22 junho 2009

AlienNation

Estou eu ali no meio do pinhal da Zambujeira de tenda armada, enfiada no saco de cama, promoção Verão 2009 do Jumbo quando abro os olhos de repente, forçada violentamente a largar o sonho magnífico em que estou enfiada num barco a meio de um rio dentro do cenário do African Queen, com o Bogie mais a Hepburn. O Bogie pisca-me o olho e atira-me um cigarro sem filtro mas a Hepburn ignora-me glacial. Merda mais ao campismo selvagem que me faz ter de ir mijar ao mato a meio da noite. De xanato nos pés, lanterna e rolo de papel higiénico na mão, lá me atiro ao desconhecido nocturno. Há tendas por todo o lado por isso tenho de me afastar o mais possível e encontrar um arbustro qualquer ainda livre de dejectos onde me possa aninhar. Encontro uma clareira bestial, a uns 200 metros, já pertinho do abismo que leva ao mar, ruidoso lá em baixo, e faço o meu serviço sempre com a atenção virada para alguma víbora ou lacrau que decida subir-me pelas pernas acima. A lua está cheia e quase que a lanterna era dispensável. O luar é intenso. Muito intenso. Que raio de luar tão intenso. Chiça que daqui a nada alguém me vê de cuecas para baixo. E desde quando é que a lua também é vermelha e azul? Às tantas começo a duvidar se realmente cheguei sequer a acordar do sonho e a levantar-me mas a dentada de uma melga de passagem por ali arrebita-me. Já estou vestida e composta e estou estática a olhar para um objecto metálico do tamanho de um T1 na minha frente. O caleidoscópio de luzes reduz a intensidade e abre-se uma porta daquelas de elevador por onde sai um tipo ou um fulano, como quiserem, podem fazer a vossa própria versão, bem maior que eu e muito mais bronzeado. E quando digo bronzeado é porque o gajo estava de facto, enfiado num fato de bronze (tinha sido interessante para o leitor se eu tivesse decidido usar o acordo ortográfico aqui nesta frase, estava de fato enfiado num fato era lindo não era?). Bem, adiante. O gajo dirige-se a mim confiante e reparo que só tem um olho no meio da testa que é enorme.
- Você é um ciclope. - informo eu sem mais demoras.
- Aí minina, tudo bem com você? - Pergunta ele, com uma voz toda robótica e nada atraente.
- Você é um ciclope brasileiro. - Volta-me a sair em voz alta.
- Qué isso aí? Cê tá maluca minina? Não sou ciclopi não.
E zás. Vira-se para trás e vejo que também tem outro olho igual na nuca. Estes gajos são muito avançados, penso eu. Qual visão periférica qual quê.
- E cê faz o quê aqui a essas horas?
- Bem, eu estava a dormir, acho, e depois tive de vir, enfim, fazer chichi.
- Ahh, chichi, sei. Bom isso né? A genti não faz isso não.
- Ah não?
- Não, muito disconfortáveu, com esse fato aí e tudo, não dá não.
- E que faz você por aqui?
- Bem, eu sou um alien,né? cê tá vendo isso, e o calor assim dentro ali da nave, atão, eu costumo parar aqui de vez im quando para curtir aqui uma brizinha do mar, que é sempri bom têr essa brizinha assim passando no corpo né? Cê também gosta?
- Eu também gosto. Mas eu nuca, desculpe, nunca tinha reparado em aliens por aqui.
- É isso aí, pode crer. Alien não pára muito por aqui não. Eu é que tou de fugida aos policiais lá do meu pláneta e ando por aí vagueando fora da fronteira interplanêtária e então discubri esse lugar aqui, que é muito bom né? Cê gosta?
- Eu também gosto. Mas oiça lá, tou aqui com algumas dificuldades em acreditar que você seja um alien a sério, sabe? Apesar do fato e da nave e das luzes e sobretudo do olho extra e tudo isso, mas sabe que hoje em dia, isso não quer dizer nada, um gajo chega com uma ideia ao Aki, por exemplo e é fácil...
O gajo interrompe-me com pelo menos um dos olhos a piscar incrédulo.
- Qué isso minina, tá duvidando di mim porquê? Aqui ou ali num sei não, mas eu sou um alien mêmo viu?
- E além disso, - continuo eu ainda não satisfeita - Nunca ouviu dizer que os aliens só falam inglês?
O gajo encolhe-se e ouve-se o ruído metálico das articulações mal oleadas do fato.
- É. Aí cê tem razão. Eu falo inglês também, claro né? Máis, como eu ti disse antes, eu tou de fugida exactamente porque tava fundando lá um partido de alien que não quer mais falar inglês. Então eu fui perseguido por um lobby aqui de pessoal terreno da área 51 que fica com medo de perder o estatuto de exclusividade da caça ao alien, né? Isso no fundo, é só política como cê pode vêr, em toda a galáxia está-se passando isso.
- AH, entendo, e vocês escolheram falar brasileiro?
- É que o português tá assim ficando muito paricido não? Cê não acha? E assim ficava mais fáciu né? Bem, minina, o sol tá nascendo daqui a nada viu? Tenho que mi ir embora mas olhe aí, foi um prazer conhecer viu?
E assim me despedi do gajo que saiu dali rodeado de luzes por todo o lado outra vez. Ainda passou algum pessoal por nós mas era seguro porque estavam todos em ácido e não estranharam.
Este foi sem dúvida o encontro mais invulgar que eu tive até hoje.

9 comentários:

na prise és bestial disse...

A língua portuguesa é a pátria de dissidentes alienígenas. Bota invulgárr nisso, minina.

nove e tal disse...

este encontro é verdadeiro?

lindo, lindo!

na prise és bestial disse...

claro que é verdadeiro. Tens dúvidas?

8 e coisa 9 e tal disse...

Sem dúvida nenhuma, não só é verdadeiro como foi mesmo muito invulgar, tal qual como um fenómeno estranho que começou por ser apenas um fenómeno. Depois por ser estranho passou a chamar-se fenómeno estranho. E depois por se ter tornado ainda mais estranho, passaram a chamar-lhe fenanho estrónemo.

na prise és bestial disse...

acho que vou processar-vos. Entre o blogue e os mails, já me engasguei a rir três vezes.

não resistiu ao wiski disse...

é pá quem me dera ter esta sorte!
eu cá só encontro trolls em Lisboa e não se percebe metade do que dizem.....se calhar é melhor assim.

ó oito bora lá beber umas jolas com esse fenanho estrónemo que é tão bem falante.

8 e coisa 9 e tal disse...

tá bem, bora lá beber essas jolas, eu fico com o estrónemo e tu ficas com o fenanho , que esse gajo parece-me assim um bocado pró fanhoso!

não resistiu ao wiski disse...

assim seja!!!!

Pedro disse...

Só uma, vá lá, duas, perguntinhas...
Alguém sabe explicar porque é que os fenanhos estrónemos, são sempre do género macho? Será a falta de gajedo nessas órbitras maradas, que os faz cá vir?
É que ter de percorrer milhares de anos luz, para isso...