25 julho 2008

Autista à força

Com uma otite galopante há uma semana, enquanto as dores lentamente me abandonam a cabeça parece afundar-se cada vez mais no my own private aquarium. Sozinha em casa e em silêncio estou bem, tenho a sorte de apreciar a minha companhia, mas quando saio da gruta a vida complica-se.


No outro dia tive de vigiar um exame de uma colega. Expliquei-lhe a minha situação clínica mas como não tinha que tirar dúvidas bastava fazer cara de má e mandar calar com veemência de cada vez que sentisse movimento na sala. Funcionou. Quer dizer, não sei porque não ouvi. Passaram 5 em 30, se copiaram não lhes serviu de muito.

Guiar é um constante desafio. Com as janelas abertas não suporto o barulho do trânsito, fechadas construo a minha sauna pessoal. Entre não ouvir os outros carros, estar sempre com um olho nos radares e outro no conta quilómetros, um dia destes acabo espetada num pilar de cimento. Já pensei pedir um cruise control à CML, que isto de estar sempre a controlar a velocidade de forma obsessiva ainda vai acabar por me fazer sociabilizar com o senhor da viatura da frente.

Ir a restaurantes em geral e cafés em particular é uma façanha de monta. Odeio as colheres a bater no pires, as facas a raspar nos pratos, a máquina do café a funcionar, o moinho entra-me pelo cérebro como uma faca eléctrica pelo occipital.

Numa reunião com mais de 30 pessoas, ouvir os outros é uma odisseia, perceber o feedback às minhas intervenções praticamente impossível. Sei que os fiz rir porque os ombros abanavam e viravam-se para mim de taxa arreganhada. Fiquei com a dúvida se fui eu ou um pum inadvertido.

Com tanto líquido persistente cá dentro creio bem estar a contribuir para o desenvolvimento de uma nova espécie piscícola autóctone no ouvido médio. Espero que sejam vermelhos como os do Matisse.

5 comentários:

na prise és bestial disse...

Vou ali comprar uma cana de pesca e já te direi de que cor são os peixes que habitam nos teus ouvidos.

dizia ela baixinho disse...

'tadinha da minha amiga.

muitas melhoras.

sete e pico disse...

chama-se a isto "al mal tiempo buena cara"... com a atracção que a tua casa tem por animais não me admira que o teu ouvido médio também tenha ficado contagiado.

Espero que melhores rapidamente, abracinho

sem-se-ver disse...

passei a infância a otites. um horror, um suplício. abraço de solidariedade, espero que passe depressa!

8 e coisa 9 e tal disse...

na prise, então?

multiplas, obrigado pelas melhoras. Já nao me dói mas continuo surda...

Sem-se-ver, eu também! Reza a história que a minha primeira otite foi aos 4 dias e daí até aos oito anos foi sempre a rir sempre a curtir. Depois passou-me, até agora. Já me tinha esquecido do horror que são as dores de ouvidos. Agora só continuo com os meus aquários, um de cada lado. à espera que a na prise me venha tirar os peixes.