Chego a casa e abro as janelas. O meu vizinho pianista regressou depois de semanas de ausência. Vejo-o pela janela do quarto onde estuda. É só uma nuca e ombros que se balançam com a música que chega até mim deste lado do jardim. Uma música feita de paragens, arranques e repetições, uma música que agora trepa frenética e me faz sorrir. Será alto ou baixo, gordo ou magro, novo ou velho?, que nome terá o dono das mãos que estudam naquele piano?, imagino-o a viver com os pais e a sonhar com a colega silenciosa de pele muito branca que observa à distância de uma escala intocável, a mesma escala que oiço daqui vezes sem fim, na certeza de que não imagina que do outro lado do jardim há alguém que sorri.
5 comentários:
humm..gostei dessa pequena história. Gosto dos chamados micro-contos, pq trabalham bem a imaginação do leitor. Nem tda gente consegue escrever bem micro-contos. E tu conseguiste. Estou com a imagem desse pianista na minha cabeça.
É engraçado, eu também tenho uma pianista no prédio perpendicular ao meu. Ouvi-a pela primeira vez no inicio desta semana. Acho que está a aprender. Da minha janela, só consigo ver o piano.
Quando ela começou a tocar, interrompi o que estava a fazer e fiquei à janela, a ouvir e a ver, os dedos sobre as teclas.
E queimei o arroz...
também fiquei com esta história na cabeça. :)
Eu fiquei com esta história no ouvido.
O pianista está silencioso hoje. É pena, logo hoje que tenho um prazo a prender-me a casa e ao computador. Talvez tenha ido ouvir a pianista de pele muito branca. Talvez finalmente descubra coragem para lhe sorrir.
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