- Dona Arlete, hoje estou um bocado ralada.
- Ò Dona Preciosa, não me diga que são outra vez os joanetes a ralarem-lhe os pés?
- É isso mesmo, Dona Arlete, não é qualquer sapatito que me caiba, agora tenho de usar aquele calçado ortopédico que é muito confortável, bem sei, mas estava tão habituada ao meu calçadito. Olhe, uma apoquentação, é o que é. A propósito não tem aí mais uma pinguinha de chá?
- Ó Dona Preciosa, já se serviu de duas taças e olhe que agora tenho de poupar os pacotitos que vou aviar ali à mercearia da esquina, que isto a crise afecta todos, mas sobretudo aqueles que têm uma pensão poucachinha, que é o meu caso, por falar nisso ainda não chegou o chequezito da pensão do meu marido.
- Ó Dona Arlete, que maçada. Não é que não a perceba, mas não acha que esta a ser um bocado forreta? Hoje nem sequer umas bolachitas...
- Não se queixe, Dona Preciosa, não se lamente, quem dá o que pode a mais não é obrigada. E sou eu, aliás, que ofereço sempre o cházinho. Às vezes a Dona Lurdes lá se chega à frente, mas cá para nós não é a mesma coisa, pois não?
- Que falta de chá, diz a Dona Arlete para com os seus botoes.
Entra a Dona Lurdes
- Desculpem o atraso neste cházinho que tanto aprecio, mas fui ali comprar um vernizito à loja do chinês. É a crise, não dá para mais.
- Ó Dona Lurdes, ainda bem que fala no assunto. Eu por acaso também comprei um verniz na mesma loja, mas aquilo é um bocado manhoso. Quer-se dizer, ficou um bocado feio quando fui fazer a barrela. Estalou tudo. Rico dinheirinho tão mal empregue... e com as necessidades que passo, sabe como é...
- Pois eu agora, Dona Preciosa, também ando preocupado com o meu aspirador. Avariou-se, coitadinho, também já era velhinho, é verdade, tinha-me sido oferecido pela minha nora, que mora lá para os lados de São João da Talha e agora tenho de varrer tudo com a vassoura e não chego ao canto onde estão as baratas. Uma arrelia é o que é. E eu toda curvadita e sofro tanto derivado aos bicos de papagaio. Uma arrelia, é o que é.
Entra a D. Hermengarda
- Estou muito atrasada, desculpem, estimadas amigas. Mas é que no caminho vinha a pensar no Hans-Georg Gadamer. Considera que a praxis não está subordinada à teoria, como simples técnica resultante da dedução de um saber teórico. A prática é co-natural à teoria. Procurando distinguir-se da metafísica, tem como virtude fundamental a phronesis, entendida como ligação entre a razão (logos) e a experiência moral (ethos), entre a subjectividade (da consciência) e a objectividade (do ser). As grandes abstracções pluridisciplinares. Olhem, uma ralação, há dois dias que não penso noutra coisa.
- Ó Dona Hermengarda, não seja por isso. Amanhã podemos fazer um novo cházinho e discutir a questão em conjunto. Mas olhe, já agora traga você uns pacotinhos de chá, que eu estou farta de dar para esse peditório
- Está bem Dona Arlete, mas não lhe prometo nada. Vou ver se avio uns pacotitos avulso. E agora, queiram desculpar, mas tenho de ir. Desculpem a pressa, mas tenho de ir ler Edmund Gustav Albrecht Husserl, fundador do movimento fenomenològico que ao que parece era discípulo de Franz Brentano y Carl Stumpf. Influenciou vários autores e em grande medida Max Scheler e também o interesse de Herman Weyl na lógica intuicionista na imprevisibilidade.
Sai a D. Hermengarda, depois de se ter abotoado a 2 taças de chá.
- Sabem, diz a Dona Preciosa, é mesmo sovina esta Dona Hermengarda. Além disso, cá para nós que ninguém nos ouve, é uma obcecada, é o que é. Deve ser derivado ao marido que a deixou pela prima da cunhada da cabeleireira que vive ali para os lados da Mouraria. Não tem mais nada que fazer nas horas vagas é o que é. E a gente que ature e que lhe afague a tristeza. Mas temos de ser umas para as outras, não é?
- Ò Dona Preciosa, não me diga que são outra vez os joanetes a ralarem-lhe os pés?
- É isso mesmo, Dona Arlete, não é qualquer sapatito que me caiba, agora tenho de usar aquele calçado ortopédico que é muito confortável, bem sei, mas estava tão habituada ao meu calçadito. Olhe, uma apoquentação, é o que é. A propósito não tem aí mais uma pinguinha de chá?
- Ó Dona Preciosa, já se serviu de duas taças e olhe que agora tenho de poupar os pacotitos que vou aviar ali à mercearia da esquina, que isto a crise afecta todos, mas sobretudo aqueles que têm uma pensão poucachinha, que é o meu caso, por falar nisso ainda não chegou o chequezito da pensão do meu marido.
- Ó Dona Arlete, que maçada. Não é que não a perceba, mas não acha que esta a ser um bocado forreta? Hoje nem sequer umas bolachitas...
- Não se queixe, Dona Preciosa, não se lamente, quem dá o que pode a mais não é obrigada. E sou eu, aliás, que ofereço sempre o cházinho. Às vezes a Dona Lurdes lá se chega à frente, mas cá para nós não é a mesma coisa, pois não?
- Que falta de chá, diz a Dona Arlete para com os seus botoes.
Entra a Dona Lurdes
- Desculpem o atraso neste cházinho que tanto aprecio, mas fui ali comprar um vernizito à loja do chinês. É a crise, não dá para mais.
- Ó Dona Lurdes, ainda bem que fala no assunto. Eu por acaso também comprei um verniz na mesma loja, mas aquilo é um bocado manhoso. Quer-se dizer, ficou um bocado feio quando fui fazer a barrela. Estalou tudo. Rico dinheirinho tão mal empregue... e com as necessidades que passo, sabe como é...
- Pois eu agora, Dona Preciosa, também ando preocupado com o meu aspirador. Avariou-se, coitadinho, também já era velhinho, é verdade, tinha-me sido oferecido pela minha nora, que mora lá para os lados de São João da Talha e agora tenho de varrer tudo com a vassoura e não chego ao canto onde estão as baratas. Uma arrelia é o que é. E eu toda curvadita e sofro tanto derivado aos bicos de papagaio. Uma arrelia, é o que é.
Entra a D. Hermengarda
- Estou muito atrasada, desculpem, estimadas amigas. Mas é que no caminho vinha a pensar no Hans-Georg Gadamer. Considera que a praxis não está subordinada à teoria, como simples técnica resultante da dedução de um saber teórico. A prática é co-natural à teoria. Procurando distinguir-se da metafísica, tem como virtude fundamental a phronesis, entendida como ligação entre a razão (logos) e a experiência moral (ethos), entre a subjectividade (da consciência) e a objectividade (do ser). As grandes abstracções pluridisciplinares. Olhem, uma ralação, há dois dias que não penso noutra coisa.
- Ó Dona Hermengarda, não seja por isso. Amanhã podemos fazer um novo cházinho e discutir a questão em conjunto. Mas olhe, já agora traga você uns pacotinhos de chá, que eu estou farta de dar para esse peditório
- Está bem Dona Arlete, mas não lhe prometo nada. Vou ver se avio uns pacotitos avulso. E agora, queiram desculpar, mas tenho de ir. Desculpem a pressa, mas tenho de ir ler Edmund Gustav Albrecht Husserl, fundador do movimento fenomenològico que ao que parece era discípulo de Franz Brentano y Carl Stumpf. Influenciou vários autores e em grande medida Max Scheler e também o interesse de Herman Weyl na lógica intuicionista na imprevisibilidade.
Sai a D. Hermengarda, depois de se ter abotoado a 2 taças de chá.
- Sabem, diz a Dona Preciosa, é mesmo sovina esta Dona Hermengarda. Além disso, cá para nós que ninguém nos ouve, é uma obcecada, é o que é. Deve ser derivado ao marido que a deixou pela prima da cunhada da cabeleireira que vive ali para os lados da Mouraria. Não tem mais nada que fazer nas horas vagas é o que é. E a gente que ature e que lhe afague a tristeza. Mas temos de ser umas para as outras, não é?
22 comentários:
"(...) discípulo de Franz Brentano y Carl Stumpf."???
isto soa-me a paste de wikiepiédia...
ó Dona Dorean, é o que se arranja. com a carestia de vida que está n dá pra mais do que a wikipedia. e já e mto bom...
:) fartei-me de rir com este post e ao mesmo tempo assustei-me.. será que as nossas caixas de comentários andam assim???
não troquem o sexo ao dorean... creio poder afirmar com um elevado grau de segurança que é um XY.
Ó D. Hermengarda, venha cá para eu ter uma conversinha de pé de orelha consigo. ... Existe uma pomada que é o alibute, verdade, receita da minha avózinha e que é um verdadeiro milagre para todas as doenças e ralações, especialmente as metafísicas.
ò d. o chofer a dançar com a criada, espere aì q jà a atendo. é q estou a aqui a rever uns conceitos de heidegger p discutir no pròximo chàzinho das cinco. se quiser aparecer por là traga essa panaceia milagrosa da sua avozinha...
eu cá uso halibut para as borbulhas. Bem me parecia que eram metafísicas.
(fartei-me de rir com este post)
eu cá rio-me mais com o woody allen e com os monthy phyton
claro q se ri muito mais com o woody allen e com os mounty phyton! Esses senhores tem graça!
(numa pausa p jantar, q ainda tenho de rever uns certos teòricos da escola frankfurt)
mestre pirata (gostou da nova designaçao?), voce rima vai là vai... è cada rimadela...
'no baile da D. Ester' disse:
"não troquem o sexo ao dorean... creio poder afirmar com um elevado grau de segurança que é um XY."
Deixe lá, não levo a mal - o Y cá vai muito bem, muito obrigado - até porque não é a primeira a fazê-lo... A grande maravilha da virtualidade é o anonimato.
Pois, então o meu feeling estava certo, o Y habita por essas partes )) Não que seja definidor do que quer que seja, mas enfim. O seu anonimato virtual apenas abre buraquinhos com as suas opiniões no verdade ou consequência- não sabemos quem é, mas o que pensa. E pensa muito bem.
rio-me muito mais com woody allen e monthy pyhton porque este tema das velhinhas a discutirem filosofia já é mais do que batido pelos supra mencionados e... oh pá não vale a pena...
sim, sim ... ri-me muito com este post, é tão giro ver este sketch com as donas velhinhas a queixarem-se dos bicos de papagaio e das pensões poucochinhas e de repente, quando nada o fazia prever aparece uma dona cujas preocupações são ..EXISTENCIAIS... Genial !!! este volte-face inesperado, oh pá fartei-me mesmo de rir...ah ah ah ah... oh pá... nunca tinha visto nada de parecido.. ah ah ah ah ah.. muito giro, muito bom...
ainda bem que hà alguém q se diverte - neste caso ri - num domingo de manha. rir rir rir, ainda bem q leu os mestres, se assim nao fosse se calhar nao teria percebido a graça. continue a ler, a rir e a divertir-se por essa vida fora. se nao, tem sempre o halibut q, ao q parece, cura muitas maleitas, incluindo as existenciais (esta asseguro-lhe q è uma graçola da nossa autoria).
dorean, folgo em saber q o seu y està em alta. eu cà quando me quero disfarçar ponho um bigode. ou entao uma cabeleira. depende das ocasioes.
d.ester, como esteve o baile da noite passada? nao soube de nada, 'tà mal...
(palavras de verificaçao: halibut)
O baile esteve do melhor: boa comida, boa bebida, boa gente,boa música. Foi um fartote.
Reparo que mais uma vez anda por aqui alguém que, apesar de não gostar, insiste não só em ler várias vezes como em comentar várias vezes. Ó donnaemobile (está sempre a mudar de nick), vai um cházinho para os nervos?
8 e coisa... disse:
"dorean, (...) eu cà quando me quero disfarçar ponho um bigode. ou entao uma cabeleira. depende das ocasioes."
E tenho a certeza que lhe devem ficar lindamente.
Dorean
'no baile da D. Ester' lisonjeou exageradamente:
"(...) não sabemos quem é, mas o que pensa. E pensa muito bem."
Mata-me com amabilidades, caríssima. Pelo menos já sei quem visita aquela tribuna... ;)
Dorean
ora, ora. Lisonja exagerada? Por quem me toma.
Que pensa muito bem já o sabe ou o presume, caso contrário não abria um estaminé com porta para a rua.
Que eu o diga aqui, de passagem, é apenas o reflexo da minha modesta apreciação.
ora ora, d. ester, nem parece seu! desde quando é que abrir um estaminé com porta para a rua é sinònimo de 'pensar muito bem'?
quero no entanto deixar claro q nada sei sobre o estaminé q supra-menciona. de dorean apenas sei tratar-se de um xy, facto q me foi alertado por si e corroborado pelo pròprio.
pelo contràrio, dorean parece saber por fonte pròpria q os disfarces me caem bem. desconheço as sua fontes mas nao me interessam tb. mas confirmo, de facto caem-me lindamente. ou nao fosse eu uma multipla assumida.
qd se abre um estaminé para a rua, para mostrar o que se acha e se analisa sobre o mundo e os homens, é pq existe ao menos a pretensão de se ter uma palavra válida a dizer.
O pensar bem foi avaliação minha.
Lá está a sra, ainda para mais minha múltipla, a ler-me na diagonal. Ora diga lá, quantos F estão neste comment? ;)
nao li na diagonal, d. ester. trata-se aqui de ter uma opiniao q diverge em relaçao à sua: as aberturas dos 'estaminés' nao tem necessariamente por objectivo 'a pretensão de se ter uma palavra válida a dizer'. mais: era uma seca se assim fosse.
nao lhe vou pedir para contar os efes. nem me vou dar ao trabalho de contar os anteriores. pode ser?
a córsega aqui tão perto.
hahahahahaha! eu logo vi q a d. ester nao se ficava... venha de là esse baile! ;)
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