16 julho 2007

É proibido, mas pode-se fazer...

Vou frequentemente à Quinta Pedagógica, um sítio óptimo para quem tem crianças pequenas. Ao longo de toda a quinta vêm-se tabuletas a dizer: “Por favor não dê comida aos animais”, mas apesar disso encontro sempre uma série de pessoas a dar comida aos animais. Às vezes dou-me ao trabalho de lembrar as pessoas da tabuleta mas em geral ouço a mesma resposta grunhida: ahh o cartaz!, mas aqui toda a gente dá...
Resolvi então ir falar com o guarda da porta que por acaso estava com o tratador dos animais. O diálogo foi mais ou menos assim:

Oitoecoisa: Os senhores desculpem, mas venho aqui tirar uma dúvida. Afinal é proibido ou não é dar comida aos animais?
Eles: Proibido não é, o que se passa é que não se pode dar qualquer comida..
O: Então mas porque é que estão ali os cartazes a dizer Proibido dar comida aos animais?
E: Ah, isso é porque há pessoas que às vezes trazem comida estragada ou como outro dia, que estava um homem a dar uma sardinha frita a um cavalo, coitadinho do bicho até podia morrer! E assim com a tabuleta a gente pode proibir.
O: Percebo, então está escrito que não se pode dar comida, mas pode-se dar alguma comida desde que não esteja estragada. E como é que vocês controlam isso?
E: Ó menina, a gente vê...
O: E conseguem sempre ver? E se alguém traz alguma coisa estragada e vocês não vêm?
E: Em geral vemos sempre..
O: Então porque é que não escrevem no cartaz que só se pode dar algum tipo de comida específico, ou escrevem para primeiro consultar-vos antes de dar comida?
E: Porque assim tinhamos mesmo de proibir e coitadinhas das criancinhas, ficam tão felizes a dar comida aos bichos....
O: Compreendo que seja para o bem das criancinhas, mas digam-me uma coisa, os animais podem comer a todas as horas do dia?
E: Bem, poder não podem, porque eles se alguém lhes dá comida estão sempre a comer e isso não é bom, eles deviam comer como nós, três vezes por dia.
O: Compreendo. Então é bom para as criancinhas mas não é bom para os animais. Já agora, digam-me outra coisa, o que acham os senhores do facto de darmos duas mensagens diferentes e contraditórias às crianças? Por um lado escrevemos a regra em toda a Quinta, que como vocês disseram até tem razão de ser, por outro dizemos-lhes que essa regra não é para ser cumprida, pois toda a gente dá comida aos animais e vocês deixam desde que não esteja estragada, pelo bem das criancinhas. Estamos já a ensinar-lhes que as regras são uma mera referência, não são para ser cumpridas...
E: Pois, desde esse ponto de vista a menina até tem razão, se calhar devia-se pensar noutra forma de pôr a regra...

A conversa depois derivou sobre o estado do país e a nossa tendência para não cumprir regras, e o primo do porteiro que pagou uma multa por estar a falar ao telemóvel... Mas para mim foi bastante ilustrativa sobre a forma como assimilamos e reproduzimos as regras da nossa cidadania. As regras existem para ser cumpridas, mas só de vez em quando....

4 comentários:

zamot disse...

Ui! A mim cumpriram-me umas belas regras na inspecção do carro.
Mas só este ano, no ano passado foram outras. Mas não ligaram a estas aplicadas este ano...

gpjbvwtm

Anónimo disse...

Pois não é este o País em que o Zequinha roubou o cartão vermelho ao árbitro?

someothertime disse...

óinc, óinc...oh vaquinhas! parem lá de pastar e ruminar e bolsar e voltar a comer, porque já sabem...só três refeições por dia e logo a seguir lavar os dentinhos...

já desde tempos imemoriais, os pastores conduziam os rebanhos num estranho ritual que se repetia por 3 vezes num dia, a saber, ao pequeno-almoço, ao almoço e ao jantar.

Com o avanço da ciência, e no dealbar da nova pastorícia, determinou-se que os animais nunca deveriam ter um intervalo superior a 3 horas entre refeições.

De facto, permanece ainda um dos mistérios do mundo animal (ramo doméstico) o facto de, por exemplo, as cabras do Clemério (no Gerês) irem pastar todo o dia e não saberem que só podem roer os tenros caules 3 exactas vezes por dia.

Mas esses hábitos, se calhar só se aplica às cabras de Lisboa, que as do Gerês são da provincia e uma brutas sem maneiras.

8 e coisa 9 e tal disse...

:) Ora aqui está uma perspectiva que por acaso não me ocorreu aquando da conversa com o tratador!

De qualquer forma, subsiste a questão, estamos a dar mensagens contraditórias ás crianças e aos visitantes da quinta em geral, quando se colocam tabuletas que dizem uma coisa e se aceitam práticas que vão na direcção oposta.