03 julho 2007

Verdade e consequência



Passei pelo parque da saúde. Cruzei-me com 3 ou 4 doentes (ou utentes, é mais asséptico) do Júlio de Matos. Estavam todos medicados até à ponta dos cabelos, faziam-me lembrar os bichos no jardim zoológico, só que em vez de grades de metal tinham a alma presa nos fármacos.



Duas horas na oncologia de Santa Maria. A sala de espera cheia de gente, bicha de 10 pessoas para atendimento na secretaria. Uma senhora pediu ajuda porque não tinha forças para empurrar a cadeira de rodas em que a tinham levado para cima e precisava de a devolver. Um senhor que tinha sido operado à cabeça, cheio de ligaduras e cansado, irritou-se com a solicitude de uma mulher que o acompanhava "preciso dos seus documentos, posso tirar a carteira? Dá licença? Obrigado". Sorri com a sua impaciência, também a mim me enervaram as palavras paternalistas e condescentes dos seus acompanhantes, como se por ser velho e doente se tivesse tornado um imbecil.
O médico pede-me desculpa por me ter feito esperar tanto, sabe é que todos os outros hospitais oncológicos estão cheios e mandam toda a gente para aqui, não temos pessoas nem meios para lidar com isto. Eu compreendo. Lamento-o.
Fui à farmácia de dia levantar os comprimidos. Vi uma senhora bonita, elegante no seu sofrimento, andava com dificuldade. Atrás de mim cruzou-se com o enfermeiro, com os óculos de ver ao perto pendurados na ponta do nariz e amarrados ao pescoço com uma corda. Oiço-o "a senhora tem de se consciencializar que tem esta doença e aprender a viver com isso. Está bem? Boa tarde".

1 comentário:

na prise és bestial disse...

dias destes dão cabo das horas e minutos que temos à nossa frente. The way of all flesh.